Equilíbrio econômico-financeiro do Contrato
Equilíbrio econômico-financeiro do Contrato
A base da primeira teoria da informação de Peirce desposa uma distinção lógica - e também semântica - entre a denotação e a significação de símbolos.
Assim, denotação, referência, extensão ou largura são conceitos engendrados visando se referirem aos objetos do conhecimento empírico - aos quais tais símbolos se aplicam.
Sustento que, quando Peirce concebe as leis inseridas na categoria da terceiridade, mencionando as leis naturais, a sua concepção fenomenológica não discrepa da acepção de lei como as leis jurídicas, conforme explica Santaella:
“O que é uma lei? Ora, a lei não passa de uma abstração, mas uma abstração que é operativa. Ela opera tão logo encontre um caso singular sobre o qual agir.
A ação da lei é fazer com que o singular se conforme, se amolde à sua generalidade. É fazer com que, surgindo uma determinada situação, as coisas ocorram de acordo com aquilo que a lei prescreve.
Se não fosse pela lei, as ocorrências seriam brutas e cegas. É por isso que também falamos em leis da natureza.
Quando algo tem a propriedade da lei, recebe na semiótica o nome de legi-signo e o caso singular que se conforma à generalidade da lei é chamado de réplica.
Assim funcionam as palavras, assim funcionam todas as convenções socioculturais, assim também funcionam as leis do direito”.
(Mergulhando no Universo Jurídico, Amazon, José Alberto da Costa Villar)
Destaque-se que não somente os fatores sociais, mas também os valores, concorrem para o aparecimento das normas jurídico-positivas, existindo, assim, um pluralismo de fatores reais dentro dos grupos sociais, onde o direito coexiste com os mais diversos conteúdos, que determinam o surgimento das normas jurídicas.
Tal advertência, é de se salientar, já fora percucientemente elaborada através da pena de Montesquieu, em sua vasta obra, O Espírito das Leis:
"Devem as leis ser relativas ao
físico do país... ao clima frio, quente ou temperado; à qualidade do solo, à sua situação, ao seu tamanho; ao gênero de vida dos povos, agricultores, caçadores ou pastores; devem relacionar- se com o grau de liberdade que a constituição pode permitir; com a religião dos habitantes, suas inclinações, riquezas, número, comércio, costumes, maneiras. Possuem elas, enfim, relações entre si e com sua origem, com os desígnios do legislador e com a ordem das coisas sobre as quais são elas estabelecidas. É preciso considerá-las em todos esses aspectos".
Pontes de Miranda, ao investigar objetivamente o direito nas relações sociais, procura representar o mais exatamente possível o que se convencionou chamar de fontes formais com as denominadas fontes materiais, pretendendo a identificação das regras jurídicas com os fatos sociais, em que pese admitir a dificuldade dessa obtenção, devido à falta de desenvolvimento metodológico que permita a indução da regra jurídica do fato social, objetivamente e de forma rigorosa Faz notar que muito caminho resta a ser percorrido na busca de método impessoal.
Noutras palavras, visa adequar o mais que pode os sistemas jurídicos com os sistemas sociais, eis que os primeiros são formados de regras jurídicas, quer sejam leis, costumes e demais, enquanto os segundos são compostos de relações sociais, sejam de natureza econômica, política, moral ou de outra ordem, as quais condensam valores.
