Gestão Humanizada dá Resultado
Capa do livro Empresas Humanizadas

Gestão Humanizada dá Resultado

Hoje vejo com bons olhos a movimentação de inúmeras empresas em direção a uma gestão humanizada. É um caminho ainda longo, mas felizmente sem volta. Essa movimentação me traz muita satisfação, afinal eu acredito muito nisso e prático a gestão humanizada desde o início da minha carreira. Mas essa prática nem sempre foi fácil, afinal sempre atuei na área comercial. Na área comercial você tinha (e tem) que apresentar resultados praticamente diários,  a cobrança era intensa, e muitas vezes me tornava incompreendido e confundido com ser “bonzinho“ demais com o time, tratar muito bem os parceiros comerciais e ser muito humano para um ambiente profissional, para uma área tão “nervosa”.

Para esclarecer  melhor o que estou falando, vou contar uma breve história sobre quando comecei a refletir sobre esse conceito de gestão humanizada.

Há mais de 25 anos começava minha carreira no varejo como trainee de uma grande rede de lojas, me reportando a uma gerente de produto que já atuava há muito tempo nessa área. A primeira orientação que ela me passou, depois de eu ter me empolgado e elogiado umas amostras de mochilas de um fornecedor que ficaram muito bacanas, foi : “ Você não pode elogiar nada que eles fizerem, pois vão querer cobrar mais caro”.

Para muitas pessoas esse feedback pode parecer absurdo, mas vamos entender o contexto da época. Naquele momento a grande referência em gestão era uma empresa onde, nas reuniões de resultado, quem ficasse abaixo da meta recebia tomates de pelúcia  arremessados pelos próprios colegas, ou quem não fechasse a meta do dia tinha que “pagar” pelo mal desempenho com uma série flexões. Ainda havia histórias contadas por fornecedores sobre a empresa concorrente: se eles fornecessem para uma unidade de negócios dentro da própria companhia, os fornecedores seriam proibidos de vender para qualquer outra sala de lá mesmo sob pena de ter as compras suspensas, mesmo que fosse beneficiar a própria empresa, mas devido à grande concorrência interna isso não era aceitável. Logicamente não era uma política explícita da empresa, era extra- oficial praticada pelos gestores. O ambiente era de alta competitividade por busca de resultados incessantes, não importando a forma (“Não importa se é pato ou pata eu quero ovo”, lembra?), não existia o tal assédio moral e nem o termo “tóxico” como é usado hoje para definir certos ambientes, pessoas e empresas.

 Era talvez um tempo muito diferente, era a lógica de agir e pensar naquele momento, era o que tínhamos para ontem. E nem critico a tal gerente.

Apesar de estar inserido naquele contexto, aquilo não fazia nenhum sentido para mim, não queria privar um parceiro comercial da verdade sobre o resultado de seu trabalho, também não agiria com meus pares de empresa como se fossem concorrentes ou até mesmo inimigos e quando passei a ter uma equipe, jamais imaginei humilhar alguém que não trouxesse resultado, não seria esse rumo que tomaria na minha carreira, nunca!

A partir do momento que comecei a ter autonomia, consegui colocar em prática o que realmente acreditava, tinha um compromisso comigo mesmo, vencer na área comercial de forma humana sem precisar violentar meus princípios. Eu queria provar para mim mesmo que isso era possível, que poderia sobreviver nessa área colocando as pessoas de forma verdadeira em primeiro lugar, que o resultado não deixaria de vir com essa visão, digamos fora da curva naqueles tempos.

Tenho que confessar que, seguir esse caminho não era garantia de sucesso, mas também não tinha outra escolha uma vez que não conseguiria seguir de outro jeito.

Vocês devem perguntar: mas de que jeito? Naquele momento, não havia um conceito claro e foi algo intuitivo. Revejo hoje o processo, e conhecendo ações de muitas empresas consideradas humanizadas e posso citar doze que compõem esse “jeito”:

1) Ser detalhista no trato com as pessoas enxergar as pessoas como indivíduos singulares para deixar florescer o melhor de cada um.

2) Investir nos pontos fortes das pessoas ao invés de focar em corrigir fraquezas para ser uma das alavancas de desenvolvimento do potencial.

3) Confiar antes de desconfiar e aceitar pagar o custo  para manter a relação de confiança com time. Demonstrar essa confiança sem ficar controlando (controle esse muitas vezes disfarçado pelo termo micro gerenciamento), checando ou conferindo.

 4) Celebrar sempre, elogiar sempre, reconhecer sempre, na frente de todos, muitas vezes. Muito mais elogios do que críticas.

5) Dividir seu bônus com as pessoas do time que não recebem, ou recebem muito menos devido à política estabelecida pela empresa.

