Mulher, Negra e Engenheira

Hoje eu vim me expor e usar do meu lugar de fala de Mulher, Negra e Engenheira para pontuar algumas reflexões nesse dia 20 de Novembro. Antes de mais nada, gostaria de dizer que não trata-se de “mimimi”. Infelizmente, em pleno século XXI, essa discussão ainda é necessária.

Essa foto é da minha colação de grau, em 2018. Segundo o IBGE 2018, menos de 5% das mulheres que se formam engenheiras são negras. Contrariei as estatísticas. Sou Técnica em Eletrotécnica, Engenheira de Controle e Automação, curso MBA em Gestão de Projetos e trabalho na área de Eficiência Energética e Energia Renováveis (e sou apaixonada por esses temas). Sou feliz e grata por ter chegado até aqui. Mas não sou feliz por ser exceção. Eu gostaria que casos como o meu fossem regra.

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Quem vê de longe pode pensar em Meritocracia. Mas sou defensora da ideia de que meritocracia é lenda. Esse termo é usado para justificar a falta de oportunidades e negar o racismo.

Passei na prova do CEFET para fazer o curso técnico integrado ao ensino médio com 15 anos de idade. Meus colegas de turma eram super bacanas. Mas eram majoritariamente brancos. Meus professores eram incríveis, como pessoas e profissionais, mas eram majoritariamente brancos. Eu não me reconhecia ali, era como se eu não pertencesse àquele lugar. Quando ingressei na Engenharia de Controle e Automação, nessa mesma instituição, a diferença entre brancos e negros ficou ainda maior. Não tinha cotas na época. Quando foi implantado o Sistema de Cotas, pude ver o quão importante ele é. Quantas oportunidades ele permitiu... Mas pessoas ainda insistem em falar em Meritocracia.

Ali vivi momentos maravilhosos...tenho orgulho de ser fruto do CEFET-MG-, tenho um carinho imenso pelos colegas, mestres e servidores. Mas foi também ali, onde senti o peso da cor da minha pele. Entre algumas situações, compartilho a que mais me marcou: Um professor X, em uma apresentação individual de trabalho me disse: Parabéns! Sua apresentação foi muito boa, só não foi melhor porque você não é a aluna X. A aluna X era o padrão de beleza estabelecido pela sociedade. Meritocracia? Eu não era boa porque não era branca.

Participei em 2017 de um Congresso de Engenharia onde eu e minha amiga (da qual me orgulho pelo seu posicionamento antirracista) fomos parabenizadas por sermos as únicas mulheres apresentando trabalho, e eu, por ser a única negra. Mas nós não nos reconhecíamos naquele ambiente esmagadoramente masculino.

Quando busquei me inserir no mercado de trabalho, tive que engolir em seco na minha primeira entrevista. Participei de um exaustivo processo seletivo para uma vaga de Engenheira de Controle e Automação. Os gestores convocavam um monte de entrevistas e alegavam que não conseguiam decidir entre mim e o colega concorrente. No final, fui comunicada que ficamos empatados, mas que optaram por ele porque ele era homem e tinha mais o perfil da vaga. Assim mesmo, sem rodeios, direto e reto, na minha primeira oportunidade. Meritocracia? Eu não era boa porque era mulher.

Eu sou Engenheira, mas por mais que eu me vista com roupas sociais e escove os meus cabelos para ficar mais próxima do "perfil" das engenheiras, as pessoas não me enxergam como engenheira. Sempre (sem exagero) acham que estou numa posição de servir. Elas sequer perguntam qual a minha função ali... Racismo Estrutural não existe? Isso está enraizado.

O dia de hoje pede reflexão. Mas as ações precisam ser diárias. É preciso descontruir essas ideias para que os nossos filhos não precisem passar pelo o que passamos. Que não sejam julgados pela cor de sua pele. Que mais que diversidades, que ao redor deles tenha proporcionalidade. Que não sofram da "Síndrome do Impostor". Que eles olhem e se reconheçam.

Não podemos nos calar! Vamos à luta!

 

👏👏 excelente texto Jéssica Bertolino Gregório! Muito obrigado por compartilhar na rede.

Parabéns Jéssica pela tua sensibilidade e força em escrever este texto! Fico muito feliz que não tenhas te calado, e que tenhas a coragem para estar nesta luta! Que possamos ser quem somos e respeitadas por isso! Obrigada por compartilhar a tua história aqui conosco!! Sucesso e continuamos nesta luta juntas, pois essa luta é NOSSA!!!

Parabéns pelo seu texto e posicionamento Jéssica! Um exemplo de garra, determinação e protagonismo, por favor continue incentivando!

Parabéns pelo texto Jéssica! Me senti representada ao ler o seu post, sou mulher, negra e engenheira eletricista. Vivenciei situações bem parecidas..., mas sigamos na luta.👊

Ana Luíza Ferraz

Hiperautomação | Transformação Digital | Transformação de Processos | PEGA BA | RPA BA | Black Belt | Gestão de Projetos |

4 a

Obrigada por me ensinar mais um pouco, Jessica! Parabéns pelo texto e pela resiliência. Não é meu lugar de fala, mas busco sempre aprender com pessoas como você para saber qual é meu papel diante de todas essas situações absurdas que vemos diariamente.

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