Por outro lado, tal como afirmo em outro livro de minha lavra, “Toda Verdade é provisória... Por isso mesmo, retificável...”, afirma enfaticamente CAIO TÁCITO:
“... (O Estado) ... não poderá deslocar a relação entre os termos da equação econômica ou financeira, nem agravar os encargos ou as obrigações do concessionário, sem reajustar a remuneração estipulada
.”(cf. seu Direito Administrativo, página 233)
Também nesse sentido, encontra-se respaldo nas palavras do professor HELY LOPES MEIRELLES:
“...a inadimplência do Poder Público confere ao particular contratado o direito à ampliação dos prazos, à revisão dos preços e à alteração de outras cláusulas contratuais prejudicadas pela mora administrativa, podendo a irredutibilidade da Administração contratante às suas justas reivindicações acarretar a rescisão do ajuste e correspondente indenização por perdas e danos. Esses direitos encontram respaldo no direito maior do contratado à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.” (in Estudos e Pareceres de Direito Público, vol. 11, RT, p. 91)
Não se questiona quanto o poder da Administração, unilateralmente modificar aspectos técnicos da execução do serviço. Mas nem isso lhe será livremente ensejado, se do seu exercício decorrer ameaça ou lesão ao equilíbrio financeiro do contrato, eis que este é constitucionalmente tutelado. E, como tal, constitui “direito subjetivo, oponível a terceiros, à própria Administração”. (cf. Meirelles Teixeira, parecer publicado na Revista de Direito Administrativo, volume 50, página 420)
Não é demasia tomar, ainda uma vez, o magistério de FRANCISCO CAMPOS: “A equação econômica constitui o conteúdo da situação jurídica individual do concessionário, ou é, na nossa terminologia legal, um ato jurídico perfeito ou um direito adquirido.”
(cf. Direito Constitucional, volume I, página 127)
Vale, como arremate, citação do ilustre CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO:
“Perante o concedente, os direitos do concessionário cifram-se a respeito à parte contratual da concessão, isto é, à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro e também a que não lhe seja exigido, sob cor de cumprimento de suas obrigações, o desempenho de atividade estranha ao objeto da concessão, pois é o objeto que identificará tal ou qual concessão.” (Cf. Prestação de Serviços Públicos e Administração Indireta, 2.ª edição, página 42)
Mesmo entendida a concessão de serviço público como um contrato oneroso, sinalagmático, perfeito, comutativo, realizado “intuitu personae”, não se pode olvidar, porém, que ele decorre do encontro de duas vontades constituindo ambas as partes de credoras e devedoras das prestações convencionadas, posto que pela Administração a finalidade em mira é atingir e satisfazer o interesse público de modo suportável economicamente, obtendo a colaboração do particular na adequada execução do serviço que tem por fim, cumprindo o que se propôs, auferir rendimentos compatíveis com o investimento e os reinvestimentos realizados.
Por isto é que, para o concessionário surge, face o contrato de concessão, o dever de fazer funcionar a contento o serviço público dela objeto, organizando-o, atualizando os processos empregados, com obediência ao ordenamento jurídico aplicável. (cf,. José Cretella Jr., in Curso de direito Administrativo, Forense, 1983, página 415).
A este dever do concessionário, correspondem em compensação, e como bem assinala José Cretella Júnior:
“certos direitos, como o direito ao exclusivo exercício da atividade concedida; o direito à retribuição ou tarifa, direito de promover desapropriações; direito à proteção penal; direito ao exercício do poder de polícia.”