6) Entender que o senso de urgência não vem antes da saúde das pessoas.

7) Agir com fair play com todos seus stakeholders. Essa regra deve ser infringível e ficar clara para todos. Se você sempre agir assim, será criado um ambiente de confiança e tudo vai fluir melhor.

8) Cobrar as entregas de forma, justa, honesta e sempre respeitosa. Jamais torturar alguém por um resultado melhor e não se transformar num moedor de pessoas.

9) Desenvolver relacionamento real com as pessoas. Entender que, apesar de ser um ambiente profissional, as pessoas são humanas. O cérebro que está presente no “ horário comercial” é o mesmíssimo cérebro que está na vida pessoal: o mesmo circuito, as mesmas emoções, pois não existe a divisão pessoal/profissional. É uma coisa só, é pessoal.

10) Dar feedbacks verdadeiros e sinceros, mas com empatia e compaixão. A verdade deve ser como um grande diamante entregue numa linda caixa de presente e não arremessado como uma pedra, pois pode machucar.

11) Ter presença de forma positiva na alegria e na tristeza (não ser um presente de grego).

12) Ser um líder servidor, humilde, generoso administrando pelo exemplo.

Esses pilares foram para mim a chave do sucesso. Com eles atingi resultados numéricos muito bons ao longo da carreira que certamente me proporcionaram a continuidade dentro da área comercial por 25 anos. 

No entanto, sempre me questionei qual era a ordem dos fatores, se fazia uma gestão humanizada para obter resultado ou buscava o resultado para continuar fazendo uma administração humana? Sabia que para manter esse ambiente, para aplicar esses pilares no dia-a-dia só com resultados numéricos (crescimento, rentabilidade e atingimento de metas) acontecendo. Na verdade, a resposta é clara hoje, já que o que realmente me faz feliz é poder fazer uma gestão humanizada, poder ajudar pessoas a crescerem e florescerem. Sobre esse assunto, Bob Chapman traz um conceito interessante em seu livro “Todos são importantes- O Extraordinário Poder das empresas que cuidam de Pessoas como Gente, e não Ativos”. O autor traz a seguinte reflexão: “trate cada liderado da forma que você gostaria que seus filhos fossem tratados onde eles trabalham.” Quem não é pai ainda pode trocar na frase filhos por pais.

Minha forma de trabalho foi acelerada dentro da Dafiti, empresa que estou há quase 10 anos, Na Dafiti deu “match”, isto é, um casamento dos princípios da empresa com a forma que eu pratico a gestão.

A Dafiti é uma empresa nova (10 anos), seus fundadores também eram muito novos quando começaram a empresa (menos de 30 anos de idade). Dessa forma, ela sempre teve um olhar mais humanizado e tem essa visão voltada para os stakeholders. Essa cultura me propiciou um ambiente muito seguro para seguir com as práticas que sempre acreditei.

A visão que ela tem de seus parceiros (Marcas e Fornecedores) é muito diferente do que citei na história acima, e por isso, sempre pude desenvolver parcerias de confiança, colaborativas e transparentes que geraram ganhos mútuos por todo esse tempo.

Um exemplo disso foi numa reunião online que participei  há algumas semanas   com uma grande e especialíssima marca parceira. Nessa reunião estavam presentes um dos fundadores da Dafiti, a diretora comercial da Dafiti, o CEO e a diretora comercial dessa marca. Durante a reunião, o CEO da marca disse que eu era quase um membro da família deles. Essa menção me agradou muito por dois aspectos. O primeiro porque ficou clara a compreensão da relação de trabalho  entre mim – representando a Dafiti – e a empresa deles, todos do mesmo lado. O segundo foi quando o CEO se referiu à empresa dele como uma família, o que mostra que ele pratica uma gestão humanizada. Eu já tinha ciência dessa gestão humanizada por meio do contato com os funcionários com quem me relaciono ao longo desses anos, todos que trabalham lá amam a empresa de paixão. Fico feliz, pois é mais uma empresa no Brasil trilhando esse caminho.

A Dafiti também tem uma relação muito humana com os funcionários, respeita as diversidades(as notas mais altas nas pesquisas internas são relacionadas a esse tema) e tem grupos formados para zelar por isso. A Avaliação 360, a pesquisa de climas trimestrais, a avaliação do NPS dos gestores são encaradas seriamente e fazem parte dos resultados dos gestores que podem alcançar resultados numéricos, mas isso só não basta,  se seu time não estiver se sentindo bem com sua gestão, se seus pares te veem como tóxico, Squads onde você participa te olhem como não colaborativo seu resultado numérico será insuficiente e você não estará entregando um bom resultado para a companhia.

