Educação e negação da hipocrisia: desencantar o maléfico!
Na minha infância em Londrina, no norte do Paraná, meus pais não diziam de maneira direta, mas havia um lema que era “apanhou na rua, apanha em casa outra vez”. Em algumas situações era um jeito de convivência, segundo o qual era preciso saber se defender. Mas naquela sociedade, há mais de 50 anos, a crueldade na convivência de jovens e crianças era menor do que aparece hoje. Poderia até acontecer algum tipo de desentendimento, de altercação, mas se dava sempre com as mãos limpas. Existiam algumas regras nesse tipo de combate infantojuvenil que se assemelhavam às da Convenção de Genebra; não é que se tratasse de uma situação ideal, mas tinha um nível de crueldade menor até do que a situação aparentava.
Concordo eu com a lógica de “apanhou na rua, apanhou em casa”? Não. Deveria ser trazida para os tempos atuais? De jeito nenhum. E o que faço com o meu filho, que está sendo vítima dos fortões? Se eu quero que ele ganhe mais segurança em relação à autoimagem, em que seja capaz de reagir não de maneira agressiva, mas defensiva, eu o coloco a praticar um esporte que o leve a um fortalecimento interno e externo, como é o caso do judô, da capoeira ou do tae kwon do.
Há uma frase do mundo budista de que eu gosto demais: “Eu não luto a tua luta, eu danço”. Tenho isso como princípio para mim em várias situações.Trata-se de um outro movimento.
Há 50 anos, essa postura mais combativa fazia sentido, numa sociedade em que a ideia de coragem estava atrelada à capacidade de resistir a qualquer coisa. Hoje, não mais. As duas atitudes são equivocadas. A primeira delas, a dos pais, fazia sentido naquele tempo, não agora. Agora é assim: não pode apanhar na rua porque não se deve brigar. E não apanhará em casa porque não é correto educar alguém com violência física. Hoje é “nem na rua nem em casa”. “Mas será que ele não vai ficar fraco?” O que enfraquece alguém é não ter segurança para ser o que ele precisa ser.
O valentão sempre existiu. A única maneira de conter o valentão que a sociedade encontrou na História foi fortalecer as instituições que não admitem que essa figura tenha lugar.
Freud chamava isso de civilização. Como é possível impedir que a regra seja a vitória do mais forte? Só a civilização bloqueia isso. Instituições — como a família, a escola, o Judiciário — que não admitam que aquele que usa o seu poder da força seja vitorioso.
Há 50 anos ou há mil anos o valentão já existia, talvez daqui a mil ele ainda vá existir. Qual a diferença? O valentão era admirado, ele passa a não sê-lo mais. Essa perda da admiração tem de ser incentivada pela família e pela escola. Eu não posso admirar o que é incorreto, o que é malévolo, aquilo que ameaça a integridade da vida coletiva e da comunidade.
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**Trecho retirado do livro "Educação, docência e ética", disponível em https://amzn.to/2RfZqh1
PSICÓLOGA E NATURÓLOGA
6 aMuito bom, entretanto estamos vivendo numa época de "valentões covardes", como diziam na minha infância: aquele que bate (mata) mulheres. Acho que por trás disso tudo está o medo (Freud) por querer ser mulher...
Assistente Eletrônica na R.E Manutenções
6 aGenio
Cortella sempre muito procedente!
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6 aCerto Dr. Cortella,concordo,mas há um porém : O que fazer enquanto a instituição ´´civilização´´não estiver totalmente implantada ?.O mais fraco terá que apanhar e ficar quieto?,sim,porque todos sabemos que o mais fraco apanha do valentão,brigando ou não.Vou tentar me colocar nas duas posições incômodas : a do pai do que apanha do valentão e a do que apanha do valentão. Como pai, obviamente não iria lá tomar satisfações do valentão, mas iria,sim, procurar dar condições ao meu filho para que na próxima vez em que fosse agredido,pudesse se defender,obviamente sem passar do limite. E estando eu na posição do que apanhou do valentão,iria pedir ajuda ao meu pai para que me instruísse sobre o que fazer para deixar de ser o mais fraco fisicamente para poder me defender ,sozinho, na próxima vez em que fosse agredido. Gostaria imensamente de concordar totalmente com o senhor,mas,vivo no mundo real,não no ideal.