Ensina RUY CIRNE LIMA:
“Traço característico da administração pública é estar vinculada - não a uma vontade - porém a um fim; a um fim alheio à pessoa e aos interesses particulares do agente ou órgão que a exercita.” (cf. Princípio de Direito Administrativo Brasileiro, 3.ª ed., páginas 21/22)
À respeito CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO propalou: “os fins de lucro pretendido - e passíveis de sê-lo - pelo concessionário são resguardados contratualmente no valor cristalizado na equação econômico-financeira. Esta representa a contrapartida do montante e significação patrimonial dos encargos a ele imputáveis quando do ato concessivo. Aí se consubstancia o ângulo patrimonial em sua inteira largueza, envolvendo o montante do capital investido, sua amortização e os lucros, medidos todos em função dos parâmetros fornecidos pela tarifa e pela dilação temporal cujo transcorrer seria percebida. A expressão econômica, esta sim, pertine ao concessionário e a igualdade firmada lhe é deferida ao lume dos termos em que contratou. Compreende-se que seja assim. Ao concessionário, enquanto tal, nem lhe interessa e nem lhe compete a retenção do serviço ou o ditame das condições em que deva ser prestado. Seu móvel é econômico e o que lhe importa é o implemento deste desiderato privado. ESTE LHE É ASSEGURADO.” (cf. Revista dos Tribunais, volume 556, página 15)
Ainda a propósito do mesmo tema, leia-se a lição de CARLOS S. DE BARROS JR.:
“As modificações que a Administração pode impor não devem exceder determinados limites. Não podem subverter o contrato e sua economia. Não podem impor objeto novo (não previsto), desnaturar o contrato com obrigações que importem serviço novo, obra nova ou fornecimento diverso. Não se deve perder de vista que se trata de relação contratual, diversa por certo do regime dos contratos de direito civil, mas que POR ISSO MESMO SE TRATA DE CONTRATO, NÃO POE O PARTICULAR FORA DE UMA SITUAÇÃO CONTRATUAL. Não se trata de uma situação legal ou regulamentar, livremente alterável, por via geral.” (cf. Contratos Administrativos, Saraiva, página 72)
Igual entendimento esposou AUGUSTO DE ATHAYDE ao proclamar que somente são modificáveis as cláusulas que dizem respeito ao serviço, posto que
“são imodificáveis as que determinam vantagens e garantias econômicas que levaram o particular a contratar.” (cf. Poderes unilaterais da Administração sobre o Contrato Administrativo, ed. Fundação Getúlio Vargas, página 80)
Também nesse sentido, TOSHIO MUKAI, citando CAIO TÁCITO, assinala que
“O equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão (e de todo contrato administrativo) é um direito irrenunciável e indespojável do particular contratante, como mostrou Caio Tácito.”
(cf. Administração Pública na Constituição de 1988, saraiva, página 138)
THEMISTOCLES BRANDÁO CAVALCANTI observa:
“Os autores italianos costumam diferenciar as concessões unilaterais, ou concessões licenças, das concessões bilaterais, ou concessões contratos. GIORGI assim estabelece a diferenciação: ‘Existem duas espécies de concessões. Algumas são meras permissões, pelas quais paga-se apenas uma taxa de licença; o concedente pratica um ato de autoridade, obriga-se apenas a manter uma certa tolerância.
Tais concessões não admitem estipulações especiais, e conferem mero precário; são revogáveis portanto, ad nutum, pela autoridade concedente. Outras, ao invés, são acompanhadas de uma disciplina contratual, em que a autoridade assume a situação de contraente, subtrai a coisa ao uso público, etc.”
(cf. Tratado de Direito Administrativo, 2.ª ed., Livraria Editora Freitas bastos, volume II, página 401.)
Assenta, citando CARVALHO DE MENDONÇA:
“A tutela do Estado, porém, não se resume em restituir direitos nas autorizações; ela também os pode criar nas concessões. A concessão é, então, a relação jurídica pela qual o Estado cria, no particular, ‘ex-novo’ e ‘ex-integro’, uma faculdade da alçada própria da administração e de que o particular tinha unicamente a possibilidade, conferindo-lhe um privilégio de utilidade em vista de um interesse público ou da satisfação de um público serviço.” (cf. Obra e Volume cits., página 405)
A afastar qualquer dúvida, e citando BIELSA, arremata THEMISTOCLES BRANDÂO CAVALCANTI:
“a concessão será um contrato entre o Estado e o concessionário, em que AMBOS se obrigam a CUMPRIR AS CLÁUSULAS CONVENCIONAIS E AS LEGAIS, que se consideram parte integrante da concessão.
(cf. Obra e Volume cits. Página 411)
Seja como for, o fim público é o objetivo que o Administrador deve perseguir, é finalidade vinculada de todo o ato administrativo.
Aliás, tal afirmação é consentânea com o princípio insculpido na Constituição de 1988, em seu artigo 37, caput: A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...”
