A liderança além do glamour

Vivemos em um cenário de extrema exposição do tema liderança. Os colaboradores, cada vez mais, desejam ter líderes geniais, aqueles de capa de revista, afinal, “esse cara vai me ajudar e ele é moderno”. Em geral, os coordenadores e supervisores se deslumbram com cargos de gestão de pessoas. Logo saem lendo mil e um livros afim de estruturar sua atuação. Métodos, tabelas, processos. Tudo que houver para facilitar, acelerar e nos colocar no próximo cargo.

Não está errado, é parte do processo, ainda mais em um ambiente de tanta busca pelo imediato. Tudo virou comida de microondas, fast food. Queremos tudo logo, antes. Navegamos no mar da ansiedade. Mal do século XXI, viver do amanha, sofrendo pelo ontem.

Porém, vejo que cada vez menos nos preparamos para assumir estas responsabilidades e trabalhar para realmente formar novos líderes, que possam de fato levar nossos negócios de um ponto A para o B. Um líder que não inspira pelo menos 1 pessoa, deveria se questionar! Aos mais seniors, creio que a principal métrica em seu objetivo de “people development” deveria ser “formar novos líderes”. Mas ainda vemos mais casos em que o importante é gerir recursos e entregar o número. Óbvio que não podemos esquecer a essência do negócio - atender aos clientes, dar lucro ao acionista e pagar a nossa mesada!

Por isso, gosto sempre de separar a gestão, da liderança. Para gestão, podemos definir modelos, estruturar muito bem e ate replicar com maior nível de homogeneidade em organizações complexas por exemplo. Um bom início para isso é que a empresa defina qual seu modelo operacional, suas práticas de governança e processos chaves. Tudo isso envolve definições de quem é responsável, accountable, consultado e informado. O famoso RACI chart. Podemos ter modelos centralizados ou matriciais. Podem ser hierárquicos ou verticais autônomos. Tudo isso precisa ser setado para definir que modelo de gestão os lideres vão aplicar. 

Uma empresa pode ter um modelo de gestão bem difundido e buscar também um certo nível de padrão entre os estilos de liderança, visando dar coesão, acelerar crescimento ou até mesmo a propagação da cultura organizacional. Uma das maiores do mundo divide as culturas organizacionais basicamente em 4 tipos: 

• Fabrica de líderes (GE, Mc, PepsiCo)

• Moldadores de Mercados (Disney, google, Airbnb)

• Melhoria continua (Toyota)

• Central de talentos (Morgan Stanley)

Porém, estilo de liderança é algo muito vinculado aos aspectos íntimos da pessoa em papel de líder. Um teste DISC, por exemplo, pode dar claros sinais de diferença na atuação do líder com sua equipe, pares, colegas e superiores. 

E aí começamos a perceber que não adianta querermos impor mudanças e padrões. Cada ser é diferente. Ouvimos muito: “o líder deve tratar a cada um personalizadamente”, mas ouvimos pouco “cada líder que passa na nossa vida traz uma forma única de nos direcionar”.

Queremos ser tratados sempre da forma que gostamos, mas não estamos dispostos a entender que nossos líderes são diferentes de nós e entre si. Julgamos a nós mesmos pela intenção e os outros pelo comportamento. No fundo, somos pessoas com os mesmos níveis de desafio, cada um à sua maneira, tentando nos relacionar. Liderar começa por lidar com gente e, lidar com gente, passa sempre por como lidar com julgamentos, até mesmo inconscientes. Hoje, um está na situação de líder e outro de liderado, porém isso é situacional. Portanto, aprender a se relacionar e explorar esse ponto é vital para aprender a se autoconhecer e desenvolver a capacidade de apresentar comportamentos mais adequados a cada perfil de pessoa (até mesmo o líder).

