O setor de transporte e a mobilidade elétrica¹

O setor de transporte e a mobilidade elétrica¹

Nivalde de Castro²

Nuno Miguel Pereira Pinto³

O setor de transporte terá um papel decisivo para a redução do aquecimento

global. Segundo dados a Agência Internacional de Energia (IEA), ele é

responsável por quase um quarto das emissões diretas de CO2 mundiais, sendo

superado somente pelo setor de geração de energia elétrica.

A indústria automobilística, espinha dorsal do setor de transporte, possui uma

base produtiva de grande complexidade, com uma cadeia produtiva

diversificada, e está estruturada em oligopólio mundial. Sua dinâmica

competitiva está centrada em dois principais vetores: (i) inovações tecnológicas

que buscam diferenciar produtos e (ii) marketing que tentam atrair os

consumidores.

Dentro da dinâmica do processo de transição energética, cujo principal driver é a

descarbonização, a indústria automobilística mundial já definiu a sua estratégia:

veículos elétricos (VEs). A produção está crescendo a taxas muito elevadas, tendo

o estoque ultrapassado, em 2018, os 5 milhões de VEs. Os anúncios de novos

modelos e de datas para o fim da produção de veículos à combustão são cada dia

mais comuns, refletindo a dinâmica concorrencial desta industrial globalizada.

No entanto, para que os VEs tenham uma difusão consistente, será necessária

uma verdadeira metamorfose na mobilidade dos transportes, algo análogo ao

que se passou no setor de comunicações com a transição da telefonia fixa aos

smartphones.

Tomando-se somente a questão da construção das redes de infraestrutura de

carregamento, desafios terão que ser enfrentados e superados, entre outros como

a homologação dos equipamentos e das normas de segurança, definições quanto

o acesso às redes de distribuição, o padrão das conexões, a estrutura das tarifas.

Nesta direção, políticas públicas serão importantes para acelerar a difusão dos

VEs, como, por exemplo, a isenção de impostos na compra dos veículos (sempre

com prazos e etapas bem definidas) e a prioridade de estacionamento e de

circulação em centros urbanos. Destaca-se que esta realidade já é bem presente

nos países com maiores taxas de penetração de VEs, como a Noruega e a China.

No Brasil, diferentemente do que ocorre no mundo, cerca de metade das emissões

de gases de efeito estufa é oriunda do setor de transporte, dado que o setor de

geração de energia elétrica possui uma das mais eficientes matrizes em termos

de fontes renováveis, com mais de 80%, enquanto que a média mundial é pouco

superior a 20%. Neste requisito o Brasil é campeão mundial.

Desta forma, a mobilidade elétrica no Brasil deve e tem que receber prioridade

das ações públicas e as agências reguladoras podem desempenhar um papel

estratégico. Podem-se citar dois exemplos desta importância e de seus efeitos

positivos.

O primeiro está relacionado à ANEEL. Em 2019, no âmbito do Programa de P&D,

foi realizada uma chamada pública para projetos de mobilidade elétrica. Foram

definidos alguns critérios, sendo dois deles merecem destaque: (i) os projetos

terão que criar novos produtos e processos para o mercado, induzindo, assim, a

difusão de inovações tecnológicas neste novo mercado; e (ii) os projetos deveriam

ser estruturados em rede de inovação, incluindo empresas de fora do setor

elétrico aportando, no mínimo, 10% do total dos investimentos. Como resultado,

foram aprovados 34 projetos envolvendo os principais grupos do setor elétrico,

como, por exemplo, EDP, CPFL, Neoenergia e Light, totalizando cerca de R$ 500

milhões em investimentos, dos quais R$ 80 milhões eram de fora do setor. O

grande destaque foi a adesão da indústria automobilística, com a participação de

VW, MAN, Audi e Porsche, e da indústria de bens de capital, com Siemens e

ABB.

O segundo exemplo refere-se à ARTESP, agência de regulação de transporte de

SP, que incluiu uma inovação regulatória na última licitação de concessão de

rodovia estadual, o Programa de Carbono Neutro. A concessionária vencedora

assumiu o compromisso de zerar as emissões de gases de efeito estufa nas suas

atividades de operação, que incluem inspeção, guincho, incidentes, ambulância,

praças de pedágio, etc. A partir de um inventário de emissões, a concessionária

terá que fazer as compensações através de reflorestamento, compra de crédito

carbono ou mecanismos de desenvolvimento limpo. Com base nesta experiência

inovadora da ARTESP, podem-se prever, por exemplo, para o futuro

compensações mais direcionadas, como incentivos e parcerias de outros agentes

para a instalação de eletro postos. A redução das emissões de carbono de VEs dos

usuários das rodovias poderiam compensar as emissões da concessionária.

Em suma, um mundo novo abre-se para a mobilidade elétrica no Brasil,

estimulando a criatividade e criando oportunidades de novos negócios que

contribuem para a sustentabilidade ambiental. Neste sentido, caminha-se, sem

dúvida, para uma metamorfose mundial, que se tornará cada vez mais

eletrificado.

¹ Este artigo foi publicado pelo Serviço de informação Broadcast da Agência Estado de São Paulo em 4 de março de 2020.

²Professor do Instituto de Economia da UFRJ e coordenador do GESEL – Grupo de Estudos do Setor Elétrico.

³Gestor de Produtos e Serviços EDP - Mobilidade Elétrica.

Marlon Teixeira

Regional Sales Manager | Senior Energy Commercial Coordinator | Business Development | Sales and Partnerships | Innovation @Raizen

4 a

Muito bom NUNO! Parabéns pelo material completo contendo informações de como o tema tem se desdobrado no mundo e, o quão importante ele também é para o Brasil em vista da descarbonização!

Ana Luisa Orsolini

Consultant | Renewable Energies | Sustainability | ESG

4 a

O que você acha do projeto de lei que quer proibir carros a combustíveis fósseis no Brasil até 2040? Acha que o Brasil consegue cumprir essa meta?

Ana Rita Bibá Gomes de Almeida

CIPM | CDPO BR | Advogada at Opice Blum Advogados Associados

4 a

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