O dia em que fui demitido e como isso me fortaleceu
Crédito da imagem: Gerd Altmann / Pixabay

O dia em que fui demitido e como isso me fortaleceu

Se me dissessem, pouco tempo atrás, que uma demissão poderia se tornar algo positivo e se transformar em um processo de fortalecimento mental, eu desacreditaria. Ainda assim, não há como ser hipócrita: baqueia, sim, te pega de “calças curtas”, sim.

No último dia 24 de julho, eu voltava ao trabalho super energizado e com baterias revigoradas depois daquelas que foram uma das melhores férias de toda a vida. Mochila nas costas, faço o ritual costumeiro: registro o ponto, sigo pelo corredor lateral, encho minha garrafa d’água, pego o jornal do dia e vou à até então mesa de trabalho.

Ligo o computador, quando o chefe de reportagem me avisa que o gerente-geral queria falar comigo. A mensagem soa como um alerta vermelho à mente. Era um indicativo que, na verdade, meu cérebro já criptografava e transformava na seguinte frase, dita interna e silenciosamente por minha própria voz: “ei, cara, esses são seus últimos minutos aqui”.

E, de fato, esses eram os instantes finais naquele ambiente de trabalho. O gerente agradeceu meus serviços, comentou sobre as dificuldades financeiras (o que já era evidente, pois outras demissões aconteceram) e me desejou boa sorte.

Inicialmente, tenho de admitir: sabemos da possibilidade de isso acontecer, mas dificilmente nos colocamos nessa posição. Sobretudo quando temos noção de nossa dedicação e de nosso desejo de sempre entregar o melhor possível, seja qual for a área de atuação de cada um de nós. Eu nunca havia sido demitido.

A surpresa também é maior quando você, junto de outros profissionais, está à frente de novos projetos da empresa. No meu caso, eu e dois amigos do trabalho (digo assim porque temos amizade, não eram apenas meros colegas de redação) tocávamos uma das propostas que, sem falsa modéstia, vinha se destacando e acredito ser uma das mais legais e interessantes do passado recente do veículo – felizmente, o projeto teve continuidade.

Depois do processamento da mensagem do tipo “ei cara, você já não faz mais parte disso”, um curta-metragem, para não dizer um longa com aceleração de velocidade, passa pela cabeça. Lembro e deixava claro para pessoas mais próximas: sempre tive o sonho de trabalhar ali, alimentado desde o primeiro ano de faculdade.

Sonho realizado

Posso encher o peito e dizer que o sonho se realizou. Primeiro, ainda na faculdade. Era início do segundo ano de jornalismo quando passei na entrevista. Saía estridente pela portaria. A alguns metros, sem eu ter dito nada, meu sorriso de felicidade denunciava a conquista à minha mãe, orgulhosa.

Acredito que aquela minha realização tenha significado a ela algo parecido à sua própria vitória. A menina que percorria, descalça, mais de 10 quilômetros de chão batido para sair do sítio à cidade e estudar, venceu na vida. A menina que dava aula aos seis irmãos nas paredes de uma humilde casa, hoje é professora de Geografia com longos anos de sala de aula.

De volta à minha história, permaneci os dois anos de estágio, de extremo aprendizado e evolução. O sonho, consumado, voltaria a bater na porta em março de 2018. A princípio, para cobrir uma licença-médica por três meses, período que se esticou com a minha efetivação, mas que se encerrou depois de quase um ano e meio.

Agora, um mês depois do ocorrido, digo que foi necessário e importante ter passado por essa experiência. Com quase quatro anos de trajetória dentro da empresa, meu trabalho talvez já estivesse de fato à beira do esgotamento de possibilidades.

Não faltaria empenho, é verdade. Porém, as inquietudes da geração da qual faço parte, certamente pedem novos desafios com mais frequência.

A sequência

Admito, ainda não defini e também não encontrei os tais próximos desafios, mas sei que em determinado momento eles vão aparecer. O que me deixa extremamente feliz, entretanto, é o meu atual estado mental. Me sinto feliz e fortalecido, uma prova de que nossa felicidade, vez ou outra, também tem o direito de não estar associada a trabalho.

Me recordo de uma amiga comentando que a ficha da demissão cairia quando eu percebesse a não obrigação de estar no trabalho, de produzir etc.

Me dei conta de modo absoluto logo na primeira semana, diria. Mas posso afirmar que, desde então, dificilmente tenho tido dias difíceis por conta disso. O meu segredo? Tento manter a chama da busca por conhecimento acesa intensamente. Os exercícios físicos diários também sustentam esse fortalecimento mental.

Não pense, portanto, que uma demissão é o fim dos tempos. Trata-se de um processo e, dependendo de como encarar, você pode até sair fortalecido. 

Esdras Felipe Pereira

Saí da pequena Guareí aos seis anos para o que, ao meu olhar de "caipira" (no melhor dos sentidos), era uma gigante Sorocaba à época. Hoje, estou com 25 e há três me formei em jornalismo. Sempre alimentei amor pela escrita, leitura e novos conhecimentos -- a profissão, portanto, tornou-se um prato cheio para unir as três coisas. 

Além das passagens profissionais, morei oito meses em Dublin, na Irlanda, lugar que me proporcionou vivência em um novo idioma e, consequentemente, evolução no inglês. Não só isso: conhecer novas culturas me transformou em relação à maneira de observar o mundo e as pessoas. 

Se pudesse, carregaria no bolso todos os dias um dos versos de 'Como um Sonho', do Emicida. Como não é possível sempre, carrego na mente: "O que te impede de levantar todos os dias e correr pelo que você acredita? Hein?! Eu acredito que o poder de transformação, realmente, tá na mão da gente".

Anderson Oliveira

Jornalista, repórter | Assessor de Comunicação | Professor

5 a

Sua experiência foi semelhante à minha, algum tempo atrás e na mesma instituição. Foi um aprendizado e tanto, não? Um longo e belo caminho ainda está por vir. Você é bastante talentoso e conseguirá alçar voos gigantescos. Abraço.

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