O que esperamos para o setor saúde em 2024?
Estamos à beira de um novo ano. 2023 foi um ano truncado, de ressaca pós Covid, pós eleições, pós tudo, em um choque de realidade que há muito não víamos. O mundo BANI se apropriou das redes sociais, e termos como quiet quitting, burnout, crise no setor saúde, dominaram esse setor tão complexo e maravilhoso.
Essa mudança no calendário vem com um significado único: Esperança. Em um simples dia, ou melhor, uma simples noite, viramos a chave, mudamos nossas expectativas, fazemos resoluções e nos entregamos de corpo e alma à Esperança. A virada do ano é a entrada da Esperança no nosso planejamento.
E isso faz sentido, pois somos seres que se movem baseados na espera. Esperamos, e esperamos muitas coisas. Então, o que nós, pertencentes ao setor saúde, esperamos para 2024?
A resposta banal seria que esperamos que a crise passe, que a legislação se torne mais coerente, que todos os atores trabalhem juntos e que finalmente a equação do valor em saúde (qualidade/custo) possa ser implementada sem maiores problemas. Acredito que esse é o nosso maior erro de posicionamento: onde colocamos nossa esperança.
No setor saúde, os atores/stakeholders tem esperanças diferentes e opostas, apesar de dizermos em uníssono que nosso maior desejo é colocar o paciente no centro e tornar a gestão de saúde mais eficiente e lucrativa para todos.
Mas o que temos é um sistema perverso, com uma equação ineficaz e letal para o paciente e os atores envolvidos neste ecossistema. Os médicos esperam que o paciente fique doente pois senão não terão um volume de atendimento para receber por produtividade (aqui não discutimos questões éticas, somente a esperança inconsciente, ou nem tanto).
Os hospitais e instituições de saúde esperam que o paciente fique só um pouco doente, e com patologias que permitam uma resolução rápida pois precisam girar leitos, mesmo em leitos de CTI. Um aparte para a experiência “pronto atendimento”, que desafia a lógica dos maiores sábios em gestão.
As operadoras e seguradoras de saúde esperam que o paciente não fique doente em hipótese nenhuma, mas que continue pagando os custos daqueles que ousam adoecer.
Os enfermeiros esperam poder cuidar do paciente, e que esse paciente aceite ser cuidado, mas que não sejam muito dependentes, pois o trabalho se torna exaustivo para uma profissão que exige dedicação e paciência ao extremo.
O próprio sistema nacional de saúde espera que gestores sem capacitação e recursos adequados gerenciem o impossível, ou que os profissionais de saúde aceitem um pagamento inadequado para tantos anos de estudo, dedicação e agora, judicialização, e que o paciente aceite unidades de saúde que o jogam de um lado para o outro sem maiores explicações.
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E o paciente? Colocamos o paciente no centro do cuidado, mas não sabemos exatamente o que o paciente espera. E esse é o meu maior questionamento quanto ao valor em saúde. Mais do que modelos de pagamentos, o que me intriga em termos de aplicabilidade é como lidar com o que o paciente espera.
Criamos um paciente ideal, aquele que deseja ser cuidado, que deseja qualidade de vida melhor, que quer ser proativo com relação à sua própria saúde. Mas o que vemos, principalmente no nosso país, é um paciente que possui uma ignorância absurda sobre sua própria condição de saúde, e o pior, não demonstra tanta vontade de aprender.
Pacientes que pervertem o sentido de um atendimento, buscando internações e atestados desnecessários, que desejam “gastar o convênio”, mesmo sem precisar porque o valor é alto, e afinal de contas, um “check-up” não faz mal a ninguém, pacientes que agem com dolo ao buscarem oportunidades de litígio, e principalmente os pacientes que se recusam a buscar a saúde.
Agora retorno à minha reflexão inicial, o que esperamos para 2024?
Eu, pessoalmente, espero que todos nós repensemos o valor em saúde. Em como alocar inúmeros dados dos pacientes de maneira a corrigir esse desvio de esperança.
Em como recolocar os profissionais assistenciais em uma situação digna e alinhada com a busca pela saúde. Em como entender de verdade o paciente em toda a sua complexidade, e não colocando a saúde como um cliente, mas como uma meta final e contínua (entendam o paradoxo desse pensamento).
Antes de tentar importar esperanças que na prática se tornam inviáveis, porque não aprender e ensinar a verdadeira saúde?
Que o ano de 2024 seja o ano onde conseguiremos alinhar nossas esperanças, e a partir desse alicerce, começarmos a construir um verdadeiro sistema de valor para quem precisa de saúde e quem vive da saúde.
Desejo a todos um feliz e esperançoso 2024!
SCS