Maternidade e carreira

Gabs Ferrera , Redatora Plena ℓiⱴε 

Eu nunca sonhei em ser mãe. Fui criada num lar afetuoso, cercada por mulheres incríveis, mas também acompanhei de perto os ônus da maternidade: a privação de sono, o trabalho do cuidado não remunerado e a desigualdade de gênero em dobro. Então sim, cresci cultivando diversas inseguranças olhando para esse lugar. Além disso, sempre me pareceu muito injusto trazer alguém para um mundo com tantos desafios onde o ato de cultivar esperança ativa precisa andar de mãos dadas com a resiliência. Mas depois de um relacionamento de quase 14 anos, eu descobri minha gravidez aos 48 minutos do segundo tempo de 2022.

A vida sempre encontra uma forma de mostrar para nós como não temos certeza de nada – e é nessa incerteza que nos fortalecemos. Sem falsa modéstia, mas eu, com 28 anos, formada em Administração, graduanda em Jornalismo, com experiências profissionais marcantes e vida estável, não tinha ideia de que me sentiria tão impotente sendo mãe do Samuel, hoje com 9 meses. Costumo dizer que nós tentamos estabelecer um limite para tudo que nos atravessa, da vida pessoal à profissional. A maternidade me ensinou muito cedo que eu ia precisar me despir de toda vaidade, egoísmo e ambição, para ser capaz de cuidar do meu filho e me fez revisitar a Gabs menor de idade, jovem aprendiz, que estava descobrindo um mundo de inseguranças e aprovações. Talvez isso explique o motivo de renascermos ao nascer de um filho. 

Em junho de 2023, tive que reaprender coisas básicas já que uma simples ida ao banheiro não era mais como antes. Nada era como antes e pensar nisso me deixou infeliz. Tive um puerpério difícil, chorava todos os dias. Meu leite secou, meu filho chorava de angústia e ali eu constatei: definitivamente não me encaixei no modelo de mãe idealizado por muitas pessoas. Mas será mesmo? Eu já conhecia esse sentimento pois, no âmbito profissional, já me comparei diversas vezes com outras pessoas.

Com o passar dos meses, eu e meu filho fomos encontrando o nosso jeito de viver. De resgatar aquela nossa conexão física – e única – da gestação, mas da forma que funcionasse pra nós. Felizmente, encontramos. Os dias deixaram de ser mais nebulosos, as lágrimas abriram espaço para sorrisos que a gente solta no canto da boca, bem despretensiosos. Percebi um sentimento de cuidado, de orgulho, de satisfação brotando em mim, como uma retomada do fôlego. Vi como Samuel está crescendo bem, feliz e cheio de afeto. Cada ida ao pediatra, uma sequência de elogios. Meu filho está saudável. Estamos conseguindo, à nossa maneira.

Ao longo da vida, a gente fica craque em recalcular a nossa rota em diversas áreas, mas, quando nos tornamos responsáveis por alguém, passamos a ter medo de encontrar o nosso caminho no tempo que seja necessário, afinal queremos dar o nosso melhor. Mas é no fim do dia, quando as luzes estão apagadas e repasso os detalhes da rotina na minha mente, enquanto meu filho dorme em meus braços, que percebo o quanto cuido bem dele, do jeito que encontrei a partir da minha vivência. Foi aqui que virei uma chave na minha mente: ser mãe não diminui a competência das mulheres, a potencializa. Eu me tornei uma profissional ainda melhor através das habilidades que desenvolvi graças ao meu filho. Longe de qualquer romantização, hoje eu sou mais paciente, resiliente, comprometida e empoderada, porque ao ficar cara a cara com meus limites mais humanos, eu fiz um mergulho em mim mesma e entendi o quanto sou capaz de fazer qualquer coisa para garantir que meu filho viva. Falamos muito sobre hard e soft skills, mas nenhuma vaga no LinkedIn traz uma autoconfiança que só a maternidade consegue despertar.

Os baixos são tão importantes quanto os altos. Até mesmo a melhor das experiências pode não funcionar pra você, e tudo bem. Ser mãe e profissional competente não é sobre ter um vídeo fofo viral nas redes ou case de sucesso compartilhável, sentir um sentimento arrebatador desde a barriga ou obter a fórmula mágica para qualquer estratégia corporativa. Se você olha pro seu filho, pra sua carreira e, diante de tantas questões, ambos te devolvem um sorriso ou um olhar de aconchego, quando nem você acredita nisso, saiba: vocês encontraram o melhor caminho possível. Quanto mais cedo enxergarmos o nosso valor dentro de um cenário que a gente já se coloca lá embaixo, mais rápido nos humanizamos e entendemos que cada história vai ser contada de um jeito diferente – e todas podem ter finais felizes.

Este material foi planejado, escrito, produzido, aprovado e publicado por mulheres.