Nesse sentido a sempre precisa lição de Hely Lopes Meirelles:
Impessoalidade e finalidade – O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37, caput), nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique o ato para o seu fim legal. E o fim legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal.
E a finalidade terá sempre um objetivo certo e inafastável de qualquer ato administrativo: o interesse público. Todo aquele que se apartar desse objetivo sujeitar-se-á a invalidação por desvio de finalidade...
E continua: Desde que o princípio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pública, o administrador fica impedido de buscar outro objetivo ou praticá-lo no interesse próprio ou de terceiros...
O que o princípio da finalidade veda é a pratica de ato administrativo sem interesse público ou conveniência para a Administração, visando unicamente satisfazer interesses privados, por favoritismo ou perseguição dos agentes governamentais, sob forma de desvio de finalidade. Esse desvio de conduta dos agentes públicos constitui uma das mais insidiosas modalidades de abuso de poder, como veremos adiante, sob esta epígrafe.
(Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 22.ª edição, p. 85)
Por outro lado, o serviço de transporte coletivo por meio de ônibus é serviço público, conforme disse Diógenes Gasparini ao dissertar sobre o verbete serviços municipais (Enciclopédia Saraiva do Direito, vol. 68, p. 351). Hoje, se alguma dúvida ainda existisse quanto a isso estaria absolutamente espancada, pois é a própria Constituição Federal quem qualifica essa atividade da Administração Pública como serviço público.
De fato, estabelece essa Lei Maior, ao indicar as competências municipais, que cabe ao Município “organizar e prestar, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial” (art. 30, V).
Em suma, pode-se afiançar que o serviço de transporte de passageiros ou, como quer a Constituição Federal, o transporte coletivo, no caso, intramunicipal, por meio de ônibus, é serviço público municipal e, como tal, pode ser objeto de concessão ou permissão de serviço público, pois não é dos que somente podem ser prestado pelo seu titular.
Como objeto de concessão-permissão pode ser alterado no que for pertinente à sua execução e nisso estão acordes a doutrina e a jurisprudência. A alteração do objeto não é outra coisa senão a modificação das cláusulas regulamentares da outorga ou, simplesmente, das cláusulas de serviços ou, por fim, das cláusulas cuja execução está a cargo do concessionário-permissionário.
A Lei federal n° 8.987/95, no entanto, não menciona diretamente a possibilidade da alteração unilateral dessas cláusulas ou, o que dá no mesmo, do objeto da concessão de serviço público e, exatamente por isso, não fixou qualquer regime a respeito. Também não previu a possibilidade de alteração do contrato de concessão. Não obstante seja desse modo, as possibilidades dessas modificações surtem indiretamente de vários dos dispositivos dessa lei, a exemplo do § 4° do art. 9° e do inc. VII do art. 18.
Esse não só é o magistério, sempre preciso, de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (Curso cit., p. 467) como é o mais amplo dentre os encontráveis em ilustres autores especializados. Com efeito, nessa passagem, depois de demonstrar que a possibilidade de alteração das cláusulas regulamentares da concessão de serviço público está presente em vários dispositivos desse diploma legal, conclui:
“O fato é que, estivesse ou não mencionado o poder de alteração unilateral das condições de prestação do serviço, haver-se-ia sempre de considerá-lo implícito na própria natureza do instituto. É que, por estar em pauta um serviço público - ou obra pública, como resulta da já mencionada dicção desabrida do art. 2°, II -, jamais poderia o concedente despojar-se do elementar dever jurídico de ajustar o serviço ou a obra ao interesse público, sempre que suas cambiantes necessidades o impusessem”.
A conclusão, portanto, é uma só: a Administração Pública concedente pode alterar as condições da execução do serviço público trespassado e, por conseguinte, modificar o objeto da concessão de serviço público e do próprio contrato de concessão-permissão.
