Docência sem dó
De tempos em tempos, surge, no universo da educação, uma nova e milagrosa forma de resolver todas as nossas angústias geradas na e a partir da sala de aula. São muitos métodos, dinâmicas variadas, abordagens sem fim. Ano após ano nos preparamos, lemos, estudamos, o trabalho do professor exige essa inquietação. Todavia, nem sempre o resultado disso é o esperado, longe disso, é comum nos depararmos com trabalhos pífios, caóticos, mal apresentados, copiados, e até mesmo sem qualquer conexão com o tema abordado. De vez em quando, uma única sala abriga estudantes desinteressados, que trocam mensagens durante a aula toda, riem entre si e, não raro, fazem chacota do professor. E não, não estou falando do ensino médio, mas do superior. Quando isso ocorre, já vislumbramos um semestre duro, cheio de intercorrências, uma queda de braços diária.
Para muitos deles, aula é aquela expositiva, com uso do quadro negro ou do PowerPoint. Eles se sentam, anotam ou tiram foto de tudo, não interagem, alguns refugiam-se no fundo da sala, cercam-se de um fosso com crocodilos e só saem dali se são convocados à força da única arma do professor: a nota. Aulas com outros formatos, desafios, casos, em grupos operativos, tudo lhes parece uma afronta. A lei é a do mínimo esforço.
Falando assim, parece até que sou contra a aula expositiva, mas não, muito pelo contrário, acho-a facílima, tenho um estoque razoável delas, no entanto, percebo-as, em alguns contextos de aprendizagem, inócuas quanto ao desenvolvimento de competências e habilidades dos alunos e também dos professores. A métrica é sempre a prova escrita, e aí encontramos mais uma miríade de angústias. A prova é fácil demais? Os alunos passam a desprezar o professor e a matéria; está difícil demais? Cria-se o tabu e a matéria se torna apenas um detalhe nessa relação, pois o que importa é vencer o professor, o que importa é vergar o aluno.
Fora da sala de aula outras angústias e desafios também nos esperam. No relacionamento com os colegas, evidenciam-se outras mazelas: insegurança, vaidade, competição, interferência. Professores que minam o trabalho dos colegas, que não lhes faz uma crítica construtiva, ao contrário, ridicularizam o outro, alienam-no e assim se protegem daquele que lhes parece ameaçador.
É possível reverter isso tudo? Mais do que possível, é necessário, todavia, não há fórmulas, não há curso de capacitação que nos impute um querer-fazer, e talvez aí resida a diferença entre o professor e aquele que faz da docência bico. Então, antes que se instale a antipatia e demais paixões decorrentes, é preciso reconstruir a comunicação, refazer caminhos, tentar ao menos tornar o ambiente mais amigável. Apostar numa linguagem nova, em mudanças de postura dentro e fora da sala é sempre enriquecedor, pode até não surtir efeito imediato, mas a médio e longo prazo, atitudes vão mudando e costumes viciosos passam a ser mal vistos, uma vez que se revelam improdutivos.
A docência não é doce, não é lugar de irresponsabilidades e veleidades, antes, é campo de evolução do humano, é oportunidade de fazer diferença num mundo plano, apático. E nessa dinâmica diária, a sala de aula não pode ser a desculpa, mas o motivo.
Professor M.e
5 aAté que enfim, estar nesta plataforma valeu a pena. Enfim um sentido. Ler você. Tantos anos, todos dias lado a lado, colegas de cátedra e a gente esquece de falar de admiração. Obrigado pelo texto. Sou seu fã.