Nosso povo, bets e eleições: O que eles têm em comum?
Com o fim do primeiro turno das eleições desse ano ficou claro pra mim o abismo em que ainda estamos enfiados. E não falo pelos resultados de ontem, mas sim pelo caminho até chegar a ele. Nesse caminho, tantas e tantas notícias pautaram nosso povo de forma paralela. Um desse assuntos foi a regulação, os malefícios e a proliferação das bets. E o que uma coisa tem a ver com a outra? Em que ponto há essa interseção? Esse ponto tem um nome: nosso povo.
Hoje, aqui mesmo no Linkedin, vi um post com um print do reclame aqui de uma esposa desesperada com uma dessas empresas de aposta clamando: “nossa família não aguenta mais, bloqueem meu marido. Nosso patrimônio está indo embora”. Em um primeiro momento, você pode até dizer que isso aí não é culpa das empresas, mas sim das pessoas, afinal, elas têm o livre-arbítrio de fazer ou não aquela aposta. Seria um argumento válido e até faria bastante sentido. Mas com os dados de que apostas consumiram R$ 3 bi de beneficiários do Bolsa Família em um único mês esse argumento balança um pouco. Em um país em que três em cada 10 pessoas na faixa de 15 a 64 anos são considerados analfabetos funcionais, não é concebível a ideia de livre arbítrio. (E a de democracia?) Se eu colocar aqui a questão da desigualdade social e acesso ao mínimo de educação, o que favoreceria a leitura de mundo, isso aí ficaria ainda mais cristalino. Colocaram influenciadores, narradores esportivos de massa, YouTubers, jogadores de futebol, todos dizendo: aposte! Não haveria outro caminho. Vem aí a regulação e não sabemos muito bem o que esperar, mas confesso que não sou lá tão otimista.
Mas e as eleições?
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Esse mesmo povo, com essas mesmas características e necessidades e numa carência absurda por mudança vai votar com todo esse repertório a cada 2 anos. Você duvida? O deputado do baixo clero virou presidente com um discurso raso, recheado de frases prontas e sem proposta alguma. Outro presidente habilmente “conversa com a fome” durante toda a campanha e, com isso, é eleito. O homem cordial, clássico conceito de Sérgio Buarque de Holanda, nos joga na cara o que realmente move o nosso povo, não tem pra onde fugir. E todos eles sabem disso, as bets e os políticos.
As perspectivas não são das melhores. Talvez isso nem seja uma característica exclusiva do nosso povo, mas não afasta a ideia desanimadora que tudo isso provoca. A racionalidade leva tiro todo dia, o povo também. A inteligência coletiva é roubada e saqueada todo dia, como faz-se com o povo. Resta saber até quando e qual a consequência disso. Em meio a tantas perguntas e decepções, uma fagulha de esperança chega a ser ousadia demais.
Se o abismo é grande, espero que alguma boa voz ecoe.