Empatia, Adaptação e Confiança: o Caminho do Ser Humano
Gosto de refletir com amigos, que tenho desde a minha adolescência, sobre grandes temas do nosso mundo. A intenção é encontrar caminhos para resolver os problemas da humanidade, com a plena consciência das nossas limitações. Com o tempo, essas conversas se tornaram mais complexas, pois além dos desafios antigos (como por exemplo a mudança climática x sustentabilidade), novos grandes desafios apareceram gerando uma rede complexa e interligada, de difícil entendimento e solução.
Em recente artigo do Martin Wolf (Financial Times), ele navega nesses desafios incluindo a Demografia, que já conversamos aqui em um artigo anterior, a evolução do Conhecimento Humano e nosso Propósito, e o próprio Crescimento Econômico, uma das bases para a nossa evolução e solução de problemas. Além destes desafios, traz as complicações importantes como as guerras em desenvolvimento, os efeitos das pressões migratórias, o tamanho das dívidas públicas e privadas, a recessão democrática em um ano onde 50% da população mundial está realizando eleições, e as mudanças de poder EUA-Europa e Ásia.
E tornando esta conversa mais calorosa, temos agora a Inteligência Artificial. Em uma recente entrevista do Yuval Harari conduzida pelo Steven Bartlett no podcast The Diary of a CEO, o Harari, com sua lógica envolvente (e assustadora) nos dá a sua visão para onde estamos indo, não somente dominados pelos algoritmos como fala no seu livro Homo Deus, mas agora com esses algoritmos passando a ser controlados pela IA, tecnologia intrinsicamente evolutiva e fora do controle humano, desenvolvida por poucas empresas globais.
Ufa! Haja ansiolítico para acompanhar tudo o que está acontecendo e não cair na armadilha de querer viver no desconhecimento confortável. Mantendo a tradição, tenho procurado refletir com meus amigos e às vezes sozinho, qual o caminho que deveríamos seguir. E provavelmente muito influenciado pelo Healthy Place to work, no lugar de prestar atenção nas múltiplas doenças do nosso mundo, refletir no que nos torna saudáveis como seres humanos.
E não é necessário ir muito longe. Recentemente, e por uns cinquenta anos aproximadamente, tivemos a experiência de viver em um ciclo longo de evolução da nossa sociedade, com prosperidade evolutiva, relativa paz e um crescimento econômico que ajudou reduzir as diferenças sociais e melhorar a qualidade das nossas vidas sobre vários aspectos, apesar do caminho ser longo, uma verdadeira jornada.
E nesta reflexão, pensei em três comportamentos que são intrinsicamente humanos que precisamos exercitar cada vez mais, e em conjunto: a empatia, a adaptação e a confiança.
Vivemos num mar de opiniões. Cada um de nós acredita que sabe a solução do desafio que está enfrentando. Se tem uma opinião forte e é muito ouvido, passa a ser seguido na mídia social. Se não tem opinião, vai ter dificuldade de se relacionar e sentir-se respeitado pelas outras pessoas. Faz parte do ser humano ter opiniões.
Por outro lado, aprendi há muito tempo, em um estudo desenvolvido pela Arthur D. Little sobre Gestão de Mudanças, que é mais fácil alinhar um grupo de pessoas em relação à uma Visão de Futuro a ser construída, do que definir um plano de ação realmente integrado e alinhado por todos, pois temos as nossas soluções próprias para chegar à Visão definida, influenciadas pelos nossos interesses, que são muitas vezes conflitantes entre si.
E isso não é ruim, ter diferentes opiniões é que torna uma organização forte (leia artigo aqui sobre Diversidade de Pensamento) e estruturar processos de planejamento auxiliam a que todos tenham uma perspectiva mais ampliada do que se está enfrentando.
Porém, ao polarizar e cristalizar essas diferentes opiniões criando conflitos é o que faz uma organização não ir para frente, a leva a perder espaço para a sua concorrência, é menos produtiva, e passa uma mensagem confusa para os clientes, que mais os afasta do que os atrai.
A recente 19ª publicação do WEF, World Risks Report 2024, traz como um dos maiores riscos atuais (que para mim foi uma novidade deste relatório) a Polarização da nossa Sociedade (veja a figura D, página 9). E, considerando todos os desafios citados acima, podemos dizer que já vivemos um alto grau de cristalização desta polarização, multiplicada pela mídia social e aproveitada pela política e políticos, tanto no Brasil como no mundo.
A empatia é o primeiro passo para reverter esta polarização. É o mecanismo que utilizamos para nos conectar realmente e intencionalmente em outras pessoas. A empatia é tão mais poderosa quanto maior for o foco que tivermos na outra pessoa e menos em nós mesmos, o que requer um real esforço para ser feito. Como que esta pessoa está realmente se sentindo? Por que esta pessoa está sentindo assim e o que a fez sentir assim? O que realmente esta pessoa quer me dizer? E o que eu posso fazer para realmente ajudá-la?
