LEI DE LIBERDADE ECONÔMICA
Introdução
Ao corrigir para a inflação, segundo o IBGE (2018), o salário médio no Brasil hoje é 15% menor do que ele era em 2004. O salário médio basicamente está estagnado há 15 anos isso levando em consideração que somos um país jovem e com alta capacidade produtiva. Isso acontece basicamente por falta de Liberdade Econômica.
Para entender a importância da liberdade econômica pode-se fazer uma comparação com a Estônia, país de 1,3 milhão de habitantes que se separou da União Soviética em 1991 na mais absoluta miséria. Segundo o Instituto Mises Brasil (2018), mesmo com toda a crise que assolava o país, as medidas estruturais tomadas tornaram a Estônia um dos países mais livres economicamente do mundo. Fatores como livre comércio, incentivo ao empreendedorismo, uma legislação que versa sobre a proteção da propriedade privada e cumprimento de contratos merecem destaque. O salário médio na Estônia hoje, em relação a 1999, é 2,25 vezes maior, girando em torno de R$ 5.800,00 por mês. Novamente, oportuna comparação com o Brasil, onde o salário médio é de R$ 2.340,00, conforme retratou a Country Economy (2019).
A questão que intriga é: por que isso acontece? Como um país que estava em estado de miséria em pouco mais de duas décadas obteve um crescimento tão expressivo? O que levou o Brasil, neste mesmo lapso temporal, à estagnação? No ranking de facilidade para fazer negócios do Banco Mundial (2019), de 190 países o Brasil está na posição 124º. O posicionamento piora ao se isolarem certos fatores: na facilidade em se abrir uma empresa, o Brasil está em 140, lidar com autorizações para construção, ocupa a posição 175º, amargando, assim, umas das piores colocações do mundo.
Este artigo buscou tecer uma reflexão profunda sobre o panorama e a realidade jurídica-econômica do nosso país. Fatores como abusos regulatórios, burocracia e instabilidade jurídica que impedem o almejado desenvolvimento social foram objeto de exploração. Na sequência, procurou-se analisar a Lei 13.874/19, que, com suas especificidades, traz segurança jurídica para contratos, simplifica processos, facilita o empreendedorismo, destituindo alvarás, licenças e taxas abusivas que, além de encarecerem o sistema, abrem margem para a corrupção, que pode impactar direta e indiretamente a cadeia produtiva brasileira, buscando trazer à tona o porquê de sua essência ter de ser aplicada e também ampliada, pois, mais do que está descrito de forma taxativa, ela é, em última análise, um sinal (nacional e internacional) de que o Brasil está apto e disposto a receber investimento e prosperar no cenário mundial.
Panorama de Realidades Jurídicas-econômicas
Ao se analisar o cenário brasileiro no início de 2019, antes da promulgação da Lei 13.874, verifica-se um país em estado de falência. Em junho, o Congresso Nacional aprovou um crédito suplementar1 ao tom de R$ 248,9 bilhões, quebrando a regra de ouro para pagar despesa corrente, em suma INSS. Este contexto econômico apresenta uma problemática profunda, pois basicamente o Brasil estava se afundando ainda mais em juros, não para realização de investimentos, que poderiam gerar um retorno no futuro, mas sim para cobrir gasto público corrente. A alta taxa de desemprego e a desvalorização progressiva da moeda, que atingiu 80% desde a implementação do Plano Real, em 1994 (Folha de S. Paulo, 2019), tornaram o cenário brasileiro catastrófico.
A situação fática relatada deve ser observada sob a ótica da real conjuntura e mentalidade legislativa em resolver problemas. Em um cenário de crise, de corrosão da moeda e alto nível de desemprego, a solução proposta foi tomar mais empréstimo, pagar ainda mais juros sem solucionar a questão, pelo contrário, optou-se por empurrar o problema para frente, descartando a possibilidade de interferir de forma clara, direta e precisa no modelo estrutural econômico para que ao invés de fazer empréstimos, tornar o país mais competitivo e capaz de gerar riqueza com auto suficiência.
Desta forma, Ramos (2017) abordou o modus operandi cultural de ensinamentos intervencionistas na academia jurídica brasileira2 , elencando diversas críticas sobre suas consequências. Foi ressaltado como o ensino jurídico no Brasil é enviesado de ações intervencionistas, com a onisciência de burocratas reguladores, e como isso afeta a estrutura principiológica da nossa legislação, tornando o Brasil um antro de ineficiência e baixa competitividade.
