Lemann: "É hora de aprender com as empresas mais inovadoras"
Para empresário, talentos precisam mais de conhecimento tecnológico do que só "brilho nos olhos e faca nos dentes
“Mudar uma cultura que foi bem-sucedida por muitos anos não é fácil e em uma empresa grande as coisas andam devagar”, admite Jorge Paulo Lemann, fundador da AB Inbev e um dos homens de negócios mais bem-sucedidos do país. Para ele, as empresas do Vale do Silício criaram um sistema de inovação muito melhor do que o que sua companhia tem hoje, portanto, há muito que aprender e se adaptar. O empresário participou hoje do encontro anual, desta vez virtual, com os líderes da Fundação Estudar, da qual é fundador e que oferece bolsas de estudo para brasileiros em grandes universidades no exterior. Lemann foi entrevistado e entrevistou Henrique Dubugras, fundador da fintech Brex, avaliada em mais de U$ 2,6 bilhões, que foi bolsista da Estudar e estudou na Universidade de Stanford.
Lemann endossa o que muitos profissionais já admitiram na pandemia dizendo que está se sentindo mais produtivo no trabalho remoto. “Faço menos viagens, tenho menos jantares e acho que as reuniões por Zoom são bem mais objetivas”, afirmou. Ele acredita que a partir de agora todo mundo vai trabalhar mais de casa e essa mudança será positiva. Na Ambev, por exemplo, a maior dificuldade com a gestão remota está sendo sentida no programa de trainees. Tradicionalmente, a companhia forma talentos dentro de casa e recruta jovens em todo o mundo. “Vamos ter que encontrar soluções para fazer esse treinamento a distância”.
O empresário admite que sua companhia, que já foi modelo de sucesso seguido por muitos empresários, está tendo que se reinventar. “Estamos tentando manter as coisas boas do nosso passado e aprender com empresas inovadoras como a Amazon”, disse. Na era digital, segundo ele, o consumidor tem mais opções, quer inovações, então é preciso entender bem o que ele quer. “Antes, comprávamos negócios que já tinham uma grande fatia do mercado e que eram estabelecidos, agora o mundo mudou.”
Até o perfil de profissional que a Ambev buscava hoje é outro. “Antes precisávamos de brilho nos olhos, faca nos dentes, agora pode ter isso mas tem que ter mais conhecimento técnico e estar melhor preparado em termos tecnológicos”, disse. Como investidor, Lemann diz que está se organizando melhor. Ele conta que antes investia em negócios de pessoas que conhecia e que, embora isso ainda possa acontecer eventualmente, está mais seletivo. Sua equipe analisa com lupa cinco a dez negócios por semana. “Estamos mais organizados, mas ainda acho que o bom empreendedor tem um sonho grande, executa bem e é adaptável.”
Assim como aconteceu com a Brex, que captou dinheiro no exterior, Lemann acredita que este é ainda o caminho mais eficiente para os empreendedores brasileiros. “Lá fora eles dão crédito baseado no que é o projeto, as oportunidades são maiores.” Ele diz que como investidor está se moldando à nova realidade. Antes, quando via empresas crescendo apenas em vendas, perguntava onde estava o lucro e não recebia respostas. “Passei dez anos procurando o lucro da Amazon e veja aonde ela chegou”. Para ele, as maiores empresas serão as de tecnologia. Um exemplo é a valorização recente do Mercado Livre na bolsa. “Vamos ficar para trás um pouco”, referindo-se a Ambev.
Em relação a atividades filantrópicas, Lemann diz que elas também estão mudando. O que se fazia antes já não é suficiente para encher os olhos dos jovens de hoje. Se antes a Ambev reciclava latas porque era algo relacionado com o negócio, agora ela tem que ir além. Na pandemia, a empresa produziu álcool com gel, fez máscaras e entrou em uma parceria para construir uma fábrica nacional para a produção de vacinas contra a covid-19. “O jovem quer empresas que praticam filantropia de uma forma mais ampla, reciclar lata já não é o suficiente.”
KJ
https://glo.bo/31EBJoZ