O TOC pode ser usado no lugar da análise de DQO?
Olá meus amigos! Esta semana trazemos para vocês uma leitura bastante interessante. É uma tradução livre do artigo chamado “Substituição de DQO por TOC no monitoramento da performance de tratamento de esgoto, a fim de minimizar a produção de lixo tóxico”, publicado em 2010 pela revista Journal of Environmental Science and Health, Part A. Boa leitura!
Introdução
O teste de demanda bioquímica de oxigênio (DBO5) tem sido tradicionalmente utilizado na análise de esgoto, mas devido a problemas de repetibilidade e inibição por íons e outros compostos, é frequentemente substituído pelo teste de demanda química de oxigênio (DQO) para monitoramento, design, modelagem e análise operacional. O teste de DBO5 requer incubação de 5 dias, enquanto os resultados de DQO são adquiridos no mesmo dia. Além disso, a DQO não é afetada pela presença de substâncias tóxicas, desta forma atinge melhor precisão e confiabilidade, apesar do cloro ter potencial para interferir no resultado quando em altas concentrações.
Por outro lado, uma grande desvantagem do uso do teste de DQO é a produção de compostos perigosos, incluindo mercúrio, cromo hexavalente, ácido sulfúrico, prata, entre outros. Isso faz com que seja necessária a coleta de todo o material perigoso para correta disposição. Nos EUA, isso é regulado pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), sob o Ato de Conservação e Recuperação de Recursos, com os regulamentos de descarte listados no 40 Código dos Regulamentos Federais de Proteção do Meio Ambiente, Partes 260 a 280. Embora haja muito interesse em desenvolver métodos mais limpos para o teste de DQO, como a reflectância de infravermelho próximo ou com eletrodos de cobre, a necessidade de eliminar as fontes de resíduos tóxicos nos laboratórios analíticos, associado ao custo do descarte, resultou em um grande interesse no uso de alternativas ao método, que não usem e nem gerem compostos tóxicos.
O carbono orgânico total (TOC) é uma alternativa potencial tanto para o teste de DQO quanto para DBO5, além de ter a vantagem de ser mais rápido e potencialmente mais preciso. Apesar de a possibilidade de substituição já ter sido previamente considerada, métodos de detecção mais precisos foram desenvolvidos, fazendo com que o teste se torne ainda mais confiável, especialmente para materiais mais complexos, como efluentes industriais. Contudo, pouca pesquisa tem sido publicada sobre a possibilidade de substituição do teste de DQO pelo TOC em análises de esgoto, especialmente para caracterização e análises de rotina em esgoto doméstico e municipal.
O objetivo deste estudo é avaliar se o TOC medido usando uma oxidação termo catalítica de alta precisão, com um analisador de TOC de alta temperatura, pode ser usado como alternativa ao método de DQO para monitoramento de esgotos domésticos. Isso foi realizado analisando a relação entre TOC, DQO e BOD5 do esgoto afluente decantado e do efluente final de uma grande variedade de plantas de tratamento de esgoto doméstico e municipal.
Material e métodos
O afluente decantado e o efluente final foram coletados de 11 plantas de tratamento na área da grande Dublin, Irlanda. No total foram 2 sistemas de reatores em batelada sequenciais, 3 sistemas de plug flow convencionais, 3 sistemas de mistura completa e 3 unidades de aeração estendida. A maior planta estudada no trabalho foi a de Ringsend, em Dublin, com um equivalente populacional (EP) de 1.9 milhões, responsável pelo tratamento do esgoto municipal (60% doméstico e 40% industrial). As coletas de esgoto decantado primário e efluente final foram realizadas em cada planta entre maio e agosto de 2008.
As amostras foram mantidas a 4ºC e analisadas dentro de poucas horas da coleta (< 3h). A DBO5 foi mensurada respirometricamente usando o método Oxitop com 2 réplicas, para análise estatística. A nitrificação foi suprimida pela adição de alitiouréia em concentração de 0,5 mg/L. A DQO foi mensurada utilizando o método de redução do dicromato em frascos de DQO Hach®. O TOC foi medido com uso de oxidação termo catalítica de alta precisão, com um analisador de TOC de alta temperatura (Modelo TOC - 5000A, Shimadzu, Japan). Adicionalmente, tem sido argumentado que na presença de sólidos suspensos a medição de TOC, por ter pequeno volume de amostra, pode apresentar um erro analítico considerável. Para evitar problemas relacionado à distribuição desigual de sólidos suspensos, as amostras foram homogeneizadas antes da realização dos testes, para garantir que não houvessem partículas visíveis presentes, além de limitar o tamanho das mesmas a 200 µm, permitindo acesso livre da amostra até o analisador de TOC. As análises de DQO e TOC foram realizadas com 2 e 6 réplicas, respectivamente.
