Meu pior pesadelo

Meu pior pesadelo

“Você está aguardando no escuro para entrar no palco e realizar sua grande apresentação. Suas mãos estão suando. Você está andando pra cá e pra lá, folheando seus cartões de notas. Você deveria tê-los numerado. Estão completamente fora de ordem depois que você os deixou cair na escada quando se dirigia até aqui. O que diz mesmo o primeiro slide? Você não consegue lembrar.  Você não deveria ter ficado acordado até tão tarde na última noite. Você deveria ter gasto mais tempo na preparação. Será que você escolheu a gravata correta? O nó está torto? Você checa isso novamente. O terno que parecia bem essa manhã repentinamente parece amassado e apertado.

Você sente seu rosto quente e vermelho. E se você esquecer o que irá dizer? E se eles não gostarem de você? E se eles fizerem perguntas complicadas? E se eles acharem que você não tão esperto quanto achavam que era? Tem pessoas nessa audiência que sabem muito mais sobre esse assunto que você, você tem certeza disso...

Você espreita por detrás da grande cortina de veludo vermelho novamente. Ainda tem gente chegando e procurando por seus assentos.

As pessoas que já estão sentadas já parecem entediadas, e você ainda não disse uma única palavra. Você avista o seu chefe na segunda fila, parecendo preocupado. Ele tem grande expectativas sobre você. Hoje mesmo ele lhe disse o quanto está em jogo nessa apresentação. Sentado perto do seu chefe está Brad – o cara no escritório que está de olho na sua posição. Brad está inclinando em sua cadeira, braços cruzados, sorrindo. Ele tem uma prancheta e uma caneta vermelha em seu colo pronto para tomar notas e encontrar furos em seus dados. Ele planeja algo e você sabe disso.

Por perto, você pode ver todos os seus colegas na plateia. E se isso fosse apenas uma reunião com clientes? O que de pior poderia acontecer seria perde essa conta. Mas essas pessoas você conhece. E terá que encará-las amanhã no elevador e todas as manhãs depois disso. Qualquer coisa que você diga, você terá que conviver pelo resto de sua viva. Eles vão falar sobre isso, vão escrever sobre e vão fofocar sobre isso. Eles estão olhando para seus relógios, usando seus smartphones e prontos para tweetar os resultados de seus esforços ao redor do mundo antes mesmo de você deixar o palco.

Você pode sentir seu coração batendo contra suas costelas. Tudo o que você pode fazer é rezar para que o seu chefe não perceba a expressão de terror em seu rosto. Você pode sentir o suor sobre o seu lábio superior. Você percebe que suas mãos estão tremendo. Então você as coloca nos bolsos e tira em seguida.

Uma simpática senhora de cabelos grisalhos te apresenta ao público. Você ouve aplausos limitados. Então você levanta o queixo, respira profundamente e caminha para o palco. As luzes brilhantes batem em você como se fossem um muro. Assim que você olha para a audiência você percebe 500 pares de olhos te observando. Tudo parece surreal, como se você estivesse sonhando. Cada nervo de seu corpo grita para que você corra dali. Suas pernas movem-se sozinhas como passos de uma dança macabra. Por que você está ali? Por que você concordou com isso? Suas mãos, independente de sua vontade, parece que voltaram para os bolsos. Como em um reflexo, você as coloca para fora novamente. Você sobe no pódio. Sua boca está seca e você só percebeu agora que não há um copo de água disponível. Rapidamente você checa a tela do computador e em seguida volta a olhar para cima. Seu cérebro está completamente vazio. Você não consegue lembrar seu nome, muito menos a primeira linha de sua apresentação. Esses segundos de silêncio parecem horas. As pessoas na primeira fila olham para você com expressão de pena”. 

Isso parece o seu pior pesadelo? Sexta-feira 13 é fichinha perto disso, certo? Se você fica aterrorizado só de imaginar que terá que falar para um grande público, saiba que não está sozinho.