O problema, portanto, não está na modificabilidade dessas cláusulas, sempre possíveis, mas nos limites desse dever-poder. Quais são esses limites? Se existentes, onde estão eles previstos?
Se é induvidosa a possibilidade de alteração do objeto da concessão de serviço público, cabe à Administração Pública concedente promover essas alterações para atender ao interesse público.
Aliás, vigora nesse particular, o princípio da modificabilidade dos contratos administrativos.
A concessão de serviço público é contrato administrativo e como tal seu objeto pode ser modificado segundo o interesse público.
O que não se admite é a troca do objeto ou a alteração dos seus elementos essenciais.
Se alguma medida, obviamente legislativa, viesse a estabelecer limites tão ínfimos a esse dever-poder da Administração Pública concedente-permitente de modificar o objeto da concessão-permissão, seria, certamente, considerada incompatível com ditos princípios e com o interesse público.
Por conseguinte, qualquer interpretação abonadora de critérios assim restritivos deve ser imediatamente rechaçada.
Seria inconcebível pudesse a Administração Pública concedente-permitente impor ao concessionário-permissionário a troca do objeto, exigindo outro em seu lugar, ou que determinasse a alteração de um de seus elementos característicos.
Desse modo, a alteração do objeto da concessão de serviço público seria possível desde que não atingisse o próprio objeto ou algum elemento havido como essencial na sua configuração.
Portanto, é proibida a troca do objeto imposta pela Administração Pública concedente, passando esse, por exemplo, de transporte coletivo de passageiros para serviço funerário.
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Desse modo também entende HELY LOPES MEIRELLES (Estudos e Pareceres de Direito Público, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1981, vol. III, p. 479).
Com efeito, acentua esse clássico administrativista, em lição ainda útil e aplicável ao contrato de concessão, que:
“O essencial, para a legitimidade das alterações contratuais, é que o objeto do contrato não seja modificado em sua substância, mormente se a avença foi precedida de licitação, como é a regra nas contratações administrativas. Com efeito, qualquer alteração que afete a natureza do objeto, tal como descrito no instrumento convocatório (objeto da licitação) e no subseqüente instrumento contratual (objeto do contrato), consubstanciará inovação absolutamente vedada pela sistemática das contratações administrativas, sem que se ponha fim ao ajuste anterior e se pratiquem todos os atos e se realizem todos os procedimentos necessários à celebração de um novo contrato, inclusive a licitação, pertinente ao novo objeto”. (omissis)
“Insistimos, todavia, em que só existirá inovação do objeto quando a alteração pretendida afetá-lo na sua essência, aferida apenas por sua descrição, ‘sucinta e clara’ no instrumento convocatório (Lei 89/72, art. 32, I), ou no instrumento contratual, com seus elementos característicos (Lei 89/72, art. 41, I), sem se cogitar das especificações e demais elementos técnicos, fornecidos para a sua execução em plena conformidade com o requerido pela Administração. Assim, se o objeto, tanto na licitação como no contrato, for a construção de um edifício, será ilegítima a sua modificação para a construção de uma ponte (inovação do objeto). Tal não ocorrerá, porém, se a alteração visar apenas adaptações do projeto original, tendo em vista uma nova destinação para o edifício (modificação de cláusulas de serviço), ou se, de um conjunto, suprimir um ou mais edifícios (redução do objeto)”.
No caso da concessão de serviço de transporte de passageiros por meio de ônibus, a Administração Pública concedente pode impor o prolongamento do itinerário para alcançar a população de certo bairro que se desenvolve rapidamente ou determinar que a freqüência horária dos ônibus seja maior nos momentos em que cresce a demanda do serviço concedido ou mesmo no decorrer de sua prestação normal, se o número de passageiros vem se tornando mais significativo.
Cumpre notar que a expressão supra utilizada “no interesse do serviço do transporte” vale dizer, a prestação de SERVIÇO ADEQUADO ao pleno atendimento dos usuários do Serviço de Transporte Coletivo de passageiros no Município de Atibaia, conforme dispõe o artigo 6º da Lei Federal nº. 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, sendo considerado um “serviço adequado” aquele que satisfaça as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.