Resultados e Discussão
As médias de afluente e efluente das 11 plantas foram comparadas utilizando o coeficiente de correlação de Pearson, a fim de identificar a relação entre DBO5, DQO e TOC. Os dados individuais não são mostrados nas figuras 1 e 2, uma vez que resultariam apenas em áreas compactas de pontos individuais. Para contornar esta questão, os limites de confiança de 95% para os eixos x e y foram fornecidos. Uma análise de regressão foi realizada para obter equações preditivas de DQO e DBO5 a partir do TOC (tabela 1).
Relação entre DBO5 e DQO
A relação entre DBO5 e DQO foi usada como controle no estudo, permitindo uma comparação direta com outros trabalhos publicados, além de indicar qualquer possível inibição destes parâmetros. No estudo, uma forte correlação foi encontrada para o afluente, mas não para o efluente final. A DQO é sempre superior a DBO5, uma vez que engloba compostos tanto quimicamente quanto biologicamente oxidáveis. Desta forma, a razão entre DQO:DBO5 é capaz de prover uma indicação simples da proporção da matéria orgânica presente no esgoto que pode ser biodegradada, apesar de que alguns polissacarídeos só podem ser degradados anaerobicamente e, portanto, não são incluídos na estimativa de DBO5.
Aziz e Tebbutt descobriram que a razão DQO:DBO5 normalmente varia de 1.25-2.50 para o esgoto afluente, mas que aumenta após cada etapa do tratamento biológico, uma vez que a fração biodegradável é oxidada, levando a um aumento na proporção do material não biodegradável, que ainda é medido pelo teste de DQO. Ademoroti desenvolveu um modelo genérico para prever a DQO com base na DBO5 para afluentes domésticos:
DQO = 1.64∗DBO5 + 11.36 (1)
que se assemelha muito com a equação preditiva estabelecida para os 11 afluentes deste estudo:
DQO = 1.65∗DBO5 + 30.3 (2)
Uma relação significativa não foi encontrada para o efluente final, como já era esperado, devido a variabilidade de eficiência do tratamento biológico. Apesar de ter sido suprimida neste trabalho, é importante salientar que a possível nitrificação também é capaz de influenciar o resultado do teste.
Relação da DBO5 e TOC
A correlação entre DBO5 e TOC para o afluente é altamente significativa, com uma forte relação linear (P < 0.001) (Figura 1) e com a intersecção de 23.7 não significativamente diferente de zero (P > 0.05). A análise de ANOVA revelou que 92,8% das variações são explicadas pela regressão. A inclinação (1.68 ± 0.375) e, portanto, a razão DBO5:TOC estão em acordo com a razão de 1,62 para esgoto doméstico proposto por Eckenfelder. Embora Aziz e Tebbutt não tenham observado correlação significante entre DBO5 e TOC, eles reportaram uma razão de 1,44 para o afluente, o que está dentro da variação encontrada neste trabalho.
A forte correlação com a DBO5 confirma que o TOC pode ser usado de forma confiável para medir a carga do esgoto doméstico e municipal. Comparando o intervalo de predição de ±35.66 mg L−1 com os valores atingidos pela DBO5, que variaram entre 75 a 280 mg L−1, pode ser visto que uma boa estimativa foi obtida usando a equação de predição, calculada com base nos dados disponíveis.
Em contraste com a forte relação dos parâmetros observada no afluente, nenhuma correlação significativa foi encontrada para os dados do efluente (figura 1). Este resultado está em concordância com as descobertas de Aziz e Tebbutt, e de Rene e Saidutta, que encontraram apenas correlações fracas ou não significativas entre DBO5 e TOC do efluente final. Assim como DQO:DBO5, a razão DBO5:TOC diminui durante o tratamento biológico, devido ao acúmulo de matéria orgânica recalcitrante. Quando diferentes plantas são consideradas em conjunto, então não há observação de qualquer relação entre DBO5 e TOC para o efluente final, devido a variabilidade no tratamento de cada uma.