Naturalmente, há um nível de responsabilidade imenso em ser líder. Vejo que alguns passos de consciência são fundamentais para um líder ter sucesso:

• Se autoconhecer ao máximo;

• Reconhecer (para si e para o time - transparência) seus comportamentos saudáveis e prejudiciais;

• Lidar com as emoções sem afetar negativamente seus relacionamentos;

• Encontrar seus valores pessoais e profissionais e como eles se potencializam. Tentar identificar esses valores nos colaboradores. 

• Descobrir com autocrítica quais as suas qualidades e suas fraquezas.

• Definir seu propósito como líder, que passa por entender como usar suas características, suas qualidades, seus valores e seus hábitos para atingir seus objetivos enquanto líder de pessoas.

• Dar atenção as pessoas: conhecer, perguntar, envolver, ser inclusivo, apoiar, ser hands on e fazer junto, ser transparente, quebrar os muros, ensinar, dar coaching e feedback.

Com tudo isso em mãos, o líder passa a ter naturalmente mais autoconfiança, afinal, ele sabe quais as ferramentas, habilidades e comportamentos podem lhe levar ao sucesso e também compreende melhores caminhos para extrair o máximo de cada profissional. Então, além dos resultados profissionais, passam a encontrar realização pessoal enquanto líder!

Um líder confiante consegue ser capaz de passar seu entusiasmo e confiança para os colaboradores, bem como se adapta mais facilmente aos modelos operacionais das companhias e consegue executar modelos de gestão diversos em estruturas organizacionais variadas. Acompanhadas da confiança, temos um aumento da espontaneidade e do uso da intuição. Se atentar mais ao agora e ao processo em si, do que o resultado a ser obtido, sem duvidas vai gerar um nível de conexão com as pessoas. Esse é o link para inspirarmos o próximo. O time se conecta e até mesmo se sente representado pelas ações do líder. A partir daí, o elo se fortalece e coisas incríveis acontecem!

Um ponto que pode otimizar ou minimizar o sucesso do líder é o nível de adesão entre os seus próprios valores e os da companhia onde esteja atuando. Um líder muito consciente de seus valores e que sabe o impacto positivo ou negativo para si mesmo de estar atrelado ou não à cultura da empresa acaba por transmitir seus sentimentos para a equipe. Portanto, é altamente recomendável que os líderes busquem trabalhar em empresas que se conectem aos seus próprios valores. Isso serve naturalmente a todos nós, mas os líderes tem uma forte responsabilidade de engajar pessoas e maximizar seus resultados. Como isso geralmente passa por entusiasmo, motivação e satisfação, será muito difícil ver sucesso consistente em equipes lideradas por pessoas que não se aderem aos valores da cia.

Portanto, primeiro cada colaborador deve se autoresponsabilizar por sua carreira e assumir sua parcela no relacionamento com o líder e com o desenvolvimento que este o ajuda a conquistar. O famoso mimimi tem que acabar. Ao líder, cabe se autoconhecer, se empoderar em relação à sua responsabilidade, assumindo que lhe foi concedido o direito e o dever de zelar pela empresa e por cada um de seus colaboradores. Até porque, pesquisas comprovam que pessoas pedem demissão do chefe mais do que das empresas. Gosto de dizer aos mais próximos que: “Alguém está investindo pesado para que você possa preparar pessoas para fazerem a empresa crescer e, se possível, sem contar com você nesse cargo”. Ou seja, crie rapidamente um sucessor melhor que você, pois você será reconhecido por isso. É isso mesmo: MELHOR QUE VOCÊ!

Aliás, fecho com esse segredo, que aprendi com os meus líderes, pelo exemplo de como fazer e, por que não, de como não fazer: jamais tenha medo de liderar e formar pessoas melhores que você. Esse sinal de humildade e generosidade voltará para você, pois reconhecer em alguém tamanha qualidade e potencial, extrair tudo isso e ainda ter a capacidade de levá-lo adiante, sem duvidas é o passo mais gratificante na vida de um líder! Eu que o diga!