A Memória Social e Afetiva como Ponto de Encontro da História Coletiva de um povo- portanto a sua identidade.

Ana Maria Nogueira Rezende*

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 Como conhecer a história própria e coletiva? Minha, nossa e dos outros? De agora, de ontem e de amanhã?

Todos nós somos construtores de histórias, por isso, temos memórias e são essas memórias que criam a nossa identidade e nos dão o sentimento de pertencimento coletivo local e global.

Na atual conjuntura e com a rapidez tecnológica estamos todos conectados globalmente, por uma onda de informação diferente de algumas décadas atrás, o quê acontece na esfera local e regional alcança abrangência global. Antigamente, o quê nos ligava ao passado eram relatos de memórias vividas por indivíduos de convívio social, relatos de viajantes, notícias que chegavam lentamente até nós e também por livros de história. A mudança foi radical. A informação atualmente chega não velocidade da luz, consolidando e refazendo nossas memórias que mudam de acordo com o grupo de onde se vive e daquele que tem o poder da narrativa.

Muitos dos fatos que estão em nossa memória não foram vivenciados in loco por nós, mas fazem parte de nossa memória coletiva, como seres humanos e viventes deste planeta. Eu, por exemplo, nunca estive na lua, não nasci nesta época, mas me lembro, como se lá estivesse. Ou, na minha memória estão presentes com muita nitidez traumas verdadeiros que não vivenciei na realidade. Quando leio fatos históricos relacionados à Segunda Guerra é como se tivesse vivido o período, porém nasci décadas depois, minhas memórias foram construídas a partir de leituras, portanto não são minhas, porque eu não estava lá, mas criei um laço afetivo com uma memória que é de todos. 

Hoje somos todos conectados com a informação em tempo real- fazendo de nós agentes passivos e/ou ativos da história- portanto, temos relatos reais de memórias que constroem a nossa identidade. Estes fatos que relativamente não vivenciamos in loco, como o 11 de setembro de 2011, acontecido nos Estados Unidos, ou mais próximos de nós, o rompimento das Barragens de Mariana (2015) e a de Brumadinho (2019)- passam a fazer parte de nossa memória social- logo nos tornam mais afetivos ainda delas.

Estes dois exemplos- o rompimento das Barragens de Mariana (2015) e a de Brumadinho (2019)- nos fazem rememorar as ligações históricas de nosso povo mineiro com suas origens e sua identidade no trabalho na mineração, desde sempre. É a busca de significados e contextualização com passado para tentar explicar o presente por meio da consolidação das memórias vigentes e consequentemente essa importância para a construção social e histórica do povo mineiro que fazem parte de nossa identidade, pois impactaram nossas vidas, produzindo significado dentro de nossa memória individual e coletiva. Dentro deste contexto e a partir destes acontecimentos buscamos dentro de nossa memória ligações que nos permitam pensar diferente e nos façam um novo olhar dentro da realidade do outro. A memória nos faz ver sem julgar, colocando- nos no lugar do ser humano sempre, nos conectando social e humanamente com o outro.

O fato de rememorar o passado faz com que tenhamos empatia com a história –nossa e do outro- e não tem uma pessoa que não deixe saltar aos olhos uma lágrima. Temos um elo com o passado, assim, uma boa lembrança como uma vó que chora um neto, que não verá mais ou mãe que não cantará o “parabéns” no aniversário do filho, pois este foi soterrado pela lama. Ou a lembrança do lugar onde não é possível passar, porque o registro de memória do lugar não mais existe porque foi apagado pela lama e transformado por algo que não existe como dantes.

A história é construída, muito além de documentos, também por memórias. Vale ressaltar que os dois conceitos são diferentes, porém eles dialogam perfeitamente e são necessários para o entendimento da própria história e da história do lugar. Na atualidade os moradores e trabalhadores das regiões de Mariana e Brumadinho são portadores de memórias, pois seu território social fora destruído pela lama. Essas memórias são importantes para a reconstrução da própria história, da memória social e afetiva e, portanto, a construção da identidade própria e coletiva que fará que não se esqueça da importância da história de agora e de outrora das regiões afetadas pelo rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho respectivamente.

Somos todos portadores de memória- logo, de encontro- e por meio delas construímos nossa história– e assim, não nos esqueçamos da nossa identidade- que é única!

*Historiadora formada pela Universidade de Itaúna em 2002; Mestre em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável pela Escola de Arquitetura da UFMG em 2017- livro publicado em 2012: Transportador Mineiro- História Pioneira. anitarezende@gmail.com

 

 

 

 

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