Máquinas comportamentais
Como as máquinas podem analisar o comportamento humano para mudar a dinâmica de preços e reconstruir a economia como conhecemos.
Nas escolas de economia e nas mentes dos consumidores está impregnada a famosa relação oferta e demanda. Essa é a cartilha seguida há mais de um século para determinar os preços do mercado. Mas será que no mundo das máquinas isso pode mudar? Vamos analisar.
Primeiro, é importante saber que esses agregados econômicos— oferta e demanda — tentam representar o comportamento do mercado de forma genérica devido à falta de precisão dos dados individuais de cada agente, ou seja, o comportamento das pessoas.
Por essa limitação, todos os modelos econômicos que conhecemos— micros e macros — partem da premissa de que é preciso agregar os dados, pois não conseguem representar cada agente individualmente. Portanto, podemos dizer que os modelos que conhecemos e utilizamos para definir as regras econômicas da nossa sociedade são modelos não-baseados em agentes.
Talvez você já tenha ouvido falar que Facebook, Google, Amazon e Apple estão utilizando os dados dos nossos smartphones para analisar comportamento e enviar conteúdo “relevante” baseado nos nossos interesses. Pois bem, essa é só a ponta do iceberg.
É importante saber também que na última década dois prêmios Nobels de economia foram dados para estudos que mostraram como a percepção de valor muda, e portanto redefine, preços com base em variáveis comportamentais. Dados que desafiaram o pensamento econômico clássico.
É possível que você já esteja cansado de ouvir falar que a inteligência artificial vai mudar tudo. Mas tudo o quê? Se a maioria dos apps que você instalou no seu celular são uns chatbots que somam 2+2 pra dizer que você está prestes a estourar seu cheque especial?
Depois dessa breve introdução vamos ao que interessa! Junte a captura de dados em tempo real, a análise da economia comportamental e o uso decente da inteligência artificial e você terá o que pode chamar de Modelo Econômico Computacional Baseado em Agente.
Bonito né? Mas como fomos doutrinados a ter o pensamento econômico clássico, não aprendemos a usar esse modelo. Porém, é possível que essa seja a próxima fronteira na utilização das máquinas, redefinindo preços e reconstruindo a economia como conhecemos.
Você já imaginou se o governo pudesse saber em tempo real gastos e receitas individualizados para definir taxas de juros e impostos sem criar nenhum rombo nas contas públicas? Seria um mundo lindo, não é ? E eu acredito nele. Mas vamos tentar simplificar e usar um exemplo de feirante para falar de um modelo complexo.
Imagine que você é um produtor de maçãs e precise definir por quanto vai vender cada cesta de maçãs. Imagine ainda que você é um produtor muito esperto e sabe que existem vários tipos de consumidores, por isso você cria vários tamanhos de cestas.
Vamos supor ainda que sua produção seja de 1000 maçãs, seu custo seja de $1000,00 e que você queira ter um lucro total de 25% nas vendas.
É natural que o cliente que compra a maior quantidade tenha o maior desconto. Então você divide suas maçãs em 50 cestas de 10 que você vai vender por $12,00 (+20%) e outras 100 cestas de 5 que você vai vender por $6,50 (+30%).
Se você fizer as contas vai ver que nesse mundo ideal você vai faturar $1250,00. Ou seja, os 25% de lucro pretendido. O único problema é que o mundo ideal não existe, e nos baseamos em variações mais sofisticadas dele para precificar praticamente tudo na nossa sociedade.
Ou você acha que esse vendedor de maças — esperto — vai achar exatamente 50 compradores de cestas de $12,00 e exatamente 100 compradores de cestas de $6,50? Só no mundo de Alice. Porque na prática alguém vai sair perdendo.
Seja o próprio vendedor porque não vai vender todas as cestas e ver suas maçãs apodrecerem ou algum comprador porque teve que pagar caro por alguém que se beneficiou de um desconto oportunista e, por isso, é desistimulado a comprar mais cestas.
Em última instância a sociedade desperdiça recurso, produz menos e todos saem perdendo. Parece um clássico problema de teoria dos jogos e se, não tivéssemos as tecnologias atuais, provavelmente estaríamos presos nele para sempre.
Mas grandes inovações estão surgindo devido a facilidade que temos hoje em dia de interagir diretamente com os agentes (ou usuários). O empoderamento do consumidor cria novas oportunidades para todos quem sabe jogar esse novo jogo.
Ok, e como se bota isso em prática? É aí que entram as máquinas comportamentais!
Analisando individualmente a interação de cada agente em tempo real podemos criar modelos de precificação baseados na percepção de valor de cada usuário-agente e rebalancear a distribuição de preços.
Esse preço será justo na visão do consumidor porque parte da sua percepção de valor. Ainda pode otimizar o lucro do vendedor já que seu produto é vendido pelo valor agregado e não somente pelo preço, evitando guerras de preçco e sobretaxar alguns consumidores injustamente. Parece lindo, não?
Agora pense em um produto que você queria comprar pela internet. Você não tem um valor que acha justo pagar por ele? Um valor que te deixaria com aquela sensação de satisfação por ter feito negócio? Todo mundo tem.
Espero com as poucas linhas desse artigo ajudar a despertar o interesse para que as empresas se libertarem do pensamento econômico clássico e transformem o usuário na principal variável dentro dos modelos de precificação.
Temos tecnologia e conhecimento para isso. Basta entender um pouco melhor do mundo das máquinas e fugir do senso comum. Assim teremos negócios mais saudáveis e consumidores muito mais satisfeitos. Esse é o futuro.
SAP BI HANA/BW Senior Consultant
5 aBom texto introdutório Eduardo Ibrahim ! Interessante essa mira na 'mudança do modelo econômico clássico para o foco nas necessidades individuais' . Talvez o modelo clássico tenha servido bem a um mercado não tao exigente e um tanto quanto desinformado... Já pautando pela perceção do valor, onde a voz do usuário é A grande variável nessa lógica econômica, concordo que os preços tendam a ser mais justos para todas as partes envolvidas. Gostaria de ouvir mais a respeito do APP Trafega e como você desenvolveu esse produto diferenciado baseados nesses preceitos. Quando podemos falar?