Relação DQO com TOC
Há correlação altamente significativa entre DQO e TOC (P < 0.001) tanto para o afluente, quanto para o efluente final (P < 0.01) (Tabela 1). Enquanto a inclinação (3.0) é altamente significativa (P < 0.001), a intersecção (49,2) não é significativamente diferente de 0 (P > 0.05). A análise de ANOVA revelou que 92% da variação é explicada pela regressão. A inclinação para a equação de regressão do efluente final é 2.99 e altamente significante, enquanto que a intersecção mais uma vez não foi significativamente diferente de 0 (P > 0.05). Nesse caso, a regressão explica apenas 67,2% da variação. O alto coeficiente de correlação do afluente contrasta com o reportado por Aziz e Tebbutt, enquanto que Hill e Spiegel encontraram correlação significativa apenas para alguns conjuntos de dados.
A forte relação linear entre TOC e DQO suporta o potencial de seu uso como método alternativo à DQO no monitoramento de performance de processos no tratamento de efluentes. O intervalo de predição para DQO, tanto para afluente quanto para efluente, derivados das medições de TOC são ± 67.3 e ± 14.0 mg L−1, respectivamente (Figura 2). A variação do coeficiente de inclinação para o efluente final revela uma menor variação, de 3.00 ±0,708, que inclui a razão de 3,63 observada por Aziz e Tebbutt.
Eckenfelder registrou razões de DQO:TOC de 4,15 para esgoto bruto e 2,2 para o efluente, o que sugere que, assim como a razão DQO:DBO5, as variações das razões estão relacionadas com a qualidade do esgoto e com o grau de tratamento. Por outro lado, como a DQO e o TOC não diferenciam entre as frações orgânicas biodegradáveis e não biodegradáveis, em teoria a razão DQO:TOC não deveria ser alterada pela composição do esgoto e nem pelo tratamento. Isso é suportado pelo presente estudo, que não encontrou diferença significativa (P > 0,05) entre a inclinação do afluente (3,00) e do efluente final (2,99) obtidos através das análises de regressão.
Este trabalho demonstrou que o uso de TOC como substituto da DQO é possível tanto para o afluente, quanto para o efluente final. A variação encontrada é esperada, uma vez que tanto DBO5 quanto DQO são medidas de consumo de oxigênio, enquanto que o TOC analisa diretamente a quantidade de átomos de carbono presentes na fração orgânica. Estudos anteriores demonstraram que estas variações podem ser reduzidas através do estabelecimento de equações preditivas para fontes específicas de esgoto e de tratamento, o que foi confirmado por este estudo. Por outro lado, como o déficit de oxigênio no ambiente aquático é a principal preocupação das análises de qualidade de água, é aconselhável que isso seja medido diretamente através da DBO5 e DQO. Já para análises de performance comparativa rotineira do esgoto afluente e efluente final, a DQO pode ser substituída pelo TOC, levando a uma medição mais precisa e sem a produção de compostos tóxicos a serem descartados.
Conclusão
Há uma significativa relação entre DBO5, DQO e TOC para o afluente doméstico e municipal. Para o efluente final, uma forte correlação foi observada entre DQO e TOC, mas não entre DBO5 e TOC. O estudo então conclui que para o monitoramento da performance de tratamento, a substituição da DQO pelo TOC pode ser realizada com segurança.
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5 aKarolayne Francisco
Técnico e Bacharel em Química | Especialização em Gestão e controle da Qualidade | Pós graduada em Engenharia de Produção | Coordenadora de fábrica | PCP
5 aAline Rodrigues Vieira olha que interessante.
Scrum Master CSM® KMP | Agile Master | Kanban | MGMT 3.0 | SAFe | Product Manager | Agilista | Facilitação | Azure DevOps
5 aJá tinha discutido com um colega de trabalho sobre o tema, agora tirou minha dúvida. Obrigado por postar.
Supervisor Administrativo | EuroChem
5 aRenato B. Binotti A. de Araujo