OKRs como catalisadores da inovação nas empresas: Como alcançar resultados e aprendizados significativos
Os Objetivos e Resultados-Chave (OKRs) são um framework de gestão amplamente adotado pelas empresas para auxiliar no alinhamento estratégico e na mensuração de progresso. No entanto, alguns críticos afirmam que a adoção de OKRs “mata” a inovação e a criatividade nas organizações, por colocar pressão demais na entrega de resultados mensuráveis. Este artigo visa desmistificar essa concepção, demonstrando como OKRs podem, ao contrário, ser catalisadores da inovação.
Os OKRs consistem de um conjunto de objetivos ambiciosos, definidos com base na estratégia da empresa, e vinculados a resultados-chave (KRs) mensuráveis, que são utilizados para avaliar o progresso em direção a esses objetivos dentro do período de controle. Bons KRs, entretanto, de forma geral não representam entregas ou projetos, ou metas atreladas a remuneração variável, mas são representações tangíveis de resultados relevantes para a empresa.
Ao contrário do que algumas pessoas pensam, os OKRs não se limitam a resultados de negócio tradicionais, como aumento de receita ou redução de custos. Estes são indicadores de saúde, certamente devem ser controlados em fóruns ligados à rotina, mas, salvo em situações específicas, não são sequer bons candidatos a resultados chaves. A definição dos Key Results deve considerar quais são as principais alavancas para o atingimento dos objetivos selecionados, e na maioria das vezes a forma como essas alavancas serão mobilizadas é razoavelmente desconhecida para a empresa. Por essa razão, bons KRs incluem aprendizados e novas formas de atuação que podem levar à transformação da empresa.
Incorporar aprendizados como outcomes desejáveis permite que as equipes se concentrem não apenas em entregar resultados tangíveis, mas também em adquirir conhecimentos valiosos que impulsionem a melhoria contínua e a inovação. Isso cria uma cultura organizacional mais receptiva a mudanças, experimentação e crescimento sustentável.
De acordo com o nível de aprendizados necessários para a mobilização dos KRs, estes podem ser classificados como predominantemente ligados a Discovery (formas de atuação predominantemente desconhecidas) ou a Delivery (formas de mobilização conhecidas, porém grande necessidade de foco da organização).
Uma indústria de grande porte do setor alimentício, com múltiplas fábricas distribuídas pelo Brasil e América Latina, atendida pela consultoria K21, por exemplo, apresentou uma gradual migração de KRs predominantemente de projeto e delivery, para um mix mais balanceado, com maior participação de métricas ligadas a impacto para o cliente e para experimentação. Esse movimento levou a uma redução significativa da sobreposição entre a governança de OKRs e a governança pré-existente para a gestão da rotina (BAU: “business-as-usual”). Além disso, experimentos para identificar as principais causas raízes de suas limitações foram realizados, trazendo aprendizados e evidenciando novas soluções potenciais.
Uma combinação poderosa desses KRs predominantemente de Discovery com as técnicas de fatiamento e priorização permitiram rapidamente identificar as melhores formas escaláveis de se atingir os objetivos, e com isso o tempo necessário para essa implementação foram reduzidos.
KRs de discovery estão focados na busca por novas oportunidades, aprendizado e inovação. Esses KRs são projetados para estimular a experimentação, o pensamento criativo e a resolução de problemas complexos. Eles servem como guias para a transformação da empresa, ajudando a direcionar a criação das perguntas certas.
Transformando perguntas em hipóteses e promovendo a inovação
KRs de discovery incentivam as equipes a gerar perguntas relevantes, que possam ser por sua vez transformadas em hipóteses a serem priorizadas e testadas em ciclos curtos. Essas perguntas podem abordar desafios do mercado, necessidades dos clientes, oportunidades de aplicação de novas tecnologias ou melhorias nos processos internos.
Por exemplo: o primeiro passo para se estabelecer uma hipótese em torno de um problema de negócio ligado à monetização de oportunidades nessa indústria alimentícia pode ser criar perguntas como:
Perguntas como essa, estimuladas pelos OKRs, podem ser transformadas em hipóteses mais específicas que possam ser submetidas a experimentos e testes. Isso permite que as equipes aprendam rapidamente com os resultados e ajustem suas abordagens conforme necessário. Com cada check-in de OKR, novos conhecimentos são adquiridos e compartilhados. A multidisciplinaridade presente no check-in traz uma visão de múltiplos pontos de vista, e as equipes se coordenam em novas reuniões de trabalho e iniciativas. Em face de algum aprendizado relevante, os líderes de OKRs redirecionam os esforços para o próximo período, garantindo que o processo de inovação seja contínuo e adaptável às mudanças do mercado e das necessidades dos clientes, e às novas oportunidades identificadas.
"Curto prazo" ou "ciclos curtos"? Isso não mata a inovação?
