MITOS, DESAFIOS E OPORTUNIDADES NA GESTÃO DE TALENTOS
(Por: Anderson de Souza Sant’Anna, professor da FDC, e Paulo Roberto Villamarim Gama, professor associado da FDC)
Em nenhuma outra época na história das organizações, as pessoas com suas competências e talentos foram tão valorizadas como atualmente. De fato, se há um ponto em relação ao qual poucos se opõem é que, com o intuito de fazerem frente às transformações do atual mundo dos negócios, as organizações têm, crescentemente, necessitado de indivíduos talentosos e competentes.
Para os estudiosos no campo isso se dá na medida em que fontes tradicionais de vantagem competitiva, tais como tecnologia e mão de obra barata, não mais se revelam suficientes para prover uma posição competitiva sustentável. Como decorrência, os indivíduos e suas competências passam a ser enfatizados como elementos centrais de diferenciação estratégica. Alguns chegam mesmo a afirmar que as organizações que agora concorrem entre si por clientes e mercados, em escala jamais vista, têm sido levadas a competir também pelo recurso elevado à categoria de o mais importante de todos: o talento humano.
Se, por um lado, essa nova realidade traz à tona a importância da valorização do chamado capital intelectual e de se reconhecer a relevância das pessoas e seu desenvolvimento como fontes primordiais de vantagens competitivas sustentáveis, por outro lado, implica novos desafios - e oportunidades - à gestão. Em particular, estimula os líderes e gestores à construção de ambiências organizacionais - contextos capacitantes - em que os conhecimentos, habilidades e atitudes requeridas possam ser efetivamente mobilizados, constituindo-se como competências.
Tais desafios se intensificam na medida em que as transformações em curso se fundamentam em processos de mudanças estruturais profundas, não somente no nível da dinâmica da economia e dos mercados, mas também nas dimensões sociais, demográficas, culturais e organizacionais.
De fato, em nenhum outro momento pronunciaram-se, de forma tão intensa, possibilidades como a de quatro gerações conviverem, simultaneamente, em um mesmo ambiente de trabalho. Progressos da ciência ampliam, continuamente, a expectativa de vida da população, assim como propiciam melhoras sem precedentes nos campos da saúde e prevenção de doenças, possibilitando a extensão do tempo de permanência no mercado de trabalho. Aposentadoria, portanto, não mais significa “vestir o pijama”, mas a possiblidade de novas trajetórias de carreira, como consultores, empreendedores, mentores, tutores ou mesmo a permanência como profissionais das próprias organizações a que se vinculam. Como resultado, não raro, já se observam, em mesmos ambientes laborais, veteranos, baby-boomers, representantes das gerações X e Y, mobilizando distintos talentos e atributos de competência.
Em decorrência, se há algo que deve chamar a atenção, esse elemento não diz respeito a uma “crise geracional”. Até porque gerações distintas – felizmente - sempre as tivemos e esperamos continuar tendo-as. Note-se, por exemplo, a geração maio de 1968, os hippies, a geração Rock and Roll ou Coca-cola, muitos de seus representantes hoje ocupantes de importantes posições de liderança e gerenciais, tanto em organizações públicas, do terceiro setor e empresariais. Se há algo, então, a que se deve atentar - e com zelo - talvez diga respeito mais diretamente à gestão da diversidade. Para sermos mais precisos, das diversidades, no plural: cultural, socioeconômica, tecnológica, de gênero, geracional.
Isso nos remete, de pronto, à necessidade de desconstrução de mitos que acabam por se proliferar no calor - ou melhor, na superfície - do debate. Primeiro, há que se estar atento quanto ao risco de se considerar uma dada geração como melhor ou pior que outras, esquecendo-se de que, no fundo, o que se tem são pessoas com características, valores, crenças, atitudes e comportamentos que guardam diferenças entre si, derivadas dos distintos processos de socialização e contextos sociais, econômicos e culturais em que se desenvolveram. Superar tal mito pressupõe, em especial, a capacidade de a gestão, nos diversos níveis das organizações, focar não em estereótipos, mas em facilitar sinergias e complementariedades entre esses distintos grupos e perfis, cada qual com seu brilho próprio, seus saberes específicos e possibilidades únicas de contribuição.
Nessa diferença, comparativamente às gerações precedentes, a tão comentada geração Y, que tanto espaço ganhou na mídia mais recentemente, tende a se distinguir por ser menos conservadora quanto a aspectos como a lealdade à empresa e a fidelidade a uma profissão. Ao contrário, vive no ritmo do mundo atual, esperando por oportunidades de desenvolvimento pessoal, reconhecimento e crescimento profissional à velocidade da internet banda larga. Por isso, esses jovens não se importam de mudar, continuamente, de empresa e de carreira, em busca da realização de seus objetivos e expectativas.
Além disso, essa geração compreende profissionais que têm fascínio pela tecnologia, facilidade para desenvolver vários projetos e atividades, de forma simultânea, e sentem-se bastante à vontade para questionar seus superiores hierárquicos. Também tendem, muitos deles, a não abrir mão da qualidade de vida, buscando maior equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Eis, portanto, o desafio da gestão quanto a promover a sinergia de tais características com as das demais gerações, transformando conhecimento, habilidades e atitudes específicas em competências, em entregas, em resultados organizacionais e sociais.
Em segundo lugar, urge romper com visões que atribuem o status de talento apenas aos jovens entrantes de alto potencial, aos indivíduos que vêm do “mercado” e aos “dez por cento” que se encontram na cúpula das organizações. Cabe aos líderes e gestores, ao contrário, considerar que os talentos se encontram por toda a empresa. O grande desafio - e, por conseguinte, oportunidade - constitui, novamente, em como identificá-los e promover a construção de ambiências organizacionais em que os múltiplos talentos, muitas vezes anônimos e escondidos possam se manifestar. Sem dúvida, um outro grande desafio à liderança contemporânea.
