Eu nunca sofri racismo no Brasil

Tenho 59 anos e nunca sofri qualquer discriminação de cor. Nunca fui abordado na rua quando passeava de bicicleta por policias querendo saber se eu a tinha roubado; sempre fui bem atendido nos restaurantes que frequentei; nunca fui abordado pela polícia quando voltava da escola com meus colegas; nenhum segurança de supermercado me abordou e espancou; ninguém me levou algemado em uma moto em plena avenida; nunca fui barrado em loja nenhuma e nunca precisei ensinar aos meus filhos a andar com as mãos nos bolsos dentro das lojas para não serem seguidos por seguranças. Então, como eu, homem branco, hetero e de classe média posso contestar a existência de racismo ou de qualquer preconceito de cor, gênero ou opção sexual no Brasil?

Não posso! O que posso fazer é engrossar as vozes e ações daqueles que convivem diariamente com o medo, que por si só já é uma violência. Me indignar, revoltar, gritar e xingar se for preciso. O silêncio não é uma opção.

No livro “Na Minha Pele”, Lázaro Ramos descreve que na educação dos filhos dele entra um ingrediente que não faz parte da educação que dou aos meus filhos: ensinar o medo da polícia e dos “homens de bem”. E isso é muito assustador! Para que a realidade comece a mudar, precisamos transferir esse medo. Transferir para os racistas, para os assassinos e os agressores. As pessoas que não se convencem de que o racismo é crime devem ser silenciadas pelo medo de serem presas.

Entendo que a mudança é uma responsabilidade dos negros que conseguiram sobreviver e furaram as barreiras, chegando aos cargos de delegados, procuradores do Ministério Público, juízes e por aqueles que, mesmo não tendo a pele negra, são comprometidos com a mudança radical dessa realidade. As penas precisam ser exemplares, as punições severas e absolutamente legais. Para civis, militares, policiais, políticos, jornalistas ou seja lá quem for. O militar branco que não se sente suspeito estando em um carro na porta de seu condomínio, mas entende suspeito um trabalhador que procura as chaves de sua casa na mochila, por ele ser negro, precisa pegar trinta anos de prisão, mesmo que haja atenuantes, mesmo que seja réu primário, para que outros militares tenham medo de repetirem o mesmo ato.

O racismo estrutural, bem dissecado no livro de Silvio Almeida, praticado pelo Estado e tolerado pela sociedade, só será modificado por dois caminhos, o do convencimento, daí a importância dos movimentos sociais, e o do medo. Mas não esperem que um Estado branco faça isso, o Estado negro, ou comprometido com o negro, terá que assumir este papel.

Rafael Brais

Assessor de Comunicação

3 a

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