O QUE É ISSO?

Foi estarrecedor, imprevisível, inacreditável. Trump na Casa Branca não estava no radar de ninguém. Nem mesmo no de seus eleitores convictos. A vaga possibilidade desse cataclismo sequer habitava o mais tenebroso pesadelo de quem quer que seja. Ele era tratado como piada de mau gosto. Mesmo nos derradeiros dias, às vésperas do veredicto. E o mundo emudeceu diante do impensável. Entrou em choque. O que será Trump, aprendiz de presidente, daqui para frente? Não há remota ideia. Não se tem como cravar com certeza. O que ele representa, pelo que disse e fez, já é de assustar. Sexista, racista e xenófobo ao extremo, Trump plantou a hostilidade, o ressentimento e a divisão de classes como armas de campanha. Pregou o populismo patológico e prometeu aberrações como a construção de um muro para impedir a entrada de imigrantes mexicanos. Falou em deportação implacável dos que vivem no seu país de maneira irregular. Venceu com a marca da provocação. Nunca se viu nada igual em termos de liderança americana. Um candidato que brigou não apenas com opositores como também com aliados. Invocou de maneira leviana o rompimento de acordos de livre comércio, o cancelamento de compromissos multilaterais sobre o clima e até a retirada americana da Otan. Sua ascensão representa o triunfo da intolerância. Do ódio sem limites. Da loucura, em última análise. A nação, sob o tacape do magnata que se vangloria de não pagar impostos, está dividida. Muitos dizem que ele é a devastação do sistema político dos EUA. Outros enxergam nele a esperança de um país pujante, voltando a ser grande novamente, como prega o seu slogan. Trump na presidência dos EUA é, na melhor das hipóteses, um salto no escuro. A vitória da mediocridade. Uma anomalia que ainda cobrará alto preço da humanidade. Foi o grito contra o establishment que o colocou lá. O protesto a líderes, instituições e saídas convencionais. A maioria nada desprezível de 59 milhões de eleitores encontrou em Trump o arauto da boa nova, capaz de resgatar empregos, recuperar o cinturão falido de indústrias sucateadas pelo avanço dos tigres asiáticos e, de quebra, incensar a autoestima americana. Sonho telúrico que acabou por entregar a cadeira mais poderosa da terra nas mãos de um paladino autoritário, um arrivista temperamental sem vivência na administração pública e pouco tato no plano político. É do topete de Trump que sairão decisões vitais sobre os rumos do planeta, inclusive a de apertar o botão e implodir com tudo. A perturbadora escolha de seus compatriotas não levou em conta se o candidato estava à altura da tarefa. Valeram apenas, como suficientes, as bravatas de repulsa à globalização e de exaltação racial aos conterrâneos. Salvadores da pátria são célebres por despontar em momentos de frustração, tal qual esse. Hitler na Alemanha e Mussolini na Itália tiveram igual oportunidade. Tomara, nada das sandices que Trump arrotou durante a campanha se cumpra. Do oriente ao ocidente vivem-se dias de sobressaltos. Entrou em curso, decerto, uma nova ordem global. Mais desagregadora. Menos condescendente. O movimento do Brexit na Inglaterra já havia sinalizado algo nessa direção. O avanço de Marine Le Pen, na França, segue no mesmo caminho. Mas nada é comparável aos planos conservadores e à ruptura de paradigmas propostos por Trump. Com sua epopeia de mentiras ele prenuncia dias sombrios pela frente e deixa todos atônitos a se perguntar: o que é isso?

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