O que a Pecuária produz?
Hoje estive em um dia de campo em uma ótima fazenda nos arredores de Brasília-DF. O anfitrião, criador de Nelore, recepcionou mais de 100 pessoas com muita cortesia e fartura. Apesar do atraso para início das apresentações programadas, a simpatia e descontração davam o tom da reunião.
Passadas algumas horas do horário estabelecido, deu-se início ao ciclo de palestras. O anfitrião explicou objetivamente sobre seu sistema de criação, o foco de sua fazenda, os prêmios conquistados através da genética de seus animais, etc. Seguiram-se exposições de um veterinário sobre alguns cuidados com doenças recorrentes, uma representante de uma marca de suplementos nutricionais que alertava sobre a importância da nutrição para alcance de máximo desempenho e, por fim, palestra de um zootecnista em que explicava com muita desenvoltura o sistema EPMURAS e as implicações morfológicas dos animais em seu desempenho produtivo e a representatividade desta avaliação na rentabilidade do produtor.
O evento foi realizado em ordem a promover a venda de genética da fazenda e dentro dos padrões comuns da pecuária de corte foi muito bem organizado e realizado, mas uma coisa em especial me deixou inquieto. Após as palestras houve um almoço com churrasco. Salada, arroz, feijão tropeiro, mandioca frita e carne... E foi justamente a carne servida em um evento com um propósito comercial de pecuária que gerou a reflexão que dá o título deste texto.
A picanha, peça principal do churrasco brasileiro, estava dura. Não estava ruim e não quero soar ingrato. O evento foi ótimo e eu, assim como todos os demais, fui muito bem recepcionado e servido. Mas uma picanha dura servida em um evento de venda de genética campeã em grandes eventos de pecuária do Brasil me deixou intrigado sobre qual era o objetivo afinal. A pecuária serve para vender boi ou para vender carne?
Eu não sei se a carne servida no churrasco era proveniente dos animais da propriedade. Sei que, na minha opinião, o verdadeiro marketing do boi tem que ser feito no prato. É ali que se põe à prova a qualidade da produção.
Não vou entrar no mérito de propósitos produtivos. Há quem crie animais que irão ser comercializados como commodity, há quem crie animais que irão se transformar em carne premium. No final da cadeia, é importante apenas ter muita carne ou ter carne boa? Produzimos boi pelo boi ou boi pela carne?
O Brasil exporta muita carne porque produz carne barata e produz carne barata porque não cobra pelo custo ambiental da produção. Esse modelo tem prazo de validade. Carne bovina será, no futuro, um produto cada vez mais caro e, portanto, raro. A minha aposta é que vai ter mais chances de sobreviver na indústria quem souber produzir carne boa e não quem souber produzir apenas muita carne.
Renato de Marcondes Bé
Zootecnia em curso. Pecuária em foco.