O “x” da questão!

O “x” da questão!

Por Gláucio Bezerra Brandão (Publicado originalmente em 30/09/20)

Dia desses, caminhando sob a luz solar e olhando para algumas lojas do varejo “alecriano” natalense (acho que é assim que se denominam os estabelecimentos pertences ao nosso Alecrim, equivalente do bairro paulistano de Santa Efigênia), me veio à mente o livro Crossing the Chasm (Atravessando o Abismo) de Geoffrey Moore, baseado na Lei de Difusão da Inovação do professor Everett Rogers, sobre a qual conversamos em Te pego ali na curva!

Trago de lá este trecho: “A tese de G. A. Moore assenta na ideia que a taxa da difusão no ciclo de vida da adoção de tecnologias não é contínuo nos mercados de alta tecnologia. Moore argumenta que existe um abismo entre os consumidores que adoptam o produto bem cedo (early adopters) – entusiastas e visionários da tecnologia – e a maioria inicial (os pragmáticos). Isto porque os visionários e os pragmáticos têm expectativas bem diferentes. Moore expõe estas diferenças e sugere técnicas para atravessar o abismo, incluindo escolher um mercado alvo, compreender a noção do “produto total”, posicionamento do produto, estratégia de Marketing, escolha do canal de distribuição e preços apropriados”. (Wikipedia).

O que me fez lembrar o Chasm (abismo) e, simultaneamente, traçar o paralelo Produto x Cliente (PxC) & Universidade x Mercado (UxM), foi exatamente a questão: como essas coisas se encontram (P encontra C ) ou se encaixam (U se encaixa a M). E aí me dei conta que o “x” é o abismo.

No caso do PxC, Moore propõe soluções ancoradas em marketing. E no caso da UxM, Universidade e Mercado, seres tão oximoros - complementares e antagônicos ao mesmo tempo -, como resolver o “x” desta questão?

Será este um problema de determinação ou de demonstração, como discutimos em Você já ouviu falar em H.A.?, ou um problema de aversão, como levantei em Inovação: conceito que a Universidade não compreendeu ainda? A solução, eu garanto, aumentaria a adesão da Universidade ao Mercado e, por efeito colateral direto, os benefícios para a Sociedade. Afinal, em meu entender empreendedor, quem não tem acesso ao Mercado está à margem da Sociedade; minha versão mais social deste conceito é a de que um sustenta o outro. Vamos lá então!

Começando por uma equação F***

Em algum dia de 2015, assistindo a uma palestra no YouTube (acho que foi um episódio do TED), vi esta equação plotada por um professor do MIT:

Inovação = Invenção x Comercialização

Peço desculpas pela falta de precisão na referência, pois não sei por onde este vídeo anda. Quero apenas deixar claro que, infelizmente, essa equação F*** (“F” de “top”, naturalmente!) não é minha. Para um aficcionado por equacionar tudo como eu, que tentou até definir uma fórmula para as profissões futuras, bem que poderia ter pensado nessa! Deixa pra lá… Voltemos ao raciocínio.

Observe que a equação MIT (vou chamá-la assim) também tem um “x”. E aí vos pergunto: será que podemos compor um sistema de equações para encontrar a incógnita “x” de UxM? A turma do MIT sabe de algo. Um vídeo produzido pela Endeavor “O Empreendedorismo nas Universidades Brasileiras 2017” fala de dados interessantes. Mostra, por exemplo, que 30.000 empresas fundadas por egressos do MIT estavam ativas em 2014, empregando 4,6 milhões de pessoas e gerando receita anual de U$ 1.9 trilhões (um pouco maior do que o PIB do Brasil de 2015), resultado de uma forte cultura empreendedora entre discentes, docentes e Mercado. Já pensaram no montante de impostos gerados para, por exemplo, programas sociais?

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O Empreendedorismo nas Universidades Brasileiras 2017 (By Endeavor)

Pois bem: já que esta fórmula parece dar certo, vamos tomá-la por exemplo.

A interface

Em Quer que eu desenhe?, falei pra vocês que nosso “cabeção” gosta de padrões e que se eu não conseguir desenhar algo é porque ainda não compreendi bem a ideia. Assim, fiz um desenhinho para vocês, tentando explicar a mim mesmo a equação MIT. Olhem lá para verem como meu cérebro trabalha; eu espero… Ok, vamos lá!

Voltando da figura, pode-se observar que a inovação tem, realmente, duas frentes, o que exigiria dois tipos de mindset: um para operar no oceano vermelho, onde o caos impera e as ideias são os elementos constituintes desse espaço, e o oceano azul, onde as ferramentas majoritárias estão nos domínios da administração e da produção. Sendo bem simplista, no lado da invenção, transforma-se dinheiro em ideias. No lado da comercialização, transformam-se ideias em dinheiro. O que vai dizer se a resultante destes processos é sustentável é, precisamente, produto do esforço de ambos os lados, que será dado pelo (adivinhem quem?) “x” da questão.


O “x”, ou abismo entre os dois meios, é a interface. É exatamente aí onde “as cobras dormem”. Como diria o Dr. Mauricy Motta, meu orientador de Mestrado: “Deus fez os meios; o Diabo a interface”. E, como diria meu filho mais velho, “é onde a ‘bagaça’ impera”.

