O BRASIL É A FRANÇA …(do século XIX)

O BRASIL É A FRANÇA …(do século XIX)

por Roberto Musatti

     Entre Julho de 1870 e Maio de 1871, Francêses e Alemães (ainda não unificados, portanto ainda Prússia) guerrearam em busca de uma supremacia continental que resultou numa derrota humilhante para os franceses com a perda dos seus territorios da Alsácia e Lorena além de alto pagamento de indenização de guerra. Sob este manto de nacionalismo frustrado, oficiais do alto comando das forças armadas francesas ‘fabricaram’ um bode expiatório para a derrota na figura do capitão Alfred Dreyfus, forjando provas que o comprometiam como espião e traidor trabalhando para os Alemães. Por ser judeu e navegando numa época particularmente anti-semita na França do pós-guerra, sua condenação foi rápida assim como seu envio para a prisão da Ilha do Diabo na Guiana em 1894, onde ficou por cinco anos.

     A França vivia também um momento político turbulento. Republicanos liberais ganharam as eleições de 1892 contra os radicais de direita e socialistas que logo depois se aliaram como oposição ao governo. Esta instabilidade política resultou no assassinato do presidente eleito Carnot em 94, a renúncia de seu sucessor Casimir-Perrier em 95, sucedido por Felix Faure.

     Em 1898 o já famoso escritor Émile Zolá publica no jornal L’Aurore, carta aberta ao presidente Faure sob o título - hoje absolutamente ícone - “J’Accuse”! (Eu acuso!), onde revela provas da falsa acusação a Dreyfus, envolvendo três generais e vários oficiais do alto comando do exercito francês. Inicialmente Zola teve que fugir para a Inglaterra para não ser preso por difamação, retornando a tempo de ver Dreyfus ser perdoado em 1899. Entretanto sómente em 1906   foi re-incorporado ao exército com a patente de major com a qual combateu toda a 1ª Guerra Mundial.

     O Brasil dos últimos meses incorpora todo este ‘complô’ e a instabilidade política francesa da época de Zolá, que assim como na França, vem à tona em sucessivos capítulos que mais parecem um enredo de mini-série da TV. Primeiro foi o PT, descoberto no seu projeto “PT forever” que levou a corrupção (que sempre foram endêmicos no país) a níveis  e valores jamais vistos envolvendo obras e empresas públicas mistas. Poucos políticos sobraram da devassa emboram também poucos já tenham sido condenados. Em seguida vieram à superfície o grau e volume do envolvimento de grandes empresas privadas com o poder público, que acabou deixando pouquíssimos políticos de Brasília fora dos ‘esquemas’.

     O ‘Sistema’ ou o Poder Público nacional está com Metástase - o mercado e o empresariado nacional e internacional já não confia nas nossas Instituições - com bom motivos para tal. Congressistas se unem para promulgar lei que perdoe suas falcatruas. O Presidente, aparentemente com algo a esconder, conspira para tirar poder e eficiência da Polícia Federal e do Judiciário de 1ª Instância em Curitiba que têm promovido as principais investigações, provas e condenações por suborno e desvio de dinheiro público. Promotores da PGR reagem e armam esquema ‘Maquiavélicos’ para criminalizar o Presidente, com gravações inicialmente ilegais feitas por verdadeiro ‘Al Capone’ do mundo cenário empresarial nacional.

     Se alguém tinha esperança que dentre os Três Poderes, o Judiciário pudesse sair incólume e servindo de bastião democrático para o país, estas últimas semanas dissiparam qualquer otimismo. Não existe mais a Consistência necessária nas decisões do STF. Uma parte (Turma) dos Ministros concede Habeas Corpus a réus condenados em 1ª Instância, outra nega. Um Ministro decide monocraticamente aceitar um acordo de delação premiada em vez de levar ao Plenário e outros exigem a decisão pelo plenário. Ministros e Promotores não se declaram impossibilitados de julgar apesar de terem filhos ou parentes diversos trabalhando para acusados.

