O ROMANTISMO DA ARQUEOLOGIA
O pesquisador Walderi Gouveia Rodrigues fala sobre o romantismo, que pouco ou nada mais existe na Arqueologia. Aliás, um tópico que abordei em algumas de minhas obras e que evidentemente sou partidário.Claro que aqui estamos tratando dos métodos de datação, mas é importante enaltecer sua colocação quando diz que "a temporalidade, quanto maior, mais romanesca", se é que consegui captar a intenção dele.
Me lembro certa vez, quando conversava com Pedro Paulo Funari e Gilson Rambelli, na UNICAMP, sobre um novo título que seria lançado, (sob a coordenação de Funari, com textos de cada um dos integrantes da turma) e da necessidade que tínhamos de bancar a edição.
Me lembro ainda que um dos meus comentários foi que os livros extremamente técnicos não vendiam, pois tinham um público muito restrito, e leigos jamais entenderiam ou se interessariam. Foi quando Rambelli me perguntou como eu faria. Dei então a eles, um exemplar de meu último título e disse: -Escreva de maneira que o público leitor faça parte da história. Que ele entenda a linguagem e interprete o seu texto com facilidade. Crie personagens dentro da sua equipe e monte uma história para cada descoberta, com início, meio e fim. Faça com que seu leitor assista um filme lendo seu livro.
Quando lancei "VESTÍGIOS NEOLÍTICOS: de Itapira a Socorro", pedi a um antigo professor de História, Nelson de Lucca, da época do antigo ginásio, para prefaciar. Foi assim que ele descreveu: "O professor Omar, com muita sensibilidade conseguiu nos presentear com um livro cujo rigor científico não se divorciou de uma linguagem amena onde a pesquisa acontece num clima de aventura e lances poéticos. Descreve com riqueza de detalhes, como num diário de aventuras, o dia-a-dia dos trabalhos de uma equipe de pesquisadores em busca das relíquias arqueológicas, vindo a acrescentar novas informações sobre a presença humana em nosso território, especialmente em terras paulistas, em épocas anteriores à chegada do europeu.".
Walderi Rodrigues, no seu texto sobre datação, durante o MBA em Arqueologia, pela Claretiano, fala de Goeldi. Eu acrescentaria ainda Lund, Ceram, Heinrich Schliemann. Certamente aprendi com eles, pois foram os principais antecessores das minhas leituras na área. E foi isso o que eu disse para o Dr. Gilson Rambelli, que me achava um aventureiro e não um arqueólogo: "Minhas aventuras vendem mais que suas dissertações". Assim foi com "Vestígios Neolíticos: de Itapira a Socorro", "Histórias e Aventuras", "Incas no Brasil?" (já em segunda edição) e "Diário de Bordo: Arqueologia Brasileira".
Sabemos que alguns métodos de datação, já existentes, são de uma tecnologia de última geração e que nem temos ainda, alguns deles, aqui no Brasil, infelizmente.
Hoje é possível analisar um sítio sem qualquer escavação dado os métodos. É como se tirássemos uma radiografia do terreno. Como se fizéssemos uma tomografia da montanha, sem destruir um pedaço sequer do ambiente.Evoluiu? Muito. Perdeu seu romantismo?Bem, depende. O que você acha de namoro por aplicativo? Acho que é mais ou menos a mesma coisa.
Em relação aos textos, como escreveu Walderi, “penso que devem ser mais didáticos – usando a visão de um cronista, para obter alguma mudança na forma que vemos a Arqueologia hoje”.
E ele está certo, pelo menos na minha visão.
"Histórias e Aventuras", escrevi assim. Não tem dados estatísticos e nem gráficos, mas histórias mostrando as dificuldades e conquistas, sempre de forma hilária.
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Penso que a ideia de escrever sobre "A importância da mulher indígena na construção, na técnica, e no desenvolvimento de uma linguagem simbólica na Amazônia antiga" (um trabalho que Walderi está produzindo) usando essa visão didática de um cronista, além de ser um assunto interessantíssimo, trará, sem dúvida, algo mais, para envolver o leitor leigo nas histórias. Aliás, penso que é o que está faltando na Arqueologia. Obras que traduzam o sentido da aventura e do romantismo da Arqueologia como forma de envolver o leigo, para que entenda a necessidade da preservação. Filmes vendem (apesar dos exageros da ficção) e por que não livros? Livros que possam envolver não apenas os adultos, mas também as crianças?
Pra nós arqueólogos, é gratificante levar à cabo um empreendimento, tendo crianças envolvidas e, por incrível que possa parecer, ensinando os adultos sobre a importância do processo. Foi assim em Socorro - SP, durante nossas escavações em uma indústria lítica. Via crianças empolgadas contando-nos histórias, colaborando e sentindo-se importantes e extasiadas por conhecer a pré-história da sua região, e com os pais, tios, e trabalhadores da fazenda a tiracolo.
Projetos dessa natureza devem ser levados adiante pelos arqueólogos. Tenho certeza que vale a pena.
A historiadora Tami Coelho Ocar é da mesma opinião.
Como ela colocou, a minha “’re-renovação’ da escrita acadêmica arqueológica é admirável! É irônico como muitos de nossos mestres, quando jovens, justamente se atraíram pela Arqueologia (e outras ciências, eu sou da geração do Beakman) por conta de literatura fantástica e filmes. E o quanto esses mesmos mestres se afastaram e brigam para afastar a sociedade dessa mesma linguagem. Ora, porque não podemos dialogar das duas formas!?
”Aliás, ela mesma teve experiência com crianças. Um projeto maravilhoso na Escola do Sítio, de Campinas-SP.
Na prática, fósseis artificiais eram enterrados e a partir daí, as crianças, como verdadeiras arqueólogas, sob a orientação da mestra Tami, desenvolviam todo o trabalho, incluindo a escavação e conservação. “E a emoção do brilho nos olhos das crianças, ensinando os adultos, é indescritível”. Da mesma forma, Tami Ocar também já teve experiências com Mediações Patrimoniais com idosos, seguindo uma linha mais lúdica, e o resultado foi igualmente satisfatório.
Vale a pena conferir.
(Omar Carline Bueno)