O que é marketing jurídico como geração de valor

O que é o marketing jurídico? O que é e como se aplica essa atividade tão importante, mas tão pouco compreendida, à realidade dos advogados e escritórios de advocacia?

De início, temos que afastar uma concepção equivocada de que o marketing se resume à publicidade e ao processo de captação de clientela e que, por isso, seria vedado na Advocacia.

Esse equívoco acaba por impedir que muitos profissionais atinjam resultados mais expressivos com a profissão por medo de violar o Código de Ética e Disciplina da OAB.

Tudo bem que o Código traga severas restrições à publicidade profissional.

Contudo, a expressão “marketing” sequer é citada no Código ou no Estatuto da Advocacia.

Esse medo não só é infundado, como pode prejudicar seriamente os seus resultados na Advocacia.

Neste artigo, vamos entender o que é marketing jurídico e porque ele não só não é vedadopara advogados, mas consiste numa atividade imprescindível para a prestação dos serviços advocatícios.

O conceito de Marketing

Marketing é a atividade que envolve a “identificação e a satisfação de necessidades humanas e sociais” (Philip Kotler).

Mesmo os mais conservadores e reativos à atividade do marketing na advocacia também fazem marketing.

A questão não é se o marketing pode ou não pode ser implementado na advocacia, mas “como” pode ser feito de forma ética e estratégica, trazendo os resultados desejados de forma otimizada.

Para isso, é preciso entender, afinal, o que é o marketing jurídico.

Antes de entender ir ao tema central, precisamos entender o que é o marketing considerado como tal.

Philip Kotler, autor norte-americano que é uma das grandes referências acadêmicas da área, define marketing como a atividade que envolve a “identificação e a satisfação de necessidades humanas e sociais”.

Perceba que nada se fala sobre publicidade ou propaganda, mas de satisfação de necessidades humanas.

A confusão vai se desfazendo!

Mas há uma outra definição do marketing que também é interessante.

A partir dos trabalhos do estudioso suíço Alexander Osterwalder, o marketing se aproxima da atividade de geração de valor.

Juntamente com 470 empreendedores de todo o mundo, Osterwalder criou o famoso Canvas Business Model, que é uma metodologia de modelagem de negócios muito utilizada por Startups (e que começa a ganhar atenção na advocacia).

Com o Canvas, a ideia de marketing ficou associada com as atividades de identificar, criar, comunicar, e entregar valor aos clientes.

Nesta concepção mais moderna, você faz marketing toda vez que pratica algumas das atividades listadas abaixo:

  1. investiga e identifica o que o cliente considera como valoroso na prestação do seu serviço;
  2. quando você transforma em realidade aquilo que gera valor para o cliente;
  3. quando você comunica esse valor ao cliente;
  4. quando você efetivamente entrega esse valor ao cliente quando da prestação do seu serviço.

O conceito de marketing jurídico

Marketing jurídico é a atividade de geração de valor para clientes de serviços advocatícios, respeitando as diretrizes deontolológicas estabelecidas pelo Estatuto, o Código de Ética e Disciplina, os provimentos administrativos da OAB e o posicionamento dos Tribunais de Ética e Disciplina de cada seccional

Uma vez que delimitamos o que é marketing, vamos agora definir o que é o marketing jurídico.

Trata-se de uma atividade de geração de valor para clientes de serviços jurídicos.

Via de regra, fala-se de marketing jurídico como atividade de advogados, mas poderíamos ampliar o conceito para outras atividades jurídicas que também demandam geração de valor para clientes, como os serviços notariais, por exemplo.

Porém, vamos nos ater apenas ao marketing praticado por advogados, que é, em larga medida, determinado pelas diretrizes do Estatuto da Advocacia e da OAB e pelo Código de Ética e Disciplina da OAB.

Assim, podemos definir o marketing jurídico como a atividade de geração de valor para clientes de serviços advocatícios, respeitando as diretrizes deontolológicas estabelecidas pelo Estatuto, o Código de Ética e Disciplina, os provimentos administrativos da OAB e o posicionamento dos Tribunais de Ética e Disciplina de cada seccional.

