Desvendando o artigo sobre Jejum intermitente do New England
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Desvendando o artigo sobre Jejum intermitente do New England

Recém publicado em uma das revistas médicas mais respeitadas do mundo (New England Journal of Medicine), o artigo de revisão intitulado "Efeitos do jejum intermitente na saúde, no envelhecimento e na doença" tem sido motivo de muita polêmica, com pessoas defendendo a prática como se fosse a revolução da medicina e da nutrição.

Vamos a algumas questões: o artigo discorre basicamente sobre estudos realizados em não humanos, muitos deles com efeitos benéficos como melhora nos níveis de inflamação sistêmica, estímulo à autofagia, otimização do nosso sistema imune com reparos no DNA, dentre outros. Estudos em humanos também são discutidos com desfechos mostrando redução da circunferência abdominal, melhora da resistência insulínica, neuroproteção e menores níveis pressóricos. Portanto, num primeiro momento, ao ler o título e a conclusão, o Jejum intermitente (JI) parece sim uma ótima estratégia.

Qual seria então o problema? Os estudos realizados em humanos ainda carecem de confirmação, de melhores metodologias, maior número de pacientes e tempo mais prolongado de seguimento, já que não sabemos, por exemplo, como será a adesão em longos períodos. Outros trabalhos mostram que realizar um plano dietético hipocalórico é tão benéfico quanto o JI em relação à perda de peso e em melhorar o perfil metabólico dos pacientes.

Também é discutido no artigo o tema JI e câncer. Relatos de casos em glioblastoma e estudos com portadores de câncer de próstata são positivos, porém, mais uma vez, carecem de confirmação com estudos mais robustos e para outros tipos de câncer, além do fato de que o risco de recidiva tumoral para praticantes do JI ainda não está estabelecido. Restrição da oferta energético-proteica em um paciente já altamente catabólico, como portadores de câncer de pâncreas e câncer de cabeça e pescoço, por exemplo, não parece ser uma estratégia inteligente até o momento. Portanto, JI e oncologia pode parecer bacana em camundongos e em laboratórios, mas para se tornar uma recomendação na nossa prática clínica ainda precisa percorrer um longo caminho.

O artigo também cita duas estratégias de como fazer o JI de forma escalonada para que o paciente se adapte gradualmente: 1) período de jejum diário que varia de 14 a 18h, com progressão mensal; na última fase o paciente teria um período de 6h para se alimentar 2) esquema 5:2 (cinco dias com refeições normais e 2 dias com restrição energética); nos dois dias de restrição energética, o consumo vai reduzindo gradualmente de 1000 Kcal/dia até 500 Kcal/dia.

Apoiadores ferrenhos podem argumentar que o JI melhorou muito suas vidas, mas para extrapolarmos os desfechos favoráveis para a prática clínica, ainda necessitamos de mais estudos.

Mas se mesmo assim você quer praticar o JI, o cenário obesidade/síndrome metabólica é o que tem um pouco mais de respaldo na literatura, apesar de necessitar de mais embasamento como ja exposto.

Como opinião pessoal, acredito que o JI terá cada vez mais força com novos estudos mais robustos, porém longe de ser o "santo graal" da medicina e da nutrição. Problemas de saúde são complexos e dificilmente haverá uma receita única para tratá-los. A regra sempre vai ser a interdisciplinaridade.

Como mensagem final, temos que ser críticos sempre ao ler artigos e, não é porque saiu no New England, que necessariamente será uma verdade absoluta.

Fonte:

Effects of Intermittent Fasting on Health, Aging, and Disease. de Cabo R, Matsson MP. N Engl J Med. 2019 Dec 26;381(26):2541-2551.

Muito boa interpretação e argumentos sobre o tema!!

Cibele Gonsalves

Gestão | Nutrição | Auditoria | Qualidade e Segurança

4 a

Perfeitamente colocada sua análise! Parabéns!

eu já fiz jejum intermitente quando estava com os dois joelhos lesionados...16/8 ,  achei  tranquilo me  adaptei rápido e perdi peso sem poder fazer exercícios 

Parabéns, Pedro! Compartilhei pq vale a pena.

Isabela Santana

Head Psiquiatria Telavita 💙

4 a

👏🏻👏🏻

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