São oito horas, levantei tomei um banho bem gostoso, e ainda com o cabelo molhado sem me preocupar com o secador, fiz uma torrada com manteiga bem quentinha e coloquei a capsula de café Dolce Gusto na máquina, para saborear lentamente meu café da manhã.
Continuo com o cabelo molhado, não usei batom e nem peguei meu rímel, porque hoje é o meu primeiro dia de " Home Office ", meio estranho porque na realidade é o meu primeiro dia de " Trabalho em Casa ", não sei se anglicismo ou não, mas não irei estrangeirizar uma expressão, sendo que Razão Social da empresa que me contratou leva ao final do seu nome: - DO ESTADO DE SÃO PAULO.
No silêncio da sala de estar ligo o computador, e estranho não haver ninguém para dar bom dia, abro o primeiro arquivo e me deparo com o logo que estou acostumada a ver mais robusto em uma tela de computador muito maior.
Uma sensação de agonia tenta interferir na minha concentração, afinal eu deveria estar feliz, pois trabalhar em casa é o sonho de consumo da maioria das pessoas, e seria o meu também se não fosse a situação que enquadrou meu crachá nessa lista.
Minha cidade não é a mesma, meu país não é o mesmo, o mundo não é o mesmo, e a palavra mais pesquisada no Google atualmente tem 8 letras: Pandemia.
Meu cabelo permanece molhado, bem diferente das minhas mãos que recebem a todo momento jatos generosos de álcool gel que secam rapidamente.
Na TV não tem programa da Ana Maria Braga, os museus estão fechados, os shoppings mudaram o horário, e o mais incrível as novelas irão parar. Nas redes sociais encontramos posts que pedem para comprarmos dos pequenos comerciantes, pois eles correm o risco de fechar. Um medo, nunca experimentado, leva meu pensamento para o futuro, e quase atrapalha as primeiras tarefas do dia inicial do tal " Home Office ", dias que já começam com vigência indeterminada.
Preciso continuar aqui, vou evitar aglomerações, vou sair somente em caso de extrema necessidade, vou produzir muito, afinal, o Programa Poupatempo deve continuar com sua função social, o mundo tem que permanecer dando voltas saudáveis, minha cidade apesar de vazia tem que renascer, vou fazer isso por mim, por você, por minha mãe de 90 anos, não vou parar, porque sei que da mesma forma que meu cabelo estará seco sem o uso secador, esse vírus que transforma a vida de milhares de pessoas, apesar de ter coroa de Rei, será futuramente apenas uma sequência genômica, desvendada e vencida pelo Homem.