Como gerar valor na Advocacia?

Valor é tudo aquilo que satisfaz as necessidades dos clientes, causando uma impressão positiva nos mesmos.

Valor é uma percepção subjetiva. Ou seja, o que tem valor para um, pode não ter para o outro, dependendo do perfil considerado.

Valor é tudo aquilo que satisfaz as necessidades dos clientes, causando uma impressão positiva nos mesmos.

Um exemplo: dar palestras gera valor aos clientes em dois sentidos: educa o cliente sobre o seu serviço e gera uma sensação de autoridade e segurança, uma boa impressão de que você sabe do que está falando (quando a palestra é boa, obviamente).

Mas, para determinado tipo de advocacia, dar palestras pode não gerar nenhuma impressão positiva ou, o que é pior, pode causar o desconforto da exposição excessiva.

Por exemplo, um advogado criminalista que vai falar sobre a defesa de clientes que tenham praticado crimes contra o patrimônio ou a vida.

O que o cliente quer nem sempre é o que ele precisa

É importante ter sempre isso em mente: valor não se confunde com atender aos desejos do cliente.

Valor implica em entregar algo que satisfaça a necessidade do cliente e cause uma impressão positiva.

O que o cliente quer (desejo), nem sempre é o que ele precisa (necessidade).

Por exemplo, um cliente pode querer uma decisão rápida do juiz, mas o que ele precisa, de fato, é de um advogado que tenha condições de dar o melhor andamento possível ao processo, podendo fazer visitas ao fórum e sabendo lidar com o juiz e os serventuários da justiça.

Perceba que o desejo por uma decisão rápida pode levar o cliente a contratar com um advogado pouco confiável, que faça essa promessa difícil de ser cumprida.

Também é importante não confundir desejo com necessidade, sob pena de ficar refém de caprichos do cliente.

Por mais óbvio que pareça, em primeiro lugar é preciso entender quais são as necessidades do cliente.

Isso envolve uma atitude simples, mas muito difícil de ser implementada: entender o cliente na perspectiva do cliente.

Entender o cliente na perspectiva do cliente

O marketing sem algum tipo de pesquisa sobre os clientes (atuais e potenciais) é como um tiro no escuro.

Muitos profissionais com maior experiência no mercado alegam conhecer seus clientes como a palma da mão.

Contudo, é possível conhecer bem o cliente, mas na perspectiva do prestador do serviço.

Clientes são chatos, ligam o tempo inteiro, cobram demais e querem pagar de menos, não entendem o que você faz e querem dar pitacos no serviço sem conhecimento de causa.

Ora, essa não é, por certo, a perspectiva do cliente.

Partindo dessas premissas, dificilmente você vai conseguir identificar o que gera valor para seus clientes.

Você não precisa negar essa realidade, mas precisa entender o outro lado da moeda, a forma como o seu cliente enxerga o seu serviço.

Isso envolve algo que pouquíssimos escritórios e profissionais realizam: pesquisa de clientes.

A pesquisa de clientes

O marketing sem algum tipo de pesquisa sobre os clientes (atuais e potenciais) é como um tiro no escuro.

Você pode ou não alcançar os resultados desejados, mas o mais provável é que não.

Essa é uma atividade de marketing fundamental: identificar os problemas dos clientes (na perspectiva dos clientes).

Isso pode ser feito de várias maneiras: de uma conversa informal com clientes do escritório a uma estruturada pesquisa de mercado, envolvendo entrevista com vários perfis diferentes de clientes potenciais do escritório.

O importante é não começar a investir no marketing antes de ter informações mais fidedignas dos seus clientes.

É comum na advocacia começar na atividade, fazendo um considerável investimento na estrutura de base do escritório, antes de definir de que forma você conseguirá gerar valor para os clientes.

Como se o mercado já estivesse pronto, as necessidades fossem as mesmas e os clientes já soubessem exatamente do que precisam.

