A jornada candidato
Oi, pessoal! Tudo bem?
Outro dia li aqui na rede que buscar emprego no Brasil é humilhante. O que você acha disso? Partindo de alguns pressupostos, podemos dizer que sim. Os processos estão arcaicos, exaustivos e não há feedback. Mas, como vimos no post anterior, algumas empresas estão tentando mudar os rumos do recrutamento.
Em muitos momentos me sinto no filme “De Volta para o Futuro 2”. Na parte em que o Marty está no futuro, vestindo roupas do futuro, mas a mente dele é do passado. Achamos que estamos no futuro, mas ainda estamos nos comportando como na década de 80. A gente até consegue ver o futuro, "estar" no futuro, mas ainda não se encaixa nele.
Fazer entrevistas às vezes é exaustivo. São quatro ou cinco no mesmo dia, por dias consecutivos. Até a garganta sente. Quando temos processos para vagas diferentes, de setores completamente diferentes, tudo fica ainda mais complexo. Cada empresa tem um storytelling, um prazo, uma demanda e até mesmo um processo diferente. Contratação é coisa séria e precisa ser tratada como tal.
O início da jornada
Certa vez, entrevistei uma executiva que estava empregada em uma gigante farmacêutica para uma posição de Diretoria de Compliance na empresa onde eu trabalhava. Era uma sexta-feira, 16 h, na Barra da Tijuca, aqui no Rio de Janeiro. Comecei a entrevista com sol na janela, um belo pôr do sol nos brindou em determinado momento e quando a entrevista acabou já passava das 18h.
Eu já tinha um excelente storytelling na ponta da língua. Começamos falando da empresa, de por que eu havia decidido me juntar a eles e do que já conhecia. Fomos para a experiência dela, primeiro falando do CV, e depois mergulhando em águas mais profundas. Comecei com os porquês e, na sequência, fui entender os “para quens” e “por quens”.
Vejam só: a candidata foi a uma entrevista na Barra da Tijuca (que pode ser bem longe para alguns, especialmente numa sexta-feira, no fim do expediente). Estava muito elegante, de unhas feitas e cabelo aparentemente escovado para a ocasião. Se preparou, então havia uma expectativa, um desejo de se juntar ao quadro de funcionários da empresa.
Observava a sala e os elementos que estavam ali presentes. Tomamos um café na área de convivência e a vista era realmente linda - ela ficou encantada! Dava para perceber a vontade de passar no processo aumentando. Essa é a jornada do candidato. Desde o primeiro contato.
Terminada a entrevista e todas as dúvidas tiradas de ambos os lados, agradeci. Antes de se despedir, ela me disse que havia sido a melhor entrevista da sua vida, que havia sido um momento de troca formidável e que, mesmo que não ficasse ali, sabia que era uma empresa excepcional pelo que eu havia dito e demonstrado durante todo o nosso tempo juntas, e que agora ela sabia até mesmo como ser entrevistada e como responder melhor!
Naquele dia fui para casa dirigindo com uma imensa alegria. Eu havia encontrado o meu ponto. E, de lá para cá, tenho ouvido isso muitas vezes.
Esse “causo” que contei aqui é muito recompensador, não é mesmo? É fruto de trabalho, aprendizado e muito jogo de cintura. No mercado de recrutamento tem de tudo. Tem candidato que nunca responde, tem recrutador pavão que fala mais dele mesmo e das suas excepcionais experiências do que da trajetória do candidato, que é o que de fato importa.
Tem empresa que não sabe o que quer e muda o perfil no meio do processo, tem entrevistador que não conhece a empresa e confunde o candidato. Mas também tem bastante coisa positiva, como as contratações que dão gosto de ver.
Já fiz contratações que mudaram por completo a vida das pessoas. Lembro de um candidato que fez a sua primeira viagem de avião depois que foi contratado, pois seu salário quase dobrou e agora dava pra viajar até pra fora do Brasil. Incontáveis pessoas trocaram de carro, tiveram filhos, compraram casa, realizaram sonhos…
Como iniciar um processo seletivo
Bom, e como eu faço meus processos? Eu tenho minha matriz de candidatos, que fui eu mesma que desenvolvi, e nela tenho tudo que preciso saber sobre cada processo. Faço, também, uma planilha de aderência, outra ferramenta feita por mim que elenca as competências de cada perfil que busco.
Como eu acho os candidatos? A maior parte deles por candidatura simplificada e pesquisa booleana ativa no Linkedin. Eu, particularmente, prefiro buscar o candidato, o famoso hunting, à candidatura. Me sinto melhor buscando exatamente o que eu quero/acredito.