Relevante, nessa direção, é ampliar a noção de talentos por toda a empresa. Considerar que tanto veteranos, baby boomers, geração X, quanto os recém-chegados da geração Y têm sua parcela de contribuição na construção da missão da organização. Não esperar dos mais jovens comportamentos e atitudes que somente a vivência e a maturidade podem proporcionar e, ao mesmo tempo, saber lidar com a energia, a impetuosidade, a “ousadia” que eles comumente aportam.
Ademais, é significativo o fato de que nem sempre nos encontramos em um mesmo estágio de ciclo de vida pessoal. Que aos vinte anos de idade tem-se comportamentos e atitudes que guardam diferenças daqueles comumente observados aos quarenta e aos cinquenta. Ao líder e ao gestor espera-se, uma vez mais, a competência em lidar com as diferenças.
Tal discurso, embora amplamente difundido e não raro banalizado, nem sempre revela-se de fácil operacionalização na prática. Afinal, durante anos, em vários setores, conviveu-se, no Brasil, com uma economia fechada, mercados protegidos, reduzida concorrência interempresas, prevalecendo relações de trabalho, em que a base do contrato psicológico empresa-empregado se sustentava, como já mencionado, na díade fidelidade-estabilidade.
Nesse contexto, a metáfora da “escada” constituía o modelo predominante de carreira, sob o lema do clássico: “do berço à aposentadoria”. Sob esse regime, mesmos profissionais, não raro com as mesmas formações, oriundos das mesmas classes sociais, das mesmas universidades ou centros de formação, selecionados por disporem dos mesmos perfis profissionais, galgavam posições estratégicas, sem grandes variações de estilo e comportamento, no decorrer de carreiras de ciclo longo.
Repentinamente, no entanto, o país e a economia se abrem à concorrência. E, mais contemporaneamente, vivencia-se um contexto de quase pleno emprego, com novas gerações rapidamente se inserindo e alçando posições de comando no mercado de trabalho. Soma-se a isso a emergência de novos perfis sociais que atingem o mercado de consumo, uma ampliação no volume e natureza das formações - para além das opções clássicas: Direito, Medicina, Engenharia - que se ampliam e tornam-se cada vez mais multidisciplinares; os valores e a ética em relação ao trabalho se veem, igualmente, alterados.
Concomitantemente, as carreiras tornam-se cada vez mais “proteanas”. Como o deus Proteu, alteram-se continuamente de forma; tornam-se mais “flexíveis”, “múltiplas”, em “zigue-zague” e com ciclos cada vez mais curtos. Resultado: os contratos psicológicos empresa-empregados alteram-se para relações do tipo empregabilidade-resultado. Da noção de “berço à aposentadoria”, para a máxima do nosso poeta: “[...] que seja eterno, enquanto dure”.
Assim sendo, as carreiras “modernas” se apresentam desenhadas mais pelo indivíduo que pela organização, podendo ser redirecionadas, de tempos em tempos, para atender às necessidades de seu ocupante. A transição do modelo tradicional para o modelo de carreira proteana não se dá, todavia, sem tensões, e sua prática envolve dificuldades consideráveis, trazendo à tona novos desafios. Por exemplo, o de o indivíduo aprender a melhor administrar o equilíbrio entre vida profissional, familiar e pessoal, assim como lidar com novos valores e significados em relação ao trabalho e à 3 carreira, essa última associada a seu projeto de vida, em sentido mais amplo. Em essência, a verdadeira revolução dessa perspectiva é levar as pessoas a se considerarem mais donas de suas próprias carreiras, a estarem no comando de seus próprios destinos.
Em decorrência, concepções clássicas sobre comprometimento, carreira, satisfação no e com o trabalho, reconhecimento, atração e retenção, autoridade e estilo de liderança são colocadas sub judice. Fórmulas tradicionais parecem não mais funcionar como dantes. Velhos mapas e manuais não mais parecem permitir uma leitura fidedigna da realidade. Noções como “gestão de pessoas”, “gestão de gente”, “gestão do capital humano”, “gestão de talentos” passam, então, a ganhar espaço, comparativamente à de “administração de recursos humanos”.
Gerir talentos pressupõe, todavia, ir além de mudanças nas denominações de áreas e diretorias. Implica revisitar conceitos, crenças e concepções muitas vezes arraigadas e, não raro, inconscientes. Significa desenvolver novos estilos de liderança e gestão aptos à construção de contextos capacitantes que viabilizem às organizações atrair, desenvolver e, como resultado, estabelecer as condições que permitam a retenção das competências e talentos requeridos, assegurando o desempenho, desenvolvimento contínuo e sustentabilidade da organização. Implica, a partir de esforço contínuo e inspiração de suas lideranças, rever políticas e práticas direcionadas à gestão, em especial de seus elementos humanos.
Finalmente, não se pode ignorar as possibilidades desse movimento em torno da gestão de talentos, em sentido mais amplo, em contribuir com resultados que venham a propiciar às organizações o desenvolvimento de projetos de mudança que as coloquem no real caminho da modernidade, considerando uma de suas dimensões centrais, porém, muitas vezes, ignorada: o elemento humano.
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2 mBruno, obrigado por compartilhar!!
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8 mShow Bruno 👏
Advogada Trabalhista | Empresária | IG: @nathalia.souzaleal
2 a👏👏
CTO na Contratei.net
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Consultor especializado em Gestão de Pessoas e Desenvolvimento de Líderes
4 aTexto maravilhoso!