Não é só um desenho, é estratégia!
Vou começar com uma provocação: você já parou para pensar como as pessoas geralmente entendem seu trabalho? Se você é advogado, médico ou engenheiro, a sua expertise é reconhecida. Claro, você passou anos estudando para ser quem é, e a sociedade reconhece isso. Mas e quando o assunto é design ou publicidade? Por que, na maioria das vezes, ainda parece que estamos explicando o óbvio? Aqui não estou defendendo uma profissão desvalorizada (inclusive não acredito que seja desvalorizada) – embora esse tema mereça reflexão. O que estou dizendo é: o design e a publicidade não são apenas “desenhos” ou “propagandas bonitinhas”. Eles são, na verdade, a aplicação de uma série de técnicas, estratégias e conhecimentos especializados que, sim, demandam anos de estudo.
Agora, se você ainda acha que um simples “bonito” ou “feio” é suficiente para julgar uma peça publicitária, eu vou te desafiar a pensar um pouco mais. Esse tipo de avaliação superficial tem sido uma das maiores dificuldades que designers e publicitários enfrentam – e muitas vezes, o desconhecimento dos clientes sobre o valor real do trabalho criativo é o principal culpado.
"Bonito ou Feio?"
Vamos direto ao ponto: quem julga o trabalho de um designer ou publicitário, muitas vezes, não tem a mínima ideia do que está por trás da criação. Uma peça publicitária não é apenas uma “imagem bonita”; ela é a solução de um problema estratégico, construída com base em princípios técnicos e psicológicos, que muitos desconhecem.
Quando um cliente diz “não achei bonito” ou “não me agrada”, o designer ou publicitário, geralmente, está enfrentando uma desconexão entre a percepção superficial do cliente e a complexidade do trabalho por trás daquela peça. A percepção visual, como sabemos, é subjetiva e depende de fatores como cultura, experiência pessoal e até o estado emocional do momento. Mas o trabalho de um designer vai muito além de agradar os olhos. Ele é uma combinação de ciência e arte, um projeto que envolve psicologia cognitiva, comportamento humano, marketing e psicologia das cores. Cada decisão – seja de forma, cor ou tipografia – é planejada com um objetivo claro.
Vamos a um exemplo simples. Você sabia que a escolha de uma cor como o vermelho, por exemplo, não é apenas estética, mas um movimento estratégico que pode evocar urgência, excitação ou até mesmo paixão (ocidentais)? Isso é design com propósito, não apenas “uma imagem bonita”. Assim como na psicologia da Gestalt, que ensina que as pessoas tendem a organizar visualmente informações de forma que faça sentido, o design segue leis de percepção que precisam ser entendidas e respeitadas. Quando um cliente faz um pedido que ignora essas leis, estamos falando de um pedido inconsistente com a estratégia do projeto que vai ser pago pelo próprio cliente e que depois defende aos 4 ventos que não funciona.
O ponto é: a estética não é apenas uma questão de “gosto pessoal”, mas uma estratégia de comunicação. Cada escolha tem um porquê e deve ser compreendida dentro de um contexto maior. E, convenhamos, isso demanda muito mais do que uma sensação imediata de aprovação ou rejeição. O design é uma solução – e soluções exigem reflexão, conhecimento técnico e experiência.
"Tudo isso para um Desenho?"
Aqui vai outra verdade dura: muitas vezes, o valor do trabalho criativo é subestimado. "Tudo isso para um desenho?", muitos perguntam. Pois bem, o design não é só “desenho”. É análise estratégica, compreensão do comportamento do consumidor, planejamento de longo prazo, e também envolve ferramentas especializadas, software de ponta, e um constante processo de atualização profissional. Para muitos clientes, o trabalho criativo é algo simples e, muitas vezes, superficial. Para os designers e publicitários, é uma profissão que exige anos de formação e constante aperfeiçoamento. Certo, vamos tangibilizar isso com um exemplo, simples, mas poderoso. Imagine que uma marca de roupas esportivas quer lançar uma nova linha de tênis. O cliente chega até o designer e diz: “Só quero algo bem legal, um design moderno para o tênis, mas sem muita frescura”. A primeira reação de quem não entende o processo criativo pode ser pensar que o designer está apenas “desenhando um sapato bonito”. Mas, o que realmente está acontecendo aqui?
O designer começa com uma análise estratégica: ele estuda o mercado de tênis, as tendências de consumo, os comportamentos do público-alvo e, principalmente, o que os concorrentes estão fazendo. Não se trata apenas de escolher uma cor bacana ou uma forma legal para o tênis. A estratégia aqui envolve entender o que vai fazer com que os consumidores sintam uma necessidade real de comprar aquele produto – seja pela exclusividade, pela performance ou até pela percepção de status que ele transmite.
Em seguida, vem a compreensão do comportamento do consumidor, sim, é possível compreender isso, o designer precisa saber que, se o público-alvo é formado principalmente por corredores, o design precisa ser focado em desempenho e conforto. Se o público for mais jovem e conectado com moda, o design vai incorporar elementos de estilo, cores ousadas e até aspectos de personalização. E esse conhecimento sobre o que motiva o consumidor é um processo que vai além de achismos – é feito a partir de pesquisas de mercado, dados de comportamento de compra e análises de tendências.