Para isso, meu primeiro passo é conversar com o meu cliente interno ou externo para saber exatamente do que ele precisa. Gosto de conversar com o gestor da vaga também, a fim de buscar mais informações sobre o dia a dia da função, o que a pessoa vai fazer de fato, e como ela contribui com os processos do setor, verificando se há interface com outros departamentos, por exemplo.
Leio atentamente o descritivo de cargo e busco os dados da empresa; faço o storytelling e abordo os candidatos, pedindo os currículos e dando algumas informações básicas. Marco as entrevistas, leio e releio o CV, faço anotações sobre ele e já começo a pensar nas perguntas, tanto as iniciais quanto as mais profundas.
A condução da entrevista
Costumo dividir a entrevista em três partes: falo brevemente de mim, apresento a empresa/vaga largamente e, a partir daí, ouço atentamente. O foco deve estar totalmente no candidato - em muitas entrevistas deixei o telefone guardado e levei apenas o CV e uma caneta colorida. Sabe aquele livro “O poder do agora”? Ele fala bastante sobre isso. Leia se puder.
Durante a entrevista, sou eu e o candidato. O mundo para. Presto atenção nos trejeitos, no falar, no desenvolver das ideias e no concatenar dos assuntos. Em média, sabemos se há fit em poucos minutos, mas você precisa realmente prestar atenção.
A matemática costuma ser a seguinte: abordo cerca de 30 pessoas e entrevisto uma média de 15 candidatos para cada posição, para encontrar 3 finalistas. Claro que existem posições cujos perfis são escassos no mercado, mas normalmente a média é esta. Não descanso se não encontrar pelo menos três pessoas que atendam a todos os requisitos obrigatórios.
Recomendados pelo LinkedIn
Peço referências, sempre, e quando possível peço que todo o time entreviste o candidato, em vez de somente o gestor. Todos precisam se conhecer, pois é como um namoro. As expectativas dos dois lados devem ser consideradas.
Um processo seletivo criterioso mostra respeito aos candidatos, ao seu time e à sua empresa. Pense sempre nisso. Certamente algumas empresas não têm esta cultura e não é possível criá-la em pouco tempo, então se esforce para seguir o melhor modelo possível e não aceite como resposta o “nós sempre fizemos assim...”, que é a pior frase que se pode ouvir dentro de uma empresa.
Com relação aos porquês, para quem e por quem que falei ali em cima, bom, este assunto sozinho já vale um post específico, mas vou tentar explicar em poucas linhas.
Os porquês, para quem e por quem
Os porquês se referem aos processos. Procuro entender a cadeia de valor da posição que o candidato ocupa no momento. Quero entender mesmo como as coisas funcionam, e por isso acabo quase sempre preferindo “o porquê” ao “o quê”.
Normalmente o “o que” está descrito no CV. Já “o porquê” surge como uma possibilidade de mergulho. Um candidato mais sênior não tem dificuldade em fazer este mergulho junto com o recrutador, e neste ponto eu já tenho uma boa ideia de onde ele está em termos de classificação de cargos.
Uma pergunta que eu gosto de fazer é: “por que você tem essa responsabilidade?”, fazendo referência a uma função exercida pelo candidato. A partir desta resposta eu consigo emendar outros porquês, alguns “comos”, “quais”, “quem” e “quandos”.
Por exemplo: como você fazia esta entrega? Que pessoas (cargos) estavam envolvidas nesta demanda? Quais os impactos desta atividade no caixa ou na estratégia da empresa? Quando a empresa optou por este tipo de relatório? A quais resultados você chegou nesta função?
Todos esses detalhes me interessam, pois preciso entender o contexto geral para montar um quebra-cabeças mentalmente. Anoto tudo e, se precisar, retorno. Uma boa entrevista não dura apenas uma hora.
Entendido o quebra-cabeças, eu vou para a cereja do bolo: POR QUEM. E ali, diante dos meus olhos, o candidato se abre. Talvez o fator motivador para buscar um novo emprego seja ganhar mais, trabalhar remoto ou mudar de estado, mas o propósito deste candidato é comprar uma casa para os pais, passar mais tempo com a família, fazer um curso de outro idioma, viajar o mundo, se casar, comprar uma moto, ter uma casa com piscina... Sei lá, mas nessa hora aparece.
Tudo é comunicação
Esta técnica e a forma de fazer as perguntas eu desenvolvi com o tempo. Um bom recrutador entende que a comunicação afeta o comportamento, então, ao fazer uma entrevista intelectualmente estimulante, se coloca anos luz à frente de outros recrutadores que ficam apenas na superfície. Alguém já disse que a excelência vem com o hábito, e os hábitos são criados no dia a dia, um por um. Pratique.