São perguntas relacionadas à empatia emocional, cognitiva e motivacional que, pela própria natureza das perguntas, já fez você pensar que isso não é tão simples. Mas é um caminho, você não precisa ser 100% empático da noite para o dia, isso evolui durante a relação, é uma jornada. Pense como um primeiro passo, ou talvez, reconheça que a outra pessoa possa estar tentando dar este primeiro passo em relação à você, pois vale a pena compreender a visão e necessidades dos outros (livro: Jamil Zaki, The War for Kindness - Building Empathy in a Fractured World).
Claro que não. Imagine uma conversa complexa, porém necessária, entre um diretor de vendas e de produção. Normalmente os dois têm razão, cada um com o seu ponto de vista próprio e seus conjuntos de interesses. Agora imagine que este problema cresça ao ponto de ser necessário trazer o presidente desta empresa para definir quem tem razão.
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Se isso acontecer, um dos lados irá engolir o sapo desta decisão, por melhor que a decisão tenha sido feita. E, como disse um grande amigo meu, o sapo cresce, cresce e às vezes se transforma. As próximas conversas tenderão a ser cada vez mais polarizadas, consumindo mais energia do que o necessário, pois a falta de compromisso com a decisão tomada irá gerar mais problemas.
Agora imagine a possibilidade de uma conversa, um procurando realmente entender o ponto de vista do outro. De um lado o cliente, precisando de uma solução com um preço adequado, atingindo as metas planejadas, e de outro a organização precisando de produtividade, estoques reduzidos e menor pressão financeira. Um realmente entendendo o outro, não somente de uma forma intelectual, mas também de forma empática. Esta relação permite criar uma solução diferente e muitas vezes mais sustentável para todas as partes.
É aqui que entra o fator adaptação. Nós humanos temos uma enorme capacidade de nos adaptar. Certos comportamentos adaptados requerem maior energia do que outros, e isso difere de pessoa a pessoa, aprendi isso aplicando a ferramenta GRI nas empresas (acesse www.GRI.co). Mas se ambos os lados estiverem alinhados, provavelmente os impasses tendem a diminuir, o que tornará o desenvolvimento dos processos internos tornem-se mais fluidos, trazendo a satisfação para ambos os lados pelos resultados alcançados.
Neste processo de adaptação, é importante prestar a atenção no ganho que foi alcançado com a conversa produtiva e não no que se perdeu. O foco precisa estar no resultado, é importante que seja uma conquista evolutiva de todos envolvidos.
Imagine que na situação acima, em que cada um dos lados alcançou um resultado um pouco abaixo das suas expectativas, mas ainda um resultado satisfatório. Este será um reforço positivo para que as conversas de alinhamento continuem. Agora imagine se um dos lados teve uma perda importante e outra não. Aqui será necessário voltar ao ciclo de conversas com empatia e nova adaptação, até chegar ao adequado balanço entre o resultado e expectativas das partes.
Agora, continue a pensar em outras coisas como no respeito profissional que ambas as partes têm entre si, cada uma reconhecendo que a outra possui a competência para trazer as soluções e o alinhamento de valores sendo manifestado no dia a dia dos relacionamentos que acontecerem.
Este reconhecimento gradativo e aprendizado em conjunto irá aumentar a confiança das partes, uma sentindo que a outra está lá para auxiliar na construção do futuro que ambas estão comprometidas. A confiança faz com que a energia focada na solução seja mais produtiva.
O cuidado permanece com a gestão de conflitos de interesses (especialmente não relacionados com o problema em si) e comportamentos como a arrogância que minam as relações entre as pessoas. Mas, num relacionamento empático, as partes aprendem a se comportar de forma adequada e respeitosa
A “empatia mais adaptação mais confiança” descrita acima é um processo dinâmico, que se for desenvolvido de forma contínua e construtiva, gera uma base para o desenvolvimento do apoio entre as partes, uma realmente acreditando na outra, mesmo existindo divergência de opiniões.
E nas situações quando esta divergência for realmente significativa, uma nova conversa deverá acontecer, faz parte do processo. Quando maior for a quantidade de conversas complexas como essa, alcançando as soluções para as partes, mais fáceis elas se tornam. É como desenvolver uma musculatura com exercícios, sabendo ouvir e a falar, com a devida disciplina.
Este mecanismo é mais fácil de ser aplicado em organizações do que na nossa sociedade como um todo, mas talvez quanto mais tivermos a oportunidade de sermos humanos com nossos sentimentos atuando em conjunto com a nossa capacidade intelectual, podemos aprender que trabalhando em conjunto, teremos a criatividade necessária para inovarmos e continuar a construir um mundo melhor para todos.
Como diz a Hanna Ritchie: “Termos uma boa vida para todos hoje” + “Dar oportunidade para as gerações futuras” (livro: Not the End of the World – How Can We Be the First Generation to Build a Sustainable Planet).
Abraço,
André Lit
Gerente de Supply Chain
11 mExcelente conteúdo como sempre Andre Litmanowicz. Fluido, dinâmico e rico. Obrigado pela partilha.
Partner at Mundo MESA S/S
11 mMuito bom, André! Porém… como ensinar e treinar o homem a ser empático? De verdade…
Diretor Financeiro
11 mParabéns André, excelente reflexão!