Depois disso, vem o planejamento de longo prazo, ou seja, a marca não quer só um produto de sucesso imediato. O designer precisa pensar em como aquele design vai se encaixar na identidade da marca a longo prazo. Ele avalia como o modelo vai se alinhar com as outras coleções, como manterá sua relevância ao longo das estações e como será lembrado pelo consumidor, até mesmo em edições futuras ou em campanhas de marketing digital ou offline.
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E aí, não basta apenas um bom conceito. O designer precisa de ferramentas especializadas e softwares de ponta. Programas de design como o Adobe Illustrator e/ou o Photoshop não são apenas usados para criar "imagens bonitas". Eles são essenciais para manipular gráficos, testar diferentes texturas e padrões, e até simular como o produto final será percebido em ambientes reais – tudo isso com base em dados técnicos que garantem o funcionamento perfeito de cada elemento visual. E mais, para não perder o timing da inovação, o designer está sempre se atualizando, acompanhando as novas tecnologias e atualizações (é cansativo, afinal são quase que diárias), novos programas, novas técnicas. O que era tendência ontem já pode estar ultrapassado hoje.
Então, quando alguém diz “Tudo isso para um desenho?”, o designer pode sorrir e lembrar: a peça de design que está sendo criada não é só um “desenho”. Ela é a chave para atrair o consumidor certo, comunicar os valores da marca e garantir que o produto tenha uma vida longa no mercado. Porque no final, não se trata de “fazer algo bonito”, mas de criar uma experiência que conecte o consumidor com a marca, de forma estratégica, técnica e planejada.
É por isso que constantemente vemos discussões sobre preço. Muitos não entendem que o valor de um trabalho criativo não está apenas na entrega de uma peça, mas no processo que a construiu. O design envolve análise de mercado, comportamento humano, psicologia, comunicação visual… E tudo isso tem um preço. A solução estratégica que um designer oferece não é “fazer um desenho”, mas transformar um problema de comunicação em algo que impacte o público de maneira eficaz e memorável.
O Clássico “Logo Maior”
E se você acha que o maior desafio são apenas questões de avaliação estética ou preço, me arrisco a dizer que o pior de todos são os pedidos inusitados. Vamos falar do clássico pedido de “logo maior”. É um pedido que, por mais simples que pareça, está longe de ser uma solução inteligente. O trabalho de um designer ou publicitário é pensar em como o logo se encaixa dentro de um contexto, em um espaço limitado, em uma plataforma específica, considerando proporções e legibilidade. Colocar um logo “maior” não garante mais visibilidade. Ao contrário, pode até prejudicar a percepção do público e a eficácia da comunicação.
O pedido de um 'logo maior' parece ignorar que a verdadeira harmonia visual, assim como a própria natureza, segue os princípios matemáticos do universo — como a proporção áurea, que traduz a perfeição na relação entre as partes e o todo. A beleza não está em aumentar, mas em encontrar o equilíbrio exato.
Estudos de psicologia visual, como os de Brown & Smith (2019), mostram que a ampliação de certos elementos gráficos pode distorcer a percepção e prejudicar a harmonia da peça. A comunicação visual tem um propósito, e cada elemento, seja um logo ou uma tipografia, precisa ser projetado para funcionar perfeitamente dentro do contexto.
Além disso, mudar cores sem justificativa, ou pior, pedir mudanças baseadas em achismos, também é um pedido que traz frustração aos criativos. O uso de cores não é apenas estético; é estratégico. O azul transmite confiança, o vermelho cria urgência, o verde está associado à natureza e ao equilíbrio. Alterações sem a devida compreensão das implicações emocionais dessas cores podem destruir o impacto da peça e até a identidade da marca.
A Conclusão (Provocadora!)
O design e a publicidade são muito mais do que apenas “fazer algo bonito”. Eles são, na essência, soluções criativas que exigem um entendimento profundo de psicologia, marketing, comportamento humano e uma boa dose de técnica. Quando um cliente questiona ou solicita algo sem entender essas complexidades, o resultado não é apenas um trabalho mal executado – é uma comunicação ineficaz.
Portanto, da próxima vez que alguém disser “mas está feio”, lembre-se: “bonito ou feio” é uma avaliação superficial, muitas vezes impulsionada por preferências pessoais. O que realmente importa é o objetivo da comunicação. E é esse objetivo que, como designers e publicitários, trabalhamos para atingir – com técnica, experiência e propósito.
Então, em vez de focar no “bonito” ou “feio”, que tal começar a valorizar o processo criativo e entender que cada escolha, cada cor, cada formato, cada elemento, tem um motivo para estar ali?
A comunicação estratégica começa quando todos nós, clientes e criativos, entendemos que o design vai muito além da superfície. Vamos parar de pedir “logo maior” e começar a pensar no impacto real que nossa comunicação pode ter. O que acha?
Obrigado por ler :)
Gestora de Educação Corporativa | Mestre em Administração Pública
2 semTexto necessário, Lucas! Colocar o gosto (raso) diante do talento (este, fruto da técnica e da estratégia) é mitigar o valor (não o preço) do conhecimento! Parabéns!
Mentor Customer Success Farma | Instrutor de Treinamentos | Analista de Desempenho | Gestão Estratégica
2 semTopssímo Lucas Rosa Paiva , obrigado por publicar informações tão valiosas!