Jazigo das vaidades: visita de secretário criou tensão entre Falcão e vereadores
Ao centro, Carlos Eduardo Amaral, secretário de saúde de minas; à direita, Ezequiel Macedo; à esquerda Falcão.

Jazigo das vaidades: visita de secretário criou tensão entre Falcão e vereadores


Base questionou exclusão do Legislativo e nos bastidores se falou em desrespeito 

Não fosse o caos provocado pela pandemia e a visita do secretário estadual de saúde, Carlos Eduardo Amaral, aquela seria uma terça-feira comum em Patos de Minas. Na agenda oficial constava apenas uma visita para “averiguar e traçar estratégias de combate à COVID-19 na região”. Entretanto, a pajelança terminou com uma bomba no Hospital Regional Antônio Dias e vereadores irritados. A Câmara se sentiu desprestigiada, pois, segundo fontes de bastidores, o presidente, e demais parlamentares, não foram convidados para as reuniões com o chefe da saúde no Estado. As exceções foram o irmão da vice-prefeita, Gladston Gabriel (PODE), presidente da comissão de saúde, e Cabo Batista (Cidadania). O policial da reserva aparece nas redes sociais de Gladston como representante do Legislativo, o que é incomum, pois, não compõe a mesa diretora. No entanto, Batista não estava na reunião ocorrida no gabinete do prefeito, que recebeu ainda o deputado estadual Hely Tarquínio (PV), o presidente da Fundação Hospitalar de Minas Gerais (FHEMIG), Fábio Baccheretti Vitor e assessores. Membros do Conselho Municipal de Saúde também reclamaram e questionaram os “encontros a portas fechadas”.

Àquela altura, o humor do parlamento havia azedado. Ezequiel Macedo (PP), com a autoridade do cargo de presidente, questionou o prefeito sobre a desfeita. Falcão respondeu de maneira consistente e com um bom argumento: queria evitar aglomerações. Para colocar panos quentes, convidou a todos para um cafezinho. Assessores da Casa comentaram entre si que o aceno soou como uma espécie de favor, uma migalha dos holofotes da vista de uma autoridade do Governo Mineiro. O balde de água fria veio na reunião extraordinária, que aconteceu no mesmo dia, à tarde. O prefeito compareceu a sessão de surpresa e com doze convidados a tiracolo, incluindo Carlos Eduardo Amaral. O bom argumento caiu por terra. Isso porque a plenária seria exclusiva aos vereadores e aos servidores da casa. No fim das contas, a arrumação foi feita para parecer tudo normal, mas não foi bem assim.

Os membros da base também protestaram. O primeiro a enquadrar o prefeito foi José Eustáquio de Faria (PODE), mas em off. Vitor Porto (Cidadania), que foi colega de Falcão no RenovaBR, fez questão expor a insatisfação e engrossar o caldo. Leu, em plenário, ofício, assinado pelos 17 vereadores, em que solicitava transparência nos dados sobre a vacinação no município. O prefeito reagiu com certa irritabilidade e usou uma expressão típica de quando está prestes a descer do salto: “Eu fico um pouco surpreso”. Havia ironia no tom da resposta. Porto usou a garrafinha de água, sua fiel companheira nas reuniões, para escorar o celular e gravar todo o discurso. Entre pessoas próximas, o vereador disse que aquela não seria a postura de um prefeito, se referendo ao imbróglio envolvendo o secretário.

Na quarta-feira, o golpe fatal: Zema autoriza o processo de terceirização do Hospital Regional. Por pouco o secretário vai embora sem comentar o assunto. O problema é que ele já havia passado pelo Legislativo sem dar satisfações sobre a polêmica. Vereadores chiaram e as manifestações contra a medida surgiram nas redes sociais. A oposição tomou um chapéu: ficou sabendo da tramoia no HRAD pela imprensa. E o mesmo vale para as entidades representativas da saúde. Todos pegos de surpresa.

Ao longo da semana, a tensão entre os dois poderes diminuiu. Só ficaram os sinais de uma base mal articulada e uma oposição desinformada. No fim das contas, a Câmara Municipal se transformou no jazigo das vaidades. Assim como no livro de Geraldo França Lima. Há até uma passagem que representa muito bem a maneira melancólica como a Casa encerrou os últimos dias: “No Solar, no entanto, persistia o bolor de mansão abandonada, tão intenso que empanava, espalhando-se por dentro, as cores das cortinas e dos estofos, de sorte que ali, no meio de coisas tão bonitas, tudo parecia esmaecido, os ânimos relaxando-se na amargura, no descontentamento, na biliosidade dos frustrados.” 


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