O discurso que garantiu a vitória de Trump
Patrícia Marins *
Contrariando todas as pesquisas e previsões, Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos. Prevaleceu sobre a união de políticos (inclusive de seu próprio partido), empresários, artistas e intelectuais renomados, além de grandes veículos de mídia, que apoiaram a democrata Hillary Clinton, a quem o candidato republicano demonizou e chamou de trambiqueira.
Assim como nos Estados Unidos, na França, Inglaterra e Alemanha, observou-se que as pesquisas de opinião não foram capazes de captar o poder de insurgência da direita. O que também aconteceu na Brexit, a saída do Reino Unido da União Européia.
Primeiro presidente do país sem uma carreira política, 70 anos, republicano, empresário, ex-apresentador de tv, conservador, fenômeno do Twitter, machista. Trump coleciona inúmeras características que deixam muitos apreensivos sobre o futuro do país e do mundo.
Na internet, extremistas islâmicos celebraram a vitória do magnata. Matéria da agência France-Presse (AFP) revelou mensagens trocadas entre partidários do grupo extremista Estado Islâmico. Uma delas diz: “A vitória de Trump é uma coisa boa para a nação muçulmana. Estou otimista porque ele é um touro estúpido, arrogante e presunçoso e é mais besta que (George) Bush".
Democratas que alegremente previam uma vitória fácil, menosprezaram o bizarro herói da classe trabalhadora e a onda dos ideais de direita que invadem os Estados Unidos e vários cantos do mundo.
Muito se comentou nos Estados Unidos, nos últimos dois dias, que o resultado da eleição era o cumprimento da profecia do escritor Sinclair Lewis. Em seu romance, “It Can't Happen Here” (Isso não pode acontecer aqui), escrito em 1935, Lewis descreve o fascismo invadindo os Estados Unidos. O personagem principal do livro é um senador populista, eleito presidente com a promessa de fazer grandes reformas econômicas e resgatar os valores tradicionais da nação. Após sua vitória, ele impõe um regime totalitário com a ajuda de força paramilitar como Adolf Hitler.
E qual foi o discurso que ele usou para chegar a vitória? Basicamente utilizou a narrativa contra o politicamente correto para vender soluções simplistas e radicais. Seu discurso atendeu a insatisfação econômica, principalmente concentrada na população branca de baixa escolaridade.
A proposta de Trump era simples e relembrou a do marqueteiro James Carville na eleição de Bill Clinton, em 1992: mudança ou continuidade?
Sua estratégia de comunicação foi eficaz para estabelecer a dúvida sobre as conquistas ou as não conquistas do país. Ele criou uma mensagem a partir da paixão popular e a imagem de uma liderança de “força bruta”. Somou-se a isso o fato de ter uma adversária, Hillary Clinton, que não conseguiu herdar o carisma de Barack Obama e quanto mais campanha fazia, mais aumentavam as opiniões desfavoráveis a ela (inclusive em seu próprio partido).
Os Estados Unidos já enfrentaram situações econômicas muito mais difíceis e não sucumbiram às demagogias ou ao fascismo. Trump, no entanto, depois de insultar mexicanos, mulçumanos, mulheres e pessoas com deficiência, soube aproveitar a oportunidade da instabilidade econômica para conquistar votos contando a história de “fazer a América grande novamente”.
* Jornalista e consultora de comunicação, é sócia do Grupo In Press em Brasília.