Eleições, "marqueteiros" e marketing

Desde que se iniciou o processo de redemocratização do país, a cada ano eleitoral ocorre sempre a mesma coisa: políticos procuram se cercar de diferentes profissionais que desenvolvem atividades que vão da definição de estratégias de campanha e realização de pesquisas de intenção de voto, até o cuidado com a aparência pessoal e o modo por meio do qual falam com os eleitores e expressam suas propostas de campanha. Isso é mais evidente para aqueles políticos que disputam cargos majoritários, como é o caso dos cargos de prefeito, governador e presidente.

Salvo raras exceções, eleitores, candidatos e, para piorar, a própria mídia de difusão, têm por hábito não proceder a uma distinção clara sobre o tipo de papel que é desempenhado por cada um desses profissionais ou assessores. Mais que isso, costumam denominá-los de “marqueteiros”. Trata-se de algo lamentável e que tem sido danoso tanto para profissionais que exercem a atividade de propaganda e publicidade, quanto àqueles que exercem a atividade de marketing em diferentes organizações, com ou sem fins lucrativos.

Em termos específicos, a atividade de marketing termina sendo reduzida à comunicação – diga-se de passagem, comunicação persuasiva de má fé, com fins espúrios, para mentir e enganar eleitores. Ao se referirem aos “marqueteiros”, até se referem a marketing com o uso do artigo masculino definido: o marketing. Ocorre que marketing não é sujeito, não tem capacidade de agência. Esse é um viés infelizmente alimentado pela mídia de difusão ao realizar a cobertura das eleições. 

Marketing também é comunicação, mas é muito mais que isso: envolve desde a pesquisa e estudo de produtos e serviços, até o desenvolvimento, formatação e produção dos mesmos, incluindo distribuição, logística e precificação, por exemplo. A rigor, marketing tanto é uma disciplina acadêmica quanto uma prática administrativa em organizações, que existe desde o início do século passado.

Profissionais de marketing, sejam eles praticantes ou acadêmicos, não são mentirosos ou ludibriam pessoas, por princípio ou definição. Mentir ou ludibriar independe do exercício de uma dada profissão e pode acontecer em qualquer atividade. Aliás, nunca é demais lembrar que as pessoas, pelo menos em tese, possuem capacidade de discernimento para fazer suas próprias escolhas. Se isso não acontece como desejado para o pleno exercício da cidadania, não deveria ser algo imputado aos profissionais de marketing. 

Talvez a tentativa de atribuir responsabilidade ao profissional de marketing por mazelas que existem na política brasileira seja mais uma manifestação daquilo que eu defino como cultura da transferência da responsabilidade, algo típico em nossa sociedade: a culpa nunca é minha ou sua; é sempre de outra pessoa.

* Publiquei esse artigo originalmente na Revista ACIM - Associação Comercial e Industrial de Maringá, v. 53, p. 58, em 05 de julho de 2016.


Rubens da Costa Santos

Passionate, innovative, experienced and results driven marketer. PhD Marketing - Univ Texas, MBA and BBA FEA-USP. Ex Full Prof FGV/EAESP; Ex Prof Dr FEA/USP, Ex Prof Dr FIA.

6 a

Francisco, gostei das colocações que faz. Realmente há marketing puro, como deve ser e marketing impuro, ou seja empregado parcialmente em seus pilares! O primeiro é ético e precisa ser incentivado e o segundo repudiado! Acrescento ao que escreve que tudo parte do mapeamento, análise e compreensão do consumidor - que está do lado de fora da empresa. De posse desse conhecimento de mercado é que o verdadeiro profissional de marketing articula as outras ferramentas mercadológicas (que menciona em seu artigo). A segunda parte só faz sentido se a primeiro tiver sido realizada de forma adequada e ética. Saudações

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