O resultado prático desta estrutura é a realidade brasileira de hoje. No ranking de facilidade para fazer negócios do Banco Mundial (2019), de 190 países o Brasil ocupa a posição 124º. O posicionamento piora quando se leva em conta, isoladamente, certos fatores como a facilidade em se abrir uma empresa, em que o Brasil figura em 140º, e lidar com autorizações para construção, ocupando o país a 175º. Um levantamento feito pelo Global Business Complexity Index e publicado pela TMF Group, ao consultar 7,8 mil especialistas em 80 países, colocou o Brasil em uma classificação de complexidade de 81%, amargando o terceiro lugar de pior país para se fazerem negócios. Apesar de o Brasil oferecer muita oportunidade, segundo a TMF Group, as empresas multinacionais não têm acesso ao mercado nacional devido à complexidade elevada em função dos altos níveis de burocracia e estruturas reguladoras. O impacto avança no que diz respeito à insegurança jurídica, muitas vezes com leis difíceis de se interpretarem e decisões arbitrárias.
Diante do exposto em tela, as consequências são alarmantes: quando corrigido pela inflação, segundo o IBGE (2018), o salário médio hoje é 15% menor do que era em 2004. O salário médio basicamente está estagnado há 15 anos, isso levando em consideração que o Brasil é um país jovem e com alta capacidade produtiva. O mesmo instituto publicou, em 2017, que cerca de 54,8 milhões de brasileiros (26,5% da população) vivem na linha da pobreza, com renda familiar de R$ 387,07, e 15,2 milhões de pessoas (7,4%) estão na linha da extrema pobreza, com renda inferior a R$ 140,00 por mês. Essa é a triste realidade do Brasil.
A curiosidade que fica em torno do tema: por que alguns países desfrutam de riqueza e prosperidade e outros parecem condenados aos sintomas da pobreza? O que há de comum entre os que enriqueceram? A obra A Riqueza das Nações3 traça o perfil das instituições políticas-econômicas e defende que fatores como livre comércio, incentivo ao empreendedorismo, uma legislação que versa sobre a proteção da propriedade privada e cumprimento de contratos é vital para a pujança econômica. Assim, na contramão do retrocesso, das leis intervencionistas e índices altíssimos de burocracia, testemunhamos um país que é o exemplo prático de que o progresso humano está diretamente ligado à liberdade econômica. A Estônia, com maestria, mostra como políticasadequadas podem acelerar o desenvolvimento econômico de forma expressiva.
Artigo publicado pelo Instituto Mises Brasil4 (2018) tece um panorama sobre a Estônia (um país de 1,3 milhão de habitantes), que, após 51 anos dominada pela União Soviética (um regime totalitário, intervencionista, estatizante e que regia todas as políticas de mercado num planejamento central), conseguiu, em 1991, a sua independência, mas em estado econômico de completa e absoluta miséria. Diante da magnitude do problema, diferentemente do Brasil, medidas estruturais foram tomadas e, a partir destas, se tornaram um dos países mais livres economicamente do mundo.
As reformas foram profundas, sendo a mais urgente a monetária, tendo adotado a Currency Board5. Uma série de privatizações e cortes de subsídios foram aplicados, e isso foi crucial para o desenvolvimento de novas empresas privadas. Além disso, houve a abertura de mercado com redução de tarifas para importação, e o orçamento foi equilibrado, com prioridade de eliminar o déficit orçamentário.
As consequências foram demasiadamente positivas. Moeda forte, orçamento equilibrado e liberdade econômica foram vitais para a Estônia estar bem colocada em medições publicadas pelo Banco Mundial. Uma invejável dívida pública de 9,5% do PIB (Produto Interno Bruto) e taxa de desemprego abaixo da média da União Europeia (5,3%). O salário médio na Estônia hoje, em relação a 1999, é 2,25 maior. Hoje o salário médio gira em torno de R$ 5.800,00 por mês, montante relevante em comparação com o Brasil, onde o salário médio é de R$ 2.340,00 (COUNTRY ECONOMY, 2019).
Resguardadas todas as proporções, realidades e contextos históricos de cada país, a reflexão é válida ao se levar em consideração a mentalidade em resolver problemas quando se está diante da dificuldade. Mentalidades opostas, e inevitavelmente levaram a consequências diferentes. Antes tarde do que nunca, diante de um cenário alarmante que clama por mudança, o Brasil, em 20 de setembro de 2019, com uma legislação diferente, ousou mudar, abandonar o viés intervencionista (RAMOS, 2020), aprovando a Lei nº 13.874/19, a Lei da Liberdade Econômica.