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Minha versão da equação MIT

Saltando o abismo

A solução não é fácil, por isto é no “x” onde as startups decolam ou morrem. É uma situação binária, de tudo ou nada, onde, ironicamente, terão o direito de estarem quando saltarem da maior das barreiras de entrada, que é a dúvida primordial de não se conhecer ainda.

Posso então dar uma dica algorítmica de como não cair no abismo. Segue:

  1. Além do próprio dono, ninguém investe em sonhos. Só se investe em soluções.
  2. No lado vermelho da minha versão da equação MIT, o que rola são as provas de conceito, o que chamamos de protótipos. Lembre-se do que falei em Modelo de Negócio versus Modelo de Ideia: com protótipos, só o time da startup aprende.
  3. Do lado azul sobrevivem apenas os P2S2 (produto/processo/serviço/startup) que dão retorno. Não há como um protótipo derrubar um produto. Então, a saída está no elemento que mora no “x”, que é…
  4. Construir um MVP (Minimum Viable Product), uma prática da área da administração que consiste em lançar um novo P2S2 com o menor investimento possível, para testar o negócio antes de aportar grandes investimentos. Um MVP é uma versão mínima do produto, apenas com as funcionalidades necessárias para que ele cumpra a função para a qual foi planejado. A partir do MVP testa-se a eficiência do P2S2, sua usabilidade, aceitação no mercado, comparação com a concorrência, entre outras formas de validar. O protótipo me dá uma resposta científica, sobre validação de conceitos. O MVP nos dá a resposta comercial, sobre negócios. Perceberam a diferença?
  5. E a parte mais difícil do MVP, aquela que fecha o algoritmo: você terá de providenciar os meios para arcar com a construção do MVP pois, como falei no primeiro passo deste algoritmo, ninguém compra sonhos. Nesse ponto é onde as startups se perdem também, pois apresentam protótipos e almejam/solicitam investimentos como se já tivessem produtos. Um passo em direção ao abismo. E se um investidor incauto te acompanhar, muito em breve, transformar-se-á em uma agiota sedento. Isso não será bom para ninguém.
  6. Fim de algoritmo.

Finalizando…

A sequência para uma startup ter sucesso acontece nessa ordem: protótipo - MVP - produto. Posso agora responder à indagação colocada lá em cima, sobre o “x” da questão, o qual resolverá o problema do encontro PxC (Produto x Cliente), assim como o de encaixe UxM (Universidade x Mercado).

Para o caso PxC, problema de determinação, uma startup que já está no Mercado terá de bancar seu próprio MVP. Insistir em investimentos sobre protótipos geram grandes riscos. Garanta que um potencial erro terá lastro para cobertura.

Para a versão UxM, problema de aversão, as incubadoras brasileiras - instrumentos de interface que se dispõem a serem centros de inovação, já que isso só acontece no Mercado - caso queiram realmente ajudar, terão de evoluir, se modificarem e encontrar formas de bancar os MVP’s das startups abrigadas em suas instalações, o que ainda não o fazem. Terão de se transformar em um misto de incubadora-aceleradora, ou continuarão fazendo de conta que ajudam seus empreendedores. Já as suas startups, apresentando apenas protótipos nos palcos da vida, figurarão mais como stand-ups, já que, via de regra, são raros os aportes por parte do Mercado em protótipos saídos de incubadoras nacionais. Claro que exceções existem.

Em ambos os casos (PxC e UxM) o “x” da questão é o MVP. O MIT, que é uma universidade, é especialista nisto. Só se sobrevoa o abismo abordo de MVP’s. Os protótipos, assim como as asas na lenda de Ícaro, não aguentarão muito sob o sol alecriano: a queda será iminente!

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André Lage-Freitas

Associate Professor @ UFAL | Head of Innovation @ Code 55 | PhD | AI Consulting

1 a

Texto espetacular, Gláucio Bezerra Brandão, obrigado! É incrível como o Ponto 5 do seu algoritmo ainda é ignorado por muita gente. E se as incubadoras focarem SOMENTE em auxiliar na validação dos MVPs com excelência, já tá ótimo! Não precisam fazer quase mais nada. P.s. Sobre sua frase "O protótipo me dá uma resposta científica, sobre validação de conceitos. O MVP nos dá a resposta comercial, sobre negócios. Perceberam a diferença?", tomo a liberdade de acrescentar que o empirismo está presente em ambas validações científica e comercial. Eu acho isso simplesmente maravilhoso. Cc Henrique Otte Márcio Rabelo BRUNO ALMEIDA Daniel Prates Rivas

Nélis Júnior

Bacharelando em C&T e Negócios Tecnológicos | Estagiário DATAPREV | DIO Campus Expert

1 a

Gláucio Bezerra Brandão... Eu lendo seu texto: 🤔😵💫🥺😮💨😬🤯💩🤩😌🤤🥲🤐 Sentindo emoções num estado de superposição... E tem os memes vindo a mente para descrever cada um desses estados.

José Ivan Sá

Engenheiro de Projetos Estratégicos na Neoenergia | Project Manager | Prosci®

1 a

Excelente reflexão professor Gláucio! E na minha opinião, não adianta ser um MVP de bancada, o protótipo precisa “apanhar” nas condições reais e práticas do mercado. Dor x Solução (DxS)

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