Acrescente-se ainda que a manutenção do equilíbrio econômico e financeiro do Contrato de Concessão constitui um dos direitos da Concessionária.
Essas alterações são legais e nenhum limite incide sobre elas, salvo a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro se e quando rompido por essas medidas.
Não é outra a inteligência de MARÇAL JUSTEN FILHO (Concessões cit., p. 254) ao versar sobre as alterações do objeto do contrato, como poder exorbitante da Administração Pública concedente.
Assim, a partir das parcerias entre o ente público e a iniciativa privada devidamente garantidas por estes direitos legais e constitucionais, surgiu a esperança de se obter uma melhoria na prestação dos serviços públicos.
Essas parcerias proporcionaram, como é sabido, ao Estado, a oportunidade de aliviar os gastos na manutenção de determinados serviços e, ao mesmo tempo, controlar a prestação adequada do serviço feita pelo concessionário à coletividade.
No entanto, para que isto ocorra, o Estado deve, primeiramente, atrair o particular. Ou seja, demonstrar-lhe que todo o investimento disponibilizado lhe será devolvido na forma de lucro.
Além do mais, sabe-se que, pelo fato das prestações de serviços apresentarem certa complexidade em sua execução, os contratos administrativos normalmente são de longo prazo.
É a partir daí que surge a preocupação do particular quanto à segurança financeira do contrato.
Isto porque o Brasil, face à aparente instabilidade econômica que enfrenta, deve garantir ao concessionário aquilo que foi pactuado no contrato, mantendo, dessa maneira, o seu equilíbrio econômico-financeiro.
Assim sendo, diante da necessidade que o Estado tem de apelar à iniciativa privada para a delegação de certos serviços, deverá entrever o princípio do equilíbrio econômico-financeiro do contrato como uma garantia incontestável.
Portanto, advindo fatos imprevistos ao contrato de concessão, deverá a administração pública agir imediatamente, evitando um prejuízo desnecessário ao concessionário.
O princípio do equilíbrio econômico-financeiro visa a manter uma justa relação entre os contratantes, de forma que nenhum obtenha vantagem calcada no prejuízo do outro, estabelecendo-se com isso, uma relação amparada pela boa-fé e pela equidade.
Esta justa relação entre os contratantes surge a partir da celebração do contrato e deverá perdurar até o seu final.
A igualdade existente entre os contratantes é formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo concessionário no contrato, e do outro, pela compensação financeira a que fará jus.
Logo, sempre que ocorra um fato que afronte o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, de modo a prejudicar o particular, o Estado deverá, prontamente, recompor os termos do contrato.
Frise-se que a aplicação do princípio econômico-financeiro não está condicionada a cláusulas contratuais, mas, pelo contrário, a própria Constituição Federal garante expressamente a sua aplicação.
Ou seja, mesmo que não venha expressamente previsto no contrato, a aplicação da garantia do equilíbrio econômico-financeiro é direito do concessionário. Tal garantia está muito além do simples requisito de previsão contratual.
O princípio do equilíbrio financeiro baseia-se em regras principiológicas assentes no Direito Brasileiro, quais sejam, (i) o princípio da equidade; (ii) o princípio da razoabilidade; (iii) o princípio da continuidade do contrato administrativo e (iv) o princípio da indisponibilidade do interesse público.
Ressalte-se que, ao manter o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, o Estado estará, também, garantindo aos usuários a prestação adequada do serviço e evitando que o mesmo se deteriore.
A mencionada parceria entre o ente público e a iniciativa privada estabelece-se através dos contratos de concessão.
Estas avenças são regidas pelo princípio da legalidade, de modo que, tanto o concessionário como o poder concedente, submetem-se ao ordenamento jurídico que regula a matéria.
