O impacto da inteligência artificial nas greves de Hollywood
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O impacto da inteligência artificial nas greves de Hollywood

*Escrito em coautoria com Lucas Vinicius Brito dos Santos


Em 2023 a indústria do entretenimento dos Estados Unidos se deparou com dois grandes movimentos: a greve dos roteiristas e a dos atores. A primeira durou 148 dias e a segunda 120 dias e, nesse intervalo de tempo, muitas produções foram adiadas, além do impacto na divulgação daquelas que já estavam prontas para estreia.

 

Mas antes de tratarmos sobre qual a relação do tema “inteligência artificial” com as greves, é importante apresentar e entender o contexto delas.

 

As figuras principais das greves foram organizações ligadas aos Sindicatos dos Roteiristas, Sindicato dos Atores, em suas respectivas paralisações, e a AMPTP - Alliance of Motion Picture and Television Producers, associação que representa os interesses das produtoras de cinema e TV, que atuam em ambas.

 

As paralisações foram iniciadas após a impossibilidade dos respectivos Sindicatos e a AMPTP avançarem as negociações, que acontecem periodicamente, sobre questões como remuneração e condições de contratação.

 

E é nesse contexto que o tema da inteligência artificial se envolve com a greve, pois ambos os sindicatos tinham demandas envolvendo a sua utilização, o que torna muito relevante a sua análise em razão da influência que o mercado dos Estados Unidos possui no mundo, de forma que as negociações e acordos podem influenciar em regulações futuras.

 

Em suma, o Sindicato dos Roteiristas buscava, em relação à inteligência artificial, o impedimento do seu uso para escrever ou reescrever materiais como roteiros e diálogos, a não consideração como fonte do material e a vedação da utilização dos materiais cobertos pelo acordo para o treinamento de inteligência artificial.

 

Ao final da parada, o acordo entre os roteiristas e a AMPTP manteve os dois primeiros pontos, de forma que não será possível que a inteligência artificial escreva ou reescreva o material final, nem a consideração da IA como fonte do material final.

 

Em relação ao terceiro ponto, a utilização dos materiais produzidos pelos roteiristas do Sindicato para o treinamento de inteligência artificial, o acordo foi mais amplo, basicamente reconhecendo que o campo regulatório sobre o tema ainda é incerto e está em desenvolvimento, de forma que reservou o direito do Sindicato ou o roteirista de vedar o uso do seu material coberto pelo acordo para tanto.

 

O acordo também dispôs que um roteirista pode utilizar ferramentas de inteligência artificial no desenvolvimento do seu trabalho, caso a empresa concorde e, desde que, ele siga as normas internas, porém sem a obrigação no uso das ferramentas de IA.

 

De maneira similar, os roteiristas deverão ser informados se qualquer material a eles fornecido foi gerado ou complementado por inteligência artificial.

 

Por sua vez, o Sindicato dos Atores se preocupava em estabelecer regras para proteger o trabalho humano e a necessidade de consentimento e compensação para a utilização de “réplicas digitais” de artistas ou, quando a sua voz, carisma ou performance, fosse alterada pelo uso da inteligência artificial.

 

Sobre o tema, o contrato final previu, em resumo, a necessidade de consentimento, estabeleceu guias e formas de compensação para a criação e utilização de “réplicas” de atores – inclusive falecidos -, personagens digitais baseados em artistas, figurantes digitais criados a partir de um ator que não filmou as cenas, e a utilização de inteligência artificial para simular a voz, movimentos e expressões faciais de atores e criar conteúdos novos.

 

 

Importante observar que os termos desses acordos não são definitivos, pois as negociações entre os Sindicados e a AMPTP costumam ocorrer a cada três anos, de forma que acordos futuros podem ser mais ou menos restritivos, inclusive em razão do rápido desenvolvimento tecnológico.

 

Contudo, tendo em vista as demandas e termos dos acordos é inegável que a utilização da inteligência artificial em demandas criativas e artísticas já é uma realidade, de forma que a preocupação passa a ser a forma de regulação e estabelecimento de boas práticas para garantir que o seu uso ético caminhe ao lado da evolução técnica.


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