Observando o invisível: o Microscópio Eletrônico de Transmissão
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Observando o invisível: o Microscópio Eletrônico de Transmissão

Nesses tempos de pandemia, os noticiários, as redes socias entre outros sites na internet vem sendo tomados por imagens mostrando o coronavírus. Você já parou para pensar como os cientistas conseguem descobrir a forma de um vírus que é menor que o comprimento de onda da luz visível? Nesse texto, vou falar um pouco sobre a Microscopia Eletrônica de Transmissão, uma das ferramentas mais importantes no estudo de materiais nanométricos.

Quando cientistas europeus do século XVII, como Robert Hooke e Antonie van Leeuwenhoek, observaram estruturas biológicas sob as lentes dos recém criados microscópios, um mundo completamente novo se abriu. Pela primeira vez foram visualizadas estruturas microscópicas dos seres vivos, como parede celular, glóbulos vermelhos e espermatozóides. Com o desenvolvimento tecnológico, lentes cada vez mais perfeitas puderam ser produzidas, melhorando a resolução e permitindo a visualização de detalhes jamais antes vistos. Entretanto, essa melhoria estava limitada a um aspecto fisicamente intrínseco aos microscópios: o limite de difração.

O limite de difração foi descoberto por Ernst Abbe, em 1873. Ele descobriu que o limite de resolução de um microscópio óptico é diretamente proporcional ao comprimento de onda da luz e inversamente proporcional à abertura numérica do microscópio. Considerando que a luz verde possui comprimento de onda de 550 nanometros e que os microscópios modernos possuem abertura numérica em torno de 1.4, a resolução dos microscópios ópticos fica limitada a aproximadamente 200 nanometros. Essa resolução é boa o suficiente para a visualização de células e contornos de grão de materiais inorgânicos, porém é insuficiente para visualização de vírus e nanoestruturas. Começou então uma busca pelo uso de radiações eletromagnéticas de menor comprimento de onda, como raios ultravioleta e raios-x. Porém, isso esbarrava em dificuldades como a degradação das estruturas biológicas e a falta de contraste das mesmas quando expostas aos raios-x. A necessidade de outra alternativa era cada vez mais evidente.

Até que em 1928, pesquisadores da Universidade Tecnológica de Berlim, Alemanha, começaram a trabalhar no desenvolvimento de um microscópio que empregava elétrons ao invés da luz e lentes magnéticas em substituição às lentes de vidro. Em 1931, o grupo liderado pelos pequisadores Max Knoll and Ernst Ruska fez a primeira demonstração do funcionamento do Microscópio Eletrônico de Transmissão (MET). Dois anos depois, eles conseguiram alcançar uma resolução superior à do microscópio óptico. O invento chamou a atenção da indústria e em 1939 já havia modelos de METs disponíveis para comercialização. Ruska foi agraciado com o Prêmio Nobel de Física de 1986, pelo seu trabalho em óptica eletrônica e pelo desenvolvimento do MET.

Mas como funciona um Microscópio Eletrônico de Transmissão? Basicamente, de maneira semelhante ao microscópio óptico, porém ao invés de luz, se usam elétrons acelerados que, de acordo com as leis da mecânica quântica, possuem comprimento de onda muito inferior ao da luz visível, expandindo os limites da resolução. No topo do microscópio, há uma fonte de elétrons, um filamento de tungstênio, assim como o das lâmpadas (existem fontes mais modernas, mas vou ficar com esse exemplo mais didático). Quando uma corrente elétrica de alta intensidade passa por esse filamento, alguns elétrons são ejetados. Esses elétrons são conduzidos por uma coluna cilíndrica vertical sob vácuo, com uma alta diferença de potencial entre suas extremidades (entre 100 e 200 mil Volts!). Esses elétrons passam por lentes magnéticas, que realizam um trabalho análogo ao das lentes ópticas. O feixe de elétrons é transmitido (daí o nome transmissão) através da amostra, passa por um novo conjunto de lentes magnéticas para finalmente formar uma imagem no plano de um filme fotográfico. Nos primeiros aparelhos, a obtenção das imagens era possível somente após a revelação dos filmes, porém com o desenvolvimento das câmeras digitais, é possível obter a imagem em tempo real no computador. Essas imagens são formadas pelo contraste entre os elétrons passam através da amostra e os que colidem com ela e não chegam até o detector no plano de imagem. As regiões do detector que recebem os elétrons vão produzindo tons claros enquanto que aquelas que não recebem mantém os tons escuros. Isso faz com que as imagens produzidas por um MET possuam originalmente apenas tons de cinza. Quando vemos cores, essas foram produzidas artificialmente para facilitar a visualização de uma parte de interesse.

Atualmente, a resolução dos METs é tão alta que é possível visualizar os átomos individualmente em uma nanopartícula. Os desafios dessa técnica agora vão além da resolução, mas sim da obtenção de imagens e filmes em condições comparáveis às suas condições naturais. Ou seja, poder visualizar um nanomaterial na condição em que ele é usado na indústria ou em dispositivos, ou visualizar vírus infectando uma célula em tempo real para avaliar seu comportamento e projetar medicamentos. Uma coisa é certa: o avanço dos METs trará consigo um enorme avanço no conhecimento que possuímos sobre os materiais e os seres vivos, aumentando também nossa capacidade de resolver os problemas que nos afetam. 

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