     Eventos mais sensacionalistas se sucedem. Procuradores Federais continuando no seu objetivo de destruição da corrupta classe política nacional a qualquer custo - mesmo que isso represente a mais profunda crise institucional do país em décadas - produziram  gravações que comprometem o Presidente da República sem que as mesmas tenham sido autenticadas tecnicamente até a exaustão pelos especialistas da PF. O país entrou em convulsão econômica, algo que poderia ter sido evitado e surgem agora percepções de golpe ou armação pois exames preliminares independentes parecem mostrar dezenas de edições na malfadada gravação. Ninguém quer isentar o Presidente de seus prováveis deslizes, mas é inaceitável a posição do presidente da PGU em querer instaurar inquérito e questionar o Presidente antes do resultado da autenticidade da fita gravada.

     Nada é tão ruim que não possa piorar, diz o ditado popular. Um dos sabidos maiores corruptores, de enriquecimento absolutamente duvidoso e patrocinado pela época Lulo-petista, se prontifica a colaborar com os procuradores da PGU na referida armação Holliwoodiana contra o Presidente não apenas em troca de uma delação premiada citando mais de 1.800 ocupantes de cargos públicos que eram regularmente subornados.

Para a total revolta de toda sociedade, obtém um inusitado e altamente questionável perdão total de culpa que possibilitou a ‘fuga’com a família e asseclas para New York em seu jato de US$ 35 milhões, a remessa de  seu iate de US$ 12 milhões num cargueiro para Miami , tudo com a aprovação monocrática do Ministro do STF e a tutela do Procurador Geral da União PGU que agora escreve sucessivos artigos na mídia tentando se justificar.

Como Lobo perde o pelo mas não o hábito, o Mafioso em questão, sabedor dos efeitos de sua delação faz uma especulação financeira tanto de dólares como de ações que resultaram em um lucro de aproximadamente R$ 350 milhões em apenas dois dias, em prejuízo dos sócios minoritários. Este último fato por si só já seria suficiente para cancelamento do acordo e decretação de prisão por crime de especulação com informação privilegiada. Nos EUA por muitíssimo menos, figuras expoentes do mundo financeiro ou social foram presas, julgadas e cumpriram penas em decisões de 1ª Instância. Ao contrário do Brasil, condenados nesta esfera inicial nos EUA têm seus processos invertidos ou seja, são agora considerados culpados até que provem inocência na instância superior seguinte. Assim José Dirceu jamais seria solto por Mendes, Toffoli e Levandowski nos EUA e Lula, se condenado por Moro, jamais seria candidato a nada, pois estaria preso.

     O derradeiro capítulo desta novela política surrealista que é o Brasil atual, foi a divulgação seletiva e ilegal de conversa telefônica do jornalista Reinaldo Azevedo com sua fonte, a irmã do senador Aécio Neves pela PGU ou PF, debaixo do nariz do Ministro do STF Fachin que não se apercebeu do deslize. Muitos discordam das posições recentes do jornalista, extremamente cáustico e crítico dos operadores (leia-se procuradores) da ‘Lava-Jato’, mas o modo nada Maquiavélico de vingança perpetrado, causou repreensão quase que unânime tanto da mídia como da sociedade e aumentou a descrença no Judiciário.

     O que se tem hoje no Brasil depois de todas essas revelações e lambanças é a deteriorização da confiança nas Instituições e o incremento nas percepções de impunidade e privilégios – verdadeiros obstáculos ao desenvolvimento do país. Ministros da Suprema Corte dos EUA não dão entrevistas ou aparecem na mídia. Não fazem lobby para seus familiares conseguirem cargos e empregos. Não  viajam ao exterior por semanas para participar - apenas por prestígio - de congressos inúteis. Não usam lobistas de empresas para conseguir aprovação de suas indicações no Senado. Ministros do Governo não continuam em seus cargos se são investigados por corrupção, desvio de dinheiro ou crimes semelhantes. Promotores Públicos não apresentam pedidos de processos contra membros do Executivo e Legislativo sem a certeza absoluta das provas produzidas pelo FBI. E certamente o Presidente não conspira contra o Judiciário!

     Enquanto não tivermos uma Magna Carta simples e que seja aplicada ao pé da letra por toda sociedade de forma universal e igualitária - embora tenhamos conseguido a Independência de Portugal - continuaremos dependentes da maldita Herança Absolutista Portuguesa.

By Roberto Musatti - Economista (USP). Mestre em Marketing (Michigan State) Doutorando (CIBU-San Diego). Professor das Faculdades REGES. musattiroberto@hotmail.com

 

     

    


Entre para ver ou adicionar um comentário

Outros artigos de Celso Napoleon

Outras pessoas também visualizaram

Conferir tópicos