O princípio do equilíbrio econômico-financeiro nos contratos está explicitamente amparado na legislação brasileira, tanto na Constituição Federal, como nas leis ordinárias
A Constituição trata diretamente do assunto em seu artigo 37, XI, onde a garantia não abrange somente os contratos de concessão mas, também, todos os contratos administrativos.
No que se refere às Leis infraconstitucionais, podemos destacar duas: a primeira é a Lei 8.987/95 que regula os contratos de concessão em geral; a segunda é a Lei 8.666/93, que trata das licitações e dos contratos administrativos.
Logo, não há que falar em ausência de previsão legal quanto ao princípio do equilíbrio econômico-financeiro.
Ao revés, o sistema jurídico brasileiro prevê, claramente, a garantia ao aludido princípio como direito inerentes aos contratos de concessão.
Os contratos de concessão apresentam certas diferenças dos contratos celebrados entre particulares. Entretanto, ambos submetem-se à teoria geral dos contratos.
Todo contrato de concessão é consensual, formal, sinalagmático, oneroso, comutativo e realizado intuitu personae.
Os contratos celebrados com o ente público têm como característica a mutabilidade. Assim sendo, o poder concedente pode, unilateralmente, modificar o contrato, objetivando o interesse público.
Esta característica está ligada à existência das cláusulas exorbitantes, que somente são previstas nos contratos celebrados com a administração pública.
A aplicação das cláusulas exorbitantes, cabe única e exclusivamente ao poder concedente.
Outra nota importante do contrato de concessão é a de pressupor sempre um procedimento licitatório.
Logo, o contrato celebrado com o particular deverá observar todos os requisitos expressos no edital de licitação, sob pena de nulidade.
Nos contratos de concessão, o particular nunca será o dono dos serviços, muito pelo contrário, este será somente prestador do serviço, e estará sempre à mercê da supervisão administrativa.
Conforme se sabe, de um lado temos a administração pública exigindo do contratado a prestação adequada dos serviços, do outro, temos o concessionário em busca do lucro.
O lucro do concessionário é auferido através do preço público, mais conhecido como tarifa, e é utilizado de duas formas.
A primeira delas é na aplicação de parte desse lucro na expansão e melhoria dos serviços públicos, e a segunda, para reaver o investimento aplicado.
A fixação do preço das tarifas deve atender ao princípio da razoabilidade, de forma que, as tarifas devem corresponder a um valor acessível ao usuário e, concomitantemente, permitir ao concessionário a obtenção de uma justa remuneração.
Vale dizer que o princípio da modicidade das tarifas também está ligado à fixação do preço da tarifa, sendo que tal princípio se esgota no fato das tarifas deverem corresponder ao menor preço possível sem, é claro, prejudicar a prestação adequada do serviço público.
Objetivando tornar o preço da tarifa mais baixo, o poder concedente poderá também outorgar ao concessionário o direito do explorar as receitas alternativas.
Essas receitas são aquelas que não estão ligadas diretamente à prestação do serviço como, v.g., explorar ao longo de uma estrada os espaços publicitários.
Neste diapasão cumpre dizer que a exploração das receitas alternativas objetiva baratear o preço das tarifas cobradas dos usuários pelo concessionário.
Consigne-se que o valor da tarifa será sempre estipulado pelo poder concedente, sendo certo que, nem mesmo através de lei, tal competência poderá ser transferida ao concessionário, que poderá tão somente contribuir com estudos para fixação desta.
Em se tratando do prazo dos contratos de concessão, diferentemente dos contratos administrativos, são celebrados por prazos bastante longos.
Esta característica permite ao concessionário a recuperação do seu investimento, sem que tenha que aumentar o preço da tarifa.
Prazos longos, conseqüentemente mais tempo para obter lucro e assim cobrir os investimentos realizados.
Há, nos contratos de concessão, a exigência de que os serviços sejam prestados pelo concessionário de forma adequada.