O ciclo de execução de OKRs depende do nível que estamos considerando: OKRs estratégicos geralmente possuem ciclos de 1 ano, e OKRs táticos, que lidam com problemas mais específicos que dificultam o atingimento dos estratégicos, de 3 meses. Alguns críticos dos OKRs entendem que, como estamos falando de “curto prazo”, não existe tempo suficiente para se pensar em algo realmente inovador.
A priorização das hipóteses e experimentos em fatias finas, que permitam conclusões rápidas, e a utilização de métricas intermediárias, são a chave para se conseguir alto impacto.
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Em uma empresa de eletroportáteis, buscava-se desenvolver uma tecnologia de comutação automática de tensão para potências elevadas. Para isso, criou-se um backlog priorizado de perguntas, respondidas em ciclos de 15 dias. Inicialmente, as questões abordavam o estado da arte, investigando artigos e patentes relacionados à tecnologia em diferentes segmentos industriais e os conceitos científicos e tecnológicos por trás de cada solução.
Após selecionar as referências mais relevantes, o foco mudou para as limitações das soluções existentes e como elas não atendiam às necessidades da empresa. Aspectos como confiabilidade, riscos técnicos, parâmetros de projeto.
O passo seguinte envolveu experimentação, sem descartar rapidamente soluções aparentemente complexas. A equipe buscou criar provas de conceito simples e rápidas, aplicáveis ao contexto da empresa, mesmo sem limitações de tamanho ou custo. Como resultado, foram desenvolvidas três soluções distintas e eficazes.
Com as novas soluções, surgiram perguntas adicionais, como a confiabilidade, otimização do circuito, disponibilidade de componentes pequenos e custos associados. Também foram consideradas dificuldades relacionadas aos processos industriais e suprimento de componentes.
Foram então produzidos novos protótipos, mais próximos do uso real, e testados quanto à estabilidade e riscos. Somente após a satisfação da equipe com o projeto técnico, uma matriz de comparação foi elaborada para avaliar as alternativas de solução. O desenvolvimento foi concluído após aproximadamente três meses.
É importante destacar que esse trabalho teve início após seis meses de tentativas frustradas de terceirização com fornecedores internacionais e acadêmicos brasileiros renomados. Os protótipos desenvolvidos externamente apresentavam falhas graves de segurança e potencial violação de patentes. No entanto, o desenvolvimento interno não enfrentou esses problemas, graças à estratégia de fatiamento, priorização, e ciclos curtos de teste e aprendizado.
Criando uma cultura de inovação
A adoção efetiva de OKRs com foco na inovação e no aprendizado ajuda a criar uma cultura organizacional mais aberta à experimentação e à descoberta. Isso permite que as equipes se sintam mais confiantes e apoiadas em suas iniciativas de inovação, sabendo que a empresa valoriza não apenas os resultados tangíveis, mas também os aprendizados adquiridos ao longo do processo.
A utilização de KRs de discovery também auxilia na criação de um ambiente colaborativo, onde equipes de diferentes áreas da empresa trabalham juntas para resolver problemas complexos e alcançar objetivos compartilhados. Essa colaboração interdisciplinar fomenta a inovação e o crescimento, permitindo que a organização se adapte e evolua constantemente.
Por outro lado, a vinculação dos resultados de OKRs à remuneração variável pode levar os colaboradores a se concentrarem mais em entregas e iniciativas de baixo risco, em vez de buscar inovação. Essa abordagem pode incentivá-los a optar por metas mais facilmente alcançáveis e ligadas ao delivery, em detrimento da exploração de ideias e soluções inovadoras. Esse foco excessivo em resultados imediatos e tangíveis pode, inadvertidamente, prejudicar a capacidade da organização de se adaptar e crescer no longo prazo.
A ênfase em entregas de baixo risco pode dificultar a inovação, uma vez que os colaboradores tendem a evitar assumir riscos e abraçar a incerteza inerente aos processos inovadores. A inovação, por natureza, exige experimentação e a possibilidade de fracasso. Quando a remuneração variável está atrelada ao cumprimento de OKRs, os profissionais podem preferir "jogar pelo seguro", limitando sua criatividade e a disposição para assumir riscos, o que pode resultar em menos avanços significativos para a empresa.
Conclusão
Contrariando a crença popular, os OKRs podem efetivamente promover a inovação nas empresas ao incluir aprendizados como outcomes desejáveis. Ao diferenciar e adotar KRs ligados a discovery e a delivery, as organizações podem equilibrar as metas de curto e longo prazo, garantindo que a inovação e a melhoria contínua sejam prioridades estratégicas.
KRs predominantemente ligados a discovery ajudam a direcionar a criação das perguntas certas e a transformá-las em hipóteses a serem priorizadas e testadas em períodos curtos. Esse processo ágil e iterativo permite a rápida adaptação às mudanças do mercado e a evolução constante das estratégias, impulsionando a inovação e a competitividade.
