[Diário de quarentena] A irritação por dentro
Hoje é lua minguante em áries, se eu não me engano. Última dia da lunação de áries e eu, sendo uma ariana de primeiro de abril, estou vertendo fogo pelas ventas. Me olhei no espelho e a sobrancelha cerrada com o lábios ligeiramente em meio círculo para baixo, denunciam: não é um bom dia para as palavras.
Acordei depois de uma noite mal dormida. Embora faça parte da rotina de uma mãe de bebê, estava desacostumada a este desconforto. É impressionante como nos habituamos tão rápido com o que é gostoso. Bastaram 4 ou 5 dias em que o Francisco acordou apenas 1 vez na madrugada, para que eu me esquecesse completamente dos quase 17 meses de noite mal dormidas.
Do almoço até agora já foram mais de cinco horas e ainda sinto um vulcão prestes a acordar no peito. Sinto nos dentes também. Chamei a atenção do Francisco por ele ter quebrado um galho da minha árvore da felicidade. Francamente! Justamente desta árvore? Ele não tinha esse direito.
"Vai dar uma volta!" sugeriu minha parte apaziguadora, mesmo sendo provocada pelos assobios do Pedro, há 32 minutos na mesma parte da música infantil "cinco patinhos foram passear...". Assobios deveriam ser sinais de poesia em forma de som, como mostra o desenho do pica-pau quando o mesmo sai cantarolando em suas peripécias, mas hoje não. Hoje são sons ardidos.
E cá estou, me preparando para apreciar o por do sol, devidamente vestida com minha máscara e com o sangue latino que me cabe prestes a amornar (espero). Talvez sejam estes tons terracota borrados no céu ou este vento gélido típico dos lugares altos e desmatados. Mas não se engane. Ainda vejo tostões de brasa e algumas labaredas serpenteando no meio da garganta.
Ainda assim, é preciso parar para comprar os pães pedidos pela minha mãe, apesar de não ser nada pacífico entrar em dez metros quadrados a fim de ter o prazer de um pão quente no fim do dia. Quando chegar em casa, depois de tirar a roupa toda na lavanderia e entrar nas pontas dos pés direto para o banheiro, vou tomar uma taça de vinho e comer alguns salames disputados no balcão da padaria do Alemão. É minha última tentativa para conseguir um respiro menos apertado antes de dormir.