Uma coisa importante é que esses princípios não estão no papel apenas, mas sim na cabeça das pessoas que trabalham lá.

 Vale mencionar que tenho 55 anos, sou muito mais velho (apesar que todo mundo já sabia pela história do início rsrsr) que provavelmente todos na Dafiti e jamais sofri qualquer tipo de discriminação por causa da idade ( descobri recentemente que essa discriminação chama-se etarismo ou idadismo), pelo contrário até esqueço que sou mais velho que as pessoas lá, me sinto muito respeitado e valorizado por elas pela experiência que possuo e existe uma troca fantástica na qual transmito esses conhecimentos adquiridos ao longo da vida, mas recebo  uma nova visão que possibilita me reciclar dia a dia, fazendo com que evolua em todos os aspectos.

Com todas essas condições dadas na empresa, posso exercer o meu jeito de liderar de forma muito livre, consigo criar um ambiente para que as pessoas do meu time sejam autônomas, autodeterminadas e conectadas entre si e o resultado obtido é que ficam mais motivadas, produtivas e felizes (essa definição de motivação está baseada no livro de Daniel H. Pink- Drive).

Muitas ações são feitas nessa direção, além de reuniões normais de resultados, realizamos outras que não entram números, falamos sobre vitórias, conquistas, aprendizados, inspirações conhecimentos, reconhecimentos e celebramos tudo de bom que acontece e com quem acontece.

Pessoas florescem a olhos vistos, ex-jovem aprendiz dá palestra de investimentos para todo time, ex-assistentes falam sobre negociação: a mágica acontece o tempo todo.

Segundo dados do livro “Empresas humanizadas Pessoas-Propósito-Performance de Raj Sisodia/David Wolfe/Jag Sheth” ( foto da capa do livro que está nessa matéria), os resultados comparativos das empresas consideradas humanizadas versus as outras, inclusive as “Good to Great” são melhores, principalmente com o passar dos anos:

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No Brasil isso não é diferente, segundo o site Humanizadas.com que realiza pesquisas com empresas brasileiras elas também se destacam:

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Para finalizar alguns podem pensar e se eu não trabalho numa empresa com essa mentalidade como posso aplicar isso? A resposta é: você tem dois caminhos um é descobrir que empresas tem essa visão humanizada e entender se pode(e quer) buscar uma vaga para trabalhar nela e a outra é você se ver como uma empresa humanizada e agir dessa forma na empresa que está agora, ter a mesma coragem que essas empresas tem competindo num mercado que nem todas seguem essa linha, compreender que com o tempo pode ter múltiplas satisfações ,além do resultado simples(numérico). Você verá muita gente motivada e feliz, parceiros leais em busca do melhor para parceria, um time mais criativo, resolvendo problemas difíceis com soluções inesperadas, assim você vai contribuir dentro do seu espaço para algo maior, ajudar para que as pessoas sejam a melhor versão delas mesmas.




Sandra Santos Gonçalves

Executiva de RH | Gerente de RH | Operações de RH | Administração de Pessoal | Benefícios e Saúde | Liderança | Qualidade de Vida | Employee Experience | Mentoria

2 a

Excelente artigo! Muita inspiração!!!!

Van Sandrini

Especialista em Varejo - Tradicional ao Luxo| Foudadora da VaS| Estrategista| Senior Advisor| Conselheira| Mentora| Criadora do Método ESSE| Top 🔝 50 influenciadores de varejo no Brasil

3 a

Excelente reflexão e muito pertinente com a nova versão de liderança, humanista e colaborativa.

Fernanda Scavacini

Autora do livro "Abraça o Caos" | Mentora de gestores | LinkedIn Top Voice

3 a

Luciano Marcello é muito importante ver a forma com que você conseguiu reformular um ambiente, trazer uma nova cultura e mostrar que é possível ter uma equipe produtiva e obter excelentes resultados, sem precisar sacrificar pessoas em troca.

Izabella Camargo

Saúde Mental e Produtividade Sustentável | Segurança Psicológica de Times e Gerenciamento do Estresse | Palestrante 3x TEDx Speaker | Eleita maior Influenciadora de RH do Brasil pelo iBest | Escritora | Jornalista

3 a

Excelente! Obrigada por compartilhar! Parabéns! Seguimos em sintonia!

Camila Cavallo Dewers

Estilista | Vestuário Masculino

3 a

Lu, o texto transparece o líder que você é! Sou grata por ter tido a oportunidade de trabalhar ao seu lado. Que cada vez mais outros líderes e gestores possam abrir a cabeça e o coração para uma gestão humanizada. O mundo pede isso! Abraço.

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