Ok, essa narrativa talvez seja um pouco dramática, mas falar em público ainda é um grande desafio para um grande número de pessoas. Conheço alguns bons oradores, mas poucos excepcionais. Sem dúvida, um bom orador não se encontra em qualquer esquina. Devo frisar que não se trata apenas de manter-se confortável falando em público, mas muito mais do isso, trata-se de envolver sua audiência, de criar uma experiência memorável, além de transmitir seu ponto de forma clara e objetiva. Uma vez ouvi alguém dizer que não existe palestra longa, e sim palestra chata. Concordo. 

A boa notícia é que como qualquer outra habilidade, pode ser melhorada por meio de técnica e prática. O trecho acima não fui eu quem escreveu L. Trata-se da tradução livre de uma passagem da introdução do livro As We Speak – How to make your point and have it stick, de Peter Meyers e Shann Nix, que estou acabando de ler.

Já escrevi em vários posts, e volto a dizer aqui: qualquer habilidade pode sim ser desenvolvida! No entanto, é necessário entender que existe técnica e, sem sobra de dúvida, a prática estruturada é fundamental. Resumindo, para desenvolver qualquer habilidade você precisa conhecer a técnica e desenvolvê-la através da prática sistemática e crítica – não basta sair fazendo, é preciso analisar os resultados de forma organizada e metódica, ver o que pode ser aprimorado, aprender, melhorar.

Voltando ao livro: gostei bastante! Além de várias dicas e exemplos práticos, a obra fornece uma estrutura super útil para pensar/organizar/trabalhar a realização de uma boa apresentação. Não encontrei uma versão em português.

Os autores estruturam a sua abordagem para apresentações em 3 pilares. São os três componentes para serem trabalhados em qualquer situação, seja uma apresentação para uma grande platéia, um pequeno grupo ou até mesmo uma conversa entre duas pessoas. São eles:

  • Conteúdo: é aquilo que é apresentado, as ideias e informações passadas para a audiência, e a estrutura/sequência que é seguida para que seja possível criar uma experiência memorável para as pessoas que estão participando.  

  • Forma: é como você entrega o conteúdo – falando, olhando, movimentando-se, posicionando-se no palco, interagindo com a audiência, fazendo e respondendo perguntas. Refere-se ao uso da voz e do corpo para engajar o público e transmitir a sua mensagem.

  • Estado mental: é a maneira como você se sente e percebe o mundo ao seu redor enquanto executa a apresentação. É a sua condição física, psicológica e emocional.

Um aprendizado chave compartilhado pelos autores é que as pessoas normalmente gastam muito tempo se preocupando com o conteúdo e negligenciam a forma e, acima de tudo, o estado mental. Há técnica para tudo, inclusive para modular o seu estado mental. Aliás, este é ‘o ponto crítico’ para a realização de uma boa apresentação. 

Quer saber mais? Leia o livro ou, se puder, faça um dos cursos que o Peter oferece em vários lugares do mundo. Acho que vale a pena.

Mas este post não é sobre como fazer apresentações, nunca foi. Ele é sobre a importância de se preparar e desenvolver as habilidades que são necessárias para o trabalho e a sua carreira. Ou mesmo, as habilidades que irão diferenciar você no mercado. Quem sabe fazer uma boa apresentação ou ‘fala bem’ sempre se destaca – você não concorda?

Aqui nos EUA, as crianças são treinadas desde a escola a falar, realizar apresentações e comunicar as suas ideias de forma estruturada - comentei a respeito em um post recente. Isso não acontece no Brasil. Portanto, os profissionais brasileiros precisam de um esforço a mais, no geral por conta própria, para desenvolver habilidades e eliminar lacunas em sua formação.

Quando você pensar sobre a sua carreira e a sua empregabilidade, não esqueça: você deve estar no controle. Aposte no desenvolvimento das habilidades que são importantes e saiba promovê-las. É mais transpiração do que inspiração, e isso faz a diferença!

Post originalmente publicado no Blog www.otrampo.com.br

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