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Os Principais Aspectos da Lei 13.874/19
A referida lei traz uma nova fase de relação do Estado com o empresariado. Busca tratar de forma clara o respeito a contratos, a boafé e a vulnerabilidade do particular perante o Estado, invertendo a lógica regulatória legislativa brasileira. Solidifica-se em três pilares: declaração dos direitos de liberdade econômica, a definição de abuso regulatório e a segurança jurídica para contratos.
No que tange ao primeiro pilar, da Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, o art. 3º busca garantir a toda pessoa, natural ou jurídica, direitos essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômico. Dentre elas, a supressão da necessidade de quaisquer atos públicos para liberação de atividades de baixo risco, em suma, alvarás. Liberdade para desenvolver as atividades econômicas em relação a horário e dia para trabalho, sem que para isso esteja sujeita a cobranças ou encargos adicionais, respeitando a legislação trabalhista. Aprovação tácita da atividade quando apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo e transcorrido o prazo fixado devido ao silêncio da autoridade competente, e não ser exigido mais documentos pela administração públicas em previsão legal. Ficou claro que as medidas adotadas neste tópico versam diretamente sobre a desburocratização e facilitação para se empreender no país.
O segundo pilar tem por objetivo basicamente analisar o abuso regulatório. O art. 4º é claro e categórico ao impedir a reserva de mercado, dificultando a entrada de novos competidores (nacionais e internacionais). Veda redações que impeçam ou atrasem inovações e tecnologias ou criem reservas artificiais de mercado, não podendo exigir, sob pretexto de inscrição tributária, requerimentos de outra natureza para gerar efeito de alvará. Também proíbe a restrição ao uso e exercício da publicidade e propaganda sobre um setor econômico, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em Lei Federal.
O último pilar basicamente versa sobre dar mais segurança jurídica aos contratos privados. O art. 7º faz uma pequena alteração no Código Civil, trazendo à tona o instituto da não confusão da pessoa jurídica com os de seus sócios e da possibilidade de as partes pactuarem regras de interpretação, preenchimento de lacunas e integração dos negócios jurídicos diversas da prevista em lei, presumindo que contratos civis e empresariais são paritários e simétricos, reforçando a autonomia da vontade e deslocando a intervenção estatal em relação ao particular.
Impactos na Realidade Brasileirasileira
Segundo Lorenzon7, há uma presunção de que só existe a possibilidade de desenvolver uma atividade econômica se assim permitida pelo Estado. Esta é a mentalidade vigente no governo e na advocacia de maneira geral. Na prática, se não for feito algo ampla e explicitamente permitido por Lei, o indivíduo correrá sérios riscos de sofrer sanções e punições por fiscais administrativos. A Lei 13.874/2019 aborda vários temas e pontos que auxiliam e facilitam a vida daquele que pretende gerar riqueza, dando ao indivíduo força para se voltar contra o Estado quando a matéria é empreender.
Os impactos de conceder força ao particular perante o Estado trarão benefícios diretos e indiretos à economia, afetando a vida dos brasileiros. Como ficou demonstrado, o dispositivo interfere diretamente em atividades de baixo risco. A dispensa de alvará atingirá 289 tipos de atividades econômicas, beneficiando 10,3 milhões de empresas, as quais representam 58% do total de empreendimentos, segundo a Agência Brasil (2020). Uebel8 (2020) aponta que o fim da exigência impulsionará o ambiente de negócios no país e permitirá ao governo concentrar a fiscalização nas atividades de médio e alto riscos, concentrando tempo e recurso na área que realmente importa.
O pilar legislativo, cujo alicerce é a reprovação ao abuso regulatório, dará mais dinamismo inclusive aos empreendimentos mais complexos. Somado à aprovação tácita da atividade quando apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo e transcorrido o prazo fixado devido ao silêncio da autoridade competente, otimizará tempo, estimulando a entrada de novos players, principalmente micro e pequenos empresários, que segundo o Sebrae (2019), são responsáveis por 99,1% de todas as empresas no Brasil e por 75% dos empregos formais. Esta medida propõe uma circunstância disruptiva para uma economia em recessão, aquecendo a produção, fator vital para gerar riqueza (SEBRAE, 2019).
