Não busque insights. Busque game changers.

Não busque insights. Busque game changers.

Uma aula sobre insights. Um conceito mal utilizado que levou a cultura da publicidade a acreditar em colocar as pernas para o ar e esperar pelo lampejo de luz que levará à ideia brilhante que vai ganhar Cannes. Um conceito que foi resignificado – ou seria o contrário? – por Tobias Nordstrom – head of strategic da Forsman & Bodenfors, agência sueca considerada a mais criativa em 2014 – na sua aula no curso da Hoala.

Das aulas que tivemos até agora, posso dizer que essa foi a que mais mudou a minha perspectiva sobre comunicação. E não foi porque ele trouxe teorias complexas ou segredos para se comunicar nesse novo universo. Foi porque ele nos mostrou que a maioria dos caminhos para a mudança estavam bem embaixo do nosso nariz todo o tempo. Resumi em 3 os conceitos que para mim foram transformadores.

 

Tudo começa com um entendimento claro do mercado em que a marca está. Ou você entende 100% do mercado em que a empresa está inserida, ou você se tornará um planejamento fraco. Simples assim. Desenhe como as empresas estão organizadas nesse universo e comece a enxergar os papéis desempenhados por cada um. E, principalmente, enxergue o papel da sua marca nesse jogo.

Cada posição demanda uma estratégia diferente. Por isso, entenda o que a posição da sua marca representa e demanda. Se você é o líder, tem que – efetivamente – LIDERAR o mercado. Você tem que definir as regras do jogo e os outros, te seguirem. Isso significa investir em inovação e aproveitar a vista de quem está no topo para enxergar sempre dois passos à frente da concorrência. Uma estratégia completamente distinta da adotada pela maioria dos líderes, que se acomodam na sua grandeza e acabam se tornando seguidores dos menores – e mais ágeis – do mercado.

No outro oposto, se você é um challenger – tem uma pequena participação no mercado – tem que ser irreverente. Jogar o jogo dos grandes vai sempre te deixar em desvantagem. Você não tem o conhecimento de marca, o fôlego e a carteira dos maiores. Por isso, aposte no diferente para desestruturar esse jogo e chamar a atenção. Questione as regras criadas pelo líder, crie novas, traga uma abordagem que ninguém nunca ousou adotar. Seja a pulga no colchão do líder: continua pequena, mas incomoda

O próximo passo depois de entender 100% do mercado e adaptar a sua estratégia é pensar o que fazer para desestruturá-lo. Exatamente isso. Os melhores insights são os que Tobias chamou de “game changers” ou aquela ideia que conseguirá mexer com as regras do jogo de forma que elas se tornem vantajosas para a sua marca. E aqui está um exemplo da simplicidade da genialidade: o insight nem sempre está em criar algo para jogar bem o jogo vigente. Os melhores insights são os que mudam o jogo para lhe beneficiar.

Para explicar essa estratégia, Nordstrom apresentou o case da Volvo Cars, considerada a campanha mais bem sucedida da história da Suécia. A marca de carros é líder no país, mas sofre para manter sua posição frente a concorrentes estrangeiros e, principalmente, chineses. Para mostrar sua atitude de líder frente ao setor, a marca resolveu abraçar sua origem sueca e, principalmente, posicionar-se frente ao cenário conturbado vivenciado no país na época: manifestos xenofóbicos contra imigrantes. Através de uma parceria com Zlatan  Ibrahimovic – jogador de futebol sueco considerado um dos melhores do mundo e filho de pais imigrantes – e do conceito Made by Sweden, a Volvo exaltou sua origem ao mesmo tempo que trouxe para debate: o que ou quem pode efetivamente ser considerado sueco?

A campanha, que aliava mídia tradicional com uma forte presença em redes sociais, virou assunto em todo o país. Gerou cerca de 870 inserções em mídia espontânea e alcançou mais de 200 milhões de pessoas. A coragem de se posicionar frente a um assunto polêmico mostrou a atitude de líder da marca, além de mais de 5,4 milhões de views no Youtube, ad awareness de 75% e um aumento de vendas de 51% em relação ao mesmo período do ano anterior. Quem se posiciona como líder alimenta sua liderança.

Estamos acostumados a receber briefings dos clientes com direcionamento de perfil de consumidor e trabalhar direto com ele como público-alvo das campanhas. O que não paramos para pensar é que esse perfil foi a base para o desenvolvimento dos produtos ou serviços da empresa. Ou seja, o usuário do produto. Porém, isso não quer dizer que sempre o ideal é comunicar o produto/serviço para quem vai usá-lo. O processo de compra possui outros papéis: o decisor, o influenciador, o usuário e, em compras B2B, muitos mais. Uma forma de encontrar um “game changer” é pensar a segmentação de maneira inteligente.

Um belo exemplo desse conceito é o case da Volvo Trucks, desenvolvido pela agência de Nordstrom. O principal insight foi entender que o motorista de caminhão é cercado por influenciadores – sua família, amigos, colegas de trabalho – e que uma forma de chegar nele de maneira relevante poderia ser através deles. A solução: criar conteúdos que fossem incríveis ao mesmo tempo em que mostrassem os diferenciais dos caminhões Volvo. Algo tão espetacular que chamasse a atenção dos filhos, mulheres e amigos dos caminhoneiros. E mais, tão engajador, que fizesse com que esses influenciadores quisessem compartilhá-lo e, portanto, fizessem chegar o conteúdo até os decisores da compra. Em resumo, criar um conteúdo focado nos influenciadores que colocasse à prova o seu papel no processo de compra: ocasionar influência sobre o decisor.

O resultado? Mais de 100 milhões de views no Youtube, mais de 8 milhões de compartilhamentos, 170 milhões de dólares em mídia espontânea, aumento de 46% no indicador “consideração pela marca” com potencial compradores. Um resultado entre influenciadores e decisores. Um “game changer” que começa por enxergar além do papel do usuário e que muda o comportamento das pessoas em prol de uma marca.

Planejamento é uma forma de enxergar a comunicação, não uma função. Exatamente por isso, o maior trunfo do planejamento está em conseguir fazer com que cada um pense planejamento a cada etapa do projeto. Um cliente precisa pensar planejamento ao escrever um briefing. Um criativo precisa pensar planejamento quando está materializando uma estratégia. Planejamentos precisam pensar planejamento quando estão estudando o funcionamento de um mercado. Planejamentos, criativos, atendimentos, mídias, produtores, clientes precisam pensar planejamento quando estão construindo uma estratégia. Um planejamento se torna relevante quando consegue fazer com que o penso estratégico se mantenha presente ao longo do processo, quando consegue inspirar as outras funções para que agreguem a essa construção também. Transforme todos em planejamentos para que eles te ajudem a ser um planejamento melhor.

O que guardo da aula de Tobias Nordstrom é o entendimento de que a genialidade está na simplicidade. Uma lógica simples de só três passos em busca de game changers: entenda o jogo; pense em o que precisa mudar para que ele te beneficie; trabalhe para mudá-lo. Os melhores insights não são os que representam a realidade, mas os que geram mudanças nela.

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