Diversidade para quem?
Istoé; O Tempo [foto de Alexandre Mota]; Globoplay, respectivamente

Diversidade para quem?

Tenho visto várias matérias de como a pauta da diversidade e da inclusão chegou até o universo corporativo. E fico feliz ao ver que um tema tão importante tem sido considerado como mecanismo de acesso das pessoas aos cargos. Contudo, em alguns pontos, não posso negar que a minha visão é um tanto quanto crítica.

Falar sobre diversidade hoje no mundo corporativo é estar alinhado com uma das facetas do momento histórico no qual estamos vivendo. E eu digo isso, porque depois de diversas manifestações de mulheres, LGBTQI + e pessoas negras não há como mais esconder esses corpos embaixo do tapete ou “dentro do armário”. São corpos que existem e que há anos têm se posicionado. O movimento feminista, por exemplo, existe há séculos. Apesar de considerarem que ele surgiu no século XIX, desde há época em que a Igreja levantava os corpos de mulheres na “Santa Inquisição” que essas mulheres têm lutado e caminhado em sentido contrário ao esperado.

Então, essa bandeira da diversidade e da inclusão – a de deixar que esses corpos sejam vistos e façam parte da sociedade – já vem sendo batalhada há muito tempo. O mundo corporativo apenas abriu as portas para algo que já existia. A diversidade é um movimento de pessoas, é composta pela luta de pessoas. O direito à inclusão e ao acesso é também, algo que sempre foi pleiteado pelas pessoas. Me lembro de ações populares que surgiam na época em que eu trabalhava no Ministério Público, nas quais as pessoas com deficiência solicitavam que o poder público adequasse as estruturas de suas instituições, para que essas pessoas pudessem acessar esses locais com tranquilidade. Então, essas vozes nunca se calaram. Elas só não eram ouvidas e quando ouvidas poderiam ser desconsideradas.

O que ocorre hoje é um movimento muito lindo e principalmente justo, porque os corpos que sempre lutaram merecem e devem estar em todos os locais. E o ambiente corporativo para se alinhar com as pautas da atualidade deve abrir suas portas para que esses corpos a cada dia estejam com mais intensidade dentro de seus espaços. Contudo, não podemos nos esquecer que também existe uma diversidade de classes e que diversos desses corpos não tiveram acesso ao sistema de ensino. Então, não adianta uma empresa abrir uma vaga para engenheiro não sei das quantas para pessoas trans e/ou negras e esquecer que há uma necessidade de dar acesso à essas pessoas ao conhecimento que lhes foi negado por anos. Nesse ponto, acredito que uma empresa realmente inclusiva e que preza pela diversidade faz o possível para que essas pessoas realmente habitem seus postos de trabalho. E para isso, obviamente, há uma necessidade de programas educacionais, cursos, bolsas de estudos, dentre outros.

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E mais, não adianta levantar a bandeira da diversidade (como a Amazon e seu banco de talentos de diversidade) e tratar com desumanidade seus funcionários. Controlando, inclusive, suas idas ao banheiro. Cabe dizer, que ser diverso é tratar todos os corpos com respeito. E respeito é muito mais do que garantir os direitos trabalhistas dos funcionários. Respeito é saber que qualquer corporação é feita de pessoas, são as pessoas que movem o mundo e sem elas nenhum negócio sobrevive.

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Então, se uma empresa realmente quer ser diversa, que comece respeitando cada um de seus colaboradores, para que ele, em um dia de chuva não precise trabalhar para entregar o lanche de uma pessoa, como aconteceu em Belo Horizonte com um entregador parceiro do IFOOD no ano passado. Sim, ele não era um funcionário de carteira assinada da empresa, mas ele era uma pessoa que prestava serviços e que o mínimo que a IFOOD deveria garantir é uma remuneração adequada para que situações como essa não ocorram. Há sim uma responsabilidade nessa situação. Não é porque há a inexistência de um contrato de trabalho que a empresa está eximida de garantir as mínimas condições para que esse trabalho ocorra. Isso é respeitar as pessoas. É compreender que ao mesmo tempo em que há um negro trabalhando como designer, também, há um negro entregando o lanche desse mesmo designer. E porque para um deles o seu trabalho é considerado como um exemplo de diversidade e inclusão e o outro é deixado ao esquecimento?

Quais corpos, então, merecem ter acesso à diversidade dentro das corporações?

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Para finalizar, sobre ações pessoais. Tenho contato direto com o tema da diversidade desde 2015, conheci e trabalhei com várias pessoas que atuam diretamente com o tema. E digo, não adianta levantar a bandeira da diversidade e inclusão e estar fechada(o) para ouvir e respeitar o outro. Foi isso que aconteceu com o Lucas do BBB21. Pessoas militantes deslegitimaram a sua sexualidade! O cara sofreu violência psicológica de várias formas e por pessoas que se dizem inclusivas e que levantam a bandeira da diversidade. E isso aconteceu dentro do BBB e acontece aqui fora! A gente não muda o mundo reproduzindo as violências que os nossos corpos sofrem, a gente não muda o mundo dizendo que quer um ambiente de trabalho mais diverso e puxando o tapete do outro. A gente muda o mundo fazendo diferente do que fizeram com a gente. Abrindo as portas, o coração e ouvindo o que o outro tem a nos dizer. Acreditando em sua verdade, pois cada um sabe de sua dor. E não cabe a ninguém duvidar dessa dor. É isso.

 

Concordo plenamente com seu texto. As pessoas precisam enxergar a realidade. Excelente posicionamento 👏👏👏

Wanessa Rodarte

Governança Social| Relações Institucionais| Advogada

3 a

Muito bom, Gabriella

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