Entende-se por serviço adequado o prestado de forma eficiente e através do menor custo ao usuário. Mais precisamente, no § 1.º, do art. 6.º, da Lei de Concessões (8.987/95), pode-se verificar os requisitos para a prestação de um serviço adequado, quais sejam: regularidade, continuidade, eficiência, segurança, generalidade cortesia, atualidade e, por último, a modicidade da tarifa.
Cabe ao Estado fiscalizar os trabalhos realizados pelo concessionário, garantindo pois, aos usuários a prestação de um serviço adequado.
Considerando a complexidade da execução da prestação dos serviços públicos, bem como os seus elevados custos, é possível ao concessionário obter financiamentos junto à qualquer instituição financeira para colaborar na elaboração das obras.
Deve ficar consignado, que esse financiamento está diretamente ligado à concessão, ou seja, o concessionário somente contrairá o empréstimo para a consecução das obras necessárias à prestação do serviço.
Poderá ainda o concessionário garantir à instituição financeira, os benefícios que serão auferidos na prestação do serviço público, visando a garantir o contrato de empréstimo celebrado.
Neste caso, diante da ocorrência de qualquer fato que acarrete o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, deverá a administração restabelecer as condições, sob pena de estar prejudicando o concessionário e a instituição financeira patrocinante da obra.
A quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato poderá ocorrer por diversas razões.
A primeira delas são as áleas ordinárias.
Essas áleas referem-se aos riscos previstos em todos os contratos, correspondendo à variação de lucro do concessionário em decorrência da própria flutuação do mercado.
Em segundo, temos as áleas administrativas, que podem acarretar a quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de duas formas: (i) através do fato do príncipe ou (ii) através do poder de alteração unilateral da administração.
O fato do príncipe ocorre quando uma autoridade, da mesma esfera do governo no contrato celebrado, pratique algum ato que prejudique o concessionário, de modo a desequilibrar a equação financeira do contrato.
Já o ato da administração, representa a execução de qualquer conduta da administração que impossibilite a execução do contrato, ou que prejudique o equilíbrio econômico-financeiro do mesmo.
Vale dizer que o ato praticado deverá, necessariamente, provir de uma das partes no contrato.
Por último, temos as áleas extraordinárias, que correspondem ao acontecimento imprevisíveis, inevitáveis, externos ao contrato, causadores de danos insuportáveis ao concessionário.
A solução da quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, será efetuada com base na teoria da imprevisão (antiga cláusula rebus sic stantibus), evitando assim um prejuízo ao particular contratado.
Ocorrendo quaisquer das hipóteses mencionadas acima, caberá ao poder concedente tomar as medidas necessárias ao estabelecimento das condições iniciais do contrato (encargo/remuneração).
Aludidas medidas podem ser realizadas administrativamente, ou através do Poder Judiciário.
Em princípio, a restauração do contrato deverá ser procedida por via administrativa, através do seu aditamento.
Ocorre, todavia, que, na maioria das vezes, mesmo diante do explicito desequilíbrio contratual, o Poder Concedente não adota as medidas necessárias.
O reequilíbrio econômico-financeiro do contrato dá-se através da revisão e do reajuste das tarifas.
A revisão pode ser requerida pelo concessionário a qualquer tempo do contrato, e não precisa estar nele previamente prevista.
Conforme dito, é uma garantia do concessionário prevista na Constituição Federal.
O concessionário deverá apresentar um laudo demonstrando a ocorrência da quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Outra modalidade de se manter o equilíbrio econômico-financeiro, será através do reajuste.
O reajuste ocorre, normalmente, uma vez por ano, e deve vir inicialmente determinado no contrato.
O seu objetivo é preservar o equilíbrio econômico-financeiro estabelecido inicialmente, com o aumento do preço dos insumos ligados à prestação do serviço, em virtude da inflação.
Caso o poder concedente não atenda à solicitação do concessionário, caberá a este recorrer ao Poder Judiciário buscando o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.
Campinas, 16 de abril de 2021