Por fim, o instituto, ao fazer uma alteração precisa no Código Civil, procurando limitar a interferência do judiciário na busca por recursos decorrentes da desconsideração da personalidade jurídica, garante a segurança jurídica necessária para que grandes investimentos sejam feitos, atraindo o capital necessário à realização das atividades. Segurança jurídica que consiste em uma das principais formas de reduzir riscos e aumentar a confiança de investidores no país, fator considerado chave para que os investidores estrangeiros tomem a decisão de investir (PICCIOTTO, 1998)9. Assim, a lei, presumindo-se a boa-fé objetiva do investidor e limitando-se a responsabilidade perante sua respectiva cota participativa, pretende garantir a tão esperada segurança jurídica.
O dispositivo legal, por si só, não resolve todos os problemas estruturais econômicos do Brasil; por ser oriundo de uma medida provisória, possui limitações técnicas. Porém, a legislação representa um avanço histórico, pois pela primeira vez criou-se um corpo legislativo dedicado a preservar e aplicar a liberdade no ramo econômico. A referida legislação tem potencial para colocar o Brasil numa posição extremamente relevante no cenário econômico e de investimentos, em patamar internacional. Aplicada em sua máxima potência, poderá trazer resultados tanto a curto quanto a médio e longo prazos, do que países ricos hoje têm o privilégio de usufruir: prosperidade.
A espécie humana é incapaz de ser estudada de forma científica, pois humanos estudando humanos estão sempre sujeitos à valoração pessoal, por isso é delicado usar estatística para comprovar modelos econômicos, devido à imprecisão das subjetividades. Mesmo usando covariância estatística e aceitando a visão latu sensu experimental humana, países que hoje desfrutam da prosperidade, riqueza e pujança se valeram de uma coisa em comum: a Liberdade Econômica.
Considerações Finais
O trabalho buscou, após apresentar brevemente o cenário econômico nacional, fazer uma comparação entre dois países com problemas estruturais e suas respectivas formas de lidar com a situação. Também buscou demonstrar a importância da Lei 13.874/19, trazendo à tona não só apenas a diferença legislativa, mas também a enraizada mentalidade principiológica que se reflete no ordenamento jurídico como um todo. Demonstrou-se que, assim como a Estônia, o Brasil possui diversos problemas econômicos, porém cada nação adotou métodos diferentes para solução dos entraves econômicos, que acabaram acarretando um crescimento econômico de forma muito distinta.
A Lei da liberdade econômica, de forma pontual, específica e promissora, apresenta uma nova realidade jurídica, com reflexos econômicos, conferindo mais autonomia aos empresários do país e fazendo alguns ajustes no ordenamento jurídico, com o propósito de dar mais liberdade econômica, definir o que é abuso regulatório e dar segurança jurídica a quem empreende e gera riqueza e busca sanar, dentro de seus limites, as deficiências que tornam o Brasil um antro de burocracia e ineficiência. Portanto, com a criação da Lei em comento, havendo sua implementação certeira, isso poderá gerar reflexos positivos para o Brasil. Afinal, verifica-se a possibilidade de se cumprirem os três pilares básicos para o prognóstico de uma boa economia, facilitando a vida de quem quer gerar riqueza. Sendo o primeiro pilar a busca da garantia a toda pessoa, natural ou jurídica, dos direitos essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômico. No segundo pilar, foi identificado as medidas que impedem ou atrasam novas inovações, bem como frustram o abuso de regulamentos impeditivos do Estado. Por fim, no terceiro pilar encontramos a não confusão da pessoa jurídica com a de seus sócios, dificultando, assim, a desconsideração da personalidade jurídica pelo Código Civil. Desse modo, oferece-se mais segurança jurídica ao empresário perante seu risco de insucesso.
A Liberdade Econômica é tão relevante que foi um dos temas abordados no evento realizado, em 2019, pela Universidade de Araraquara, a XLVIII Semana Jurídica, a qual é organizada pelo homenageado nesta obra, o professor e mestre Fernando Passos. Além de coordenador do curso de Direito da UNIARA, é professor de direito empresarial e renomado advogado atuante na área, em vista disso, nobre conhecedor das barreiras jurídicas e econômicas encontradas pelos empresários no país. Logo, a Lei é tão importante que o homenageado fez questão de colocar o tema em pauta no evento, para que seus lecionandos tivessem conhecimento do quão benéfico para a economia o assunto é. Posto isto, concluímos que o novo marco legal não veio apenas para modificar o ordenamento jurídico, mas, se explorado de forma correta, alavancará a economia do país.