A melhor conversa que nunca existiu sobre homens e mulheres

A melhor conversa que nunca existiu sobre homens e mulheres

Elza Soares lançou, no último dia 18, um disco chamado Deus é Mulher.

Em uma das faixas, Um olho aberto, ela canta:

Ora, cara, não me venha com esse papo sobre a natureza/Cada um inventa a natureza que melhor lhe caia.

Imaginei Elza Soares num papo com Darwin.

Ele, que escreveu em 1871 sobre as diferenças entre homens e mulheres. Sobre como o masculino prevalece sobre o feminino. Comprovado cientificamente, sustentado pela biologia e escrito em livro 147 anos atrás.

Basta ler as páginas 327 e 328 de The Descent of Man.

The Descent of Man é também o nome de uma obra publicada por Grayson Perry no ano passado. Leitura rápida, pondera sobre o papel do homem na História e sugere novas representações e atuações masculinas para hoje.

A constatação de Perry é a de que é possível ser um homem aberto e não-agressivo, mais humano e menos racional; confortável com a própria identidade e suas idiossincrasias. Alguém que reconhece como relações de igualdade transformam espaços e fazem o mundo melhor. No trabalho, com a família, entre amigos.

Longe de Darwin, imaginei Elza Soares numa conversa comigo.

Uma natureza que é a sua cara/Uma natureza cuspida e escarrada.

Matt Heig, jornalista do The Guardian, refletiu que, há muito, escritoras e estudiosas têm sistematicamente desconstruído e reconstruído o papel da mulher na sociedade. A ficha para os homens caiu recentemente. Talvez porque temos a tendência de achar que somos o estado natural das coisas. Não somos - e admitir isso é incômodo. É impossível repensar o papel da mulher sem repensar o homem. As coisas andam lado a lado.

Elza Soares chama Darwin de novo para o papo. Fala sobre a necessidade de equilíbrio entre masculino e feminino em espaços de convivência - e na vida.

Onde existe o dito natural e o animal perfeito mora/Onde a verdade é garimpada até não sobrar nada.

Darwin está morto e Elza, certa. É preciso garimpar um jeito diferente de se viver. Tanto para quem desejamos ser, como também para as pessoas ao nosso redor.

Post Scriptum Musical

O trabalho de Grayson Perry influenciou ‘World Greatest Man’, disco novo de Gaz Coombes (ex-Supergrass). Em entrevista para a BBC, o músico comentou que faixas como Wounded Egos (algo como ‘Egos Feridos’) foram criadas a partir de ponderações sobre o papel do homem na sociedade.

Em outubro do ano passado, Courtney Barnett e Kurt Vile lançaram um álbum conjunto chamado Lotta Sea Slide. Hoje, a loja de discos Amoeba divulgou um vídeo em que ambos se presenteiam com vinis e explicam detalhes dos discos.

A diferença no comportamento de ambos é sutil. Kurt Vile explica cada aspecto dos discos que deu de presente para Courtney. A artista, por sua vez, entrega um álbum em que Ella Fitzgerald e Louis Armstrong cantam juntos: “Eu acho que porque fazemos uma dupla...este é meu dueto predileto...meu time predileto’. Ela explica que cresceu ouvindo os artistas com o pai. Lembra da infância de forma afetiva e expõe isso ao parceiro musical.

Diferenças marcadas na fala e no comportamento.

(Obrigado, Barbara, Marpe e Bia pelas revisões, conversas e incentivo).







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