A dor de praticamente todas as empresas está em encontrar bons profissionais, atrair, contratar e engajar estes talentos. Não sei por quanto tempo mas, se antes as empresas escolhiam os candidatos, agora são os candidatos que escolhem a empresa onde querem trabalhar.
Acredito que isso aconteceu como uma motivação inconsciente das pessoas por acreditarem, instintivamente, que os processos de recrutamento estavam totalmente ultrapassados. Assim, tomaram para si o protagonismo, o que acabou criando esta nova conduta que está sendo moldada diante dos nossos olhos.
Neste cenário, a jornada do candidato, ou candidate experience, é uma das possibilidades quem vem tomando corpo ultimamente para que o despertar do desejo pelas empresas aconteça. Sou do coro que acredita que a experiência da candidatura precisa ser simples, rápida, fácil e, se possível, criativa para promover de cara o interesse dos melhores candidatos pela sua empresa.
Pense sempre no seguinte: se mesmo antes de se juntar à sua empresa o candidato tiver uma boa experiência com ela, esse será um dos fatores fundamentais para gerar o “sim” dele para você, além de potencializar as chances de essa interação ficar tão boa que a conexão será inevitável. Não é assim quando você se candidata a uma vaga? É preciso se colocar no lugar do candidato. Lembre-se do namoro: a gente é seduzido por boas experiências.
Candidatos não selecionados também merecem consideração
Não adianta fazer tudo bonitinho se falhar na comunicação e se não der feedback. O bom recrutador sabe administrar seu tempo para que seja possível dar respostas a todos os candidatos. Uma dica infalível é incluir no seu calendário semanal duas ou três horas para responder as mensagens, e-mails e directs. Colocar na agenda mesmo, como um compromisso lá no seu calendário.
O candidato que se inscreveu e não foi chamado para a entrevista também deve receber uma mensagem, ainda que seja um e-mail padrão de agradecimento. O mesmo vale para aquele que foi entrevistado mas não avançou no processo. A meta é não deixar ninguém para trás!
Não podemos deixar um candidato esperando eternamente até acabar se dando conta sozinho que não foi aprovado. Isto é péssimo e pode acabar comprometendo a sua reputação enquanto recrutador, além da imagem da empresa. Sou a favor do feedback praticamente imediato. Se o candidato não apresenta os requisitos necessários, para que criar expectativas? Sou contra manter o candidato baseada em "vai que o gestor não aprova ninguém, pelo menos tenho este na manga". Esta é uma forma de enxergar o candidato como um recurso, nada humano.
Independentemente do tamanho e do orçamento da empresa, existem várias maneiras de investir no candidate experience. Lembre-se de que isso impacta diretamente na reputação das empresas e inclui a percepção que as pessoas têm da marca empregadora. Vamos falar sobre isso no próximo post, sempre às quartas. Até breve!
Aproveita e me segue lá no Instagram, criei uma conta para falar de Recursos Humanos @euleticiamolinaro
Diretora Administrativo Financeiro
2 aMuito legal seu posicionamento Letícia! Parabéns! 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻
Sócio-diretor na QuemIndiq
2 a👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼
Digital Business Solutions | Learn and Transformation " Mais MULHERES na Tecnologia"
2 aEnquanto a alta gestão não sentir no resultado $$$$$ o impacto de um trabalho mal feito, as coisas não mudarão. Enquanto candidatos forem em maior numero que as vagas disponíveis.... alguns mercados, como de tecnologia, que a demanda de vagas é muito grande e este mercado está altamente competitivo a jornada passou a ser outra, pois os profissionais são assediados a todo instante e eles migram para opções aonde se sentem vistos, acolhidos desde o processo seletivo.... O mercado só se coça quando o resultado não vem.... Obrigada pelo conteúdo, é isso ai. Vamos sempre provocar reflexões e melhorias...
Administração | Varejo & Atacado | Serviços Técnicos | Sustentabilidade | Indústria Química l Novos Mercados | Excelência Operacional | Desenvolvimento de Talentos | Liderança Inspiradora | Omnichannel
2 aÓtimo conteúdo! Acredito que chave para o sucesso do candidato, e do recrutador, seja a condução das perguntas e transparência. Já fui entrevistado por bons profissionais de RH, que souberam extrair muito bem meu histórico profissional. “Todos na busca pelo pôr do sol.” Sucesso