Isso pode até ter sido verdade algum dia (eu não acredito muito nessa hipótese), mas no mercado atual definitivamente não é.

Com um mercado saturado de profissionais, o cliente pode se dar ao luxo de escolher aquele profissional no qual enxerga mais valor.

Ou então se submeter ao leilão de preços e se submeter ao advogado que cobra honorários mais baixos ou não cobra consulta.

O cliente se submete ao leilão de preços quando não consegue enxergar outro valor nos serviços advocatícios, e trata os advogados como uma commodity.

A criação de valor

Uma vez identificado o que satisfaz as necessidades e o que resolve os problemas enfrentados pelos seus clientes, cabe ao marketing criar as soluções, os mecanismos de satisfação dessas necessidades.

É um processo ao mesmo tempo criativo e organizativo.

Criativo porque envolve imaginar as soluções e mecanismos.

Por exemplo, seus clientes reclamam que não são informados devidamente sobre o andamento do processo e que isso gera muita insegurança e ansiedade.

Isso obviamente diminui a percepção de valor que eles possuem sobre a sua advocacia.

Ora, que soluções (ao seu alcance) podem ser criadas para resolver o problema ou, pelo menos, amenizar o impacto negativo que ele tem na percepção de valor dos clientes?

Criar uma área de clientes no site com os andamentos processuais, contratar um estagiário para informar por e-mail (ou whatsapp), ligar uma vez por semana para os clientes?

Note que a solução depende dos recursos disponíveis, do perfil do cliente e da urgência do problema.

Quanto mais recursos, quanto mais conhecido o perfil do cliente e quanto menor a urgência, maiores as chances de encontrar uma solução satisfatória que encantará o cliente.

O processo também é organizativo, porque envolve o correto uso dos recursos do seu escritório.

Criar soluções e mecanismos envolve alocar pessoas, know-how, tempo, dinheiro, tecnologia para os lugares certos.

A solução de enviar os andamentos do processo por whatsapp aos clientes, por exemplo, pode envolver a contratação de um novo colaborador, ou a atribuição de tarefas aos colaboradores já contratados.

Envolve alocação de tempo, de tecnologia (compra de um celular), de know-how (escrever para cliente e domínio da ferramenta).

Lembrando: quanto mais se conhece sobre os clientes, maiores as chances de atingir os objetivos de marketing estabelecidos.

A comunicação de valor

De nada adianta criar soluções de valor aos clientes, se estes não tem condições ou conhecimento suficiente para entender o valor por trás das soluções.

Ou simplesmente não sabem que a sua solução existe.

Isso significa que você precisa comunicar o valor criado, sob pena de não conquistar seus clientes.

E comunicar aqui significa duas coisas:

  • informar aos clientes da sua existência e da solução que você traz;
  • educar o seu cliente para que ele perceba valor na solução oferecida.

Essa é a parte do processo de marketing que podemos associar ao que muitos acreditam ser todo o marketing: a publicidade profissional.

A publicidade profissional basicamente tem o objetivo de atingir um dos ativos mais importantes do mercado para qualquer tipo de empresa ou profissional: a atenção das pessoas.

Essa é uma parte sensível do marketing na advocacia, tendo em vista as várias restrições impostas pela ética profissional.

Confira nosso  infográfico exclusivo sobre o que pode e o que não pode na publicidade na Advocacia, de acordo com o Código de Ética e Disciplina da OAB ( clique aqui).

Aqui as regras do Código de Ética e Disciplina incidem de forma bastante restritiva. 

Como o Código de Ética da OAB influencia a comunicação de valor?

O artigo 39 do Código de Ética da OAB traz o que chamo de princípios da publicidade profissional para os Advogados:

Art. 39. A publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão.

Há 4 princípios a serem considerados aqui:

  • caráter informativo;
  • publicidade discreta e sóbria;
  • vedação à captação de clientela;
  • vedação à mercantilização da profissão.

Caráter informativo – a publicidade não pode implicar em oferta de serviço ou autopromoção, lidando apenas com informações específicas sobre o escritório ou sobre o Direito em tese.

Discrição e sobriedade – princípio amplo (e vago), impõe ao advogado que não assuma um expediente apelativo em sua publicidade, evitando uma identidade visual muito poluída, frases de efeito e uso de canais e estratégias típicas do mundo do comércio.

Vedação à captação de clientela – veda a possibilidade do Advogado ativamente captar clientes usando de expedientes taxativamente descritos no Código de Ética da OAB.

Vedação à mercantilização da profissão – veda que o Advogado trate os serviços advocatícios como uma mercadoria qualquer, sujeita a regras de transação comercial próprias do mercado comercial e industrial.

A Entrega do Valor

E, por fim, é preciso entregar o valor criado e comunicado.

No processo de relacionamento com o cliente, o valor aparece como uma promessa.

Uma promessa de resultado! Isso mesmo: re-sul-ta-do.

Sei que a advocacia é uma atividade de meio e que o advogado não pode prometer resultado.

Mas há duas categorias de resultados, e uma delas o advogado promete, quer queira, quer não.

Promessa de resultado de demanda judicial ou administrativa é vedada, mas promessa de resultado da atividade meio é inevitável.

Por exemplo: quando você fecha o contrato com o cliente, está prometendo (ou pelo menos deveria) que vai manter a boa comunicação, que vai prestar informações sempre que necessário, que vai ajuizar a ação e acompanhar o andamento do processo, que o clima de confiança que você transmitiu continuará depois que ele pagar, que será diligente com prazos e com a qualidade do serviço, etc.

E se você prometer e não entregar, corre o risco de ver a reputação da sua advocacia ser manchada.

É uma promessa de resultados que precisa ser cumprida!

Sob pena de ver seu cliente se tornar um algoz da sua atividade, muitas vezes mais espinhoso do que os próprios concorrentes.

Como entregar resultados: a experiência do cliente

Um dos maiores desafios do marketing jurídico é melhorar a experiência do cliente.

A experiência do cliente é a soma de impressões positivas e negativas que o cliente tem ao interagir com o seu escritório.

Ela começar mesmo antes da contratação do seu serviço (numa palestra ou numa visita ao seu site) e continua mesmo depois que o serviço já tenha sido prestado.

Tudo conta: se o banheiro do seu escritório está limpo, se a sua mesa está organizada, se a secretária fez um atendimento com cortesia, se as informações são prestadas de maneira clara e numa linguagem acessível, se a ação foi ajuizada na data prometida, se há transparência no relacionamento, se você ouve o cliente com atenção, se manda uma mensagem no dia do seu aniversário, etc.

A experiência do cliente é tão (ou mais) importante que a própria prestação do serviço advocatício.

Há uma crença muito comum na advocacia que ao prestar um bom serviço, você será indicado e construirá uma sólida carteira de clientes.

É preciso ter cuidado com este tipo de afirmação, pois o cliente, via de regra, não tem condições de avaliar a qualidade técnica do seu serviço.

Outros detalhes da prestação do serviço, ligados à experiência do cliente, são mais importantes do que o domínio do Direito ou a qualidade de uma peça jurídica.

Para entregar o melhor resultado é preciso estar atento às necessidades dos clientes.

Observar, pesquisar, analisar e ouvir os clientes é importante, e deve ser um processo contínuo e sistemático do seu escritório.

É uma atividade de marketing jurídico fundamental no sentido de fidelizar seus clientes e ganhar novos clientes por uma via muito importante na Advocacia: a indicação.


O que vimos neste Artigo?

  • O conceito de marketing no geral
  • Como esse conceito se aplica ao universo jurídico
  • Que o marketing é uma atividade de geração de valor
  • Que isso implica em entender o cliente na perspectiva do cliente (e não na sua)
  • Que a geração de valor envolve: (a) a pesquisa de clientes; (b) a criação de valor para eles; (c) a adequada comunicação desses valor criado; (d) a efetiva entrega do valor prometido.
  • O que pode e o que não pode na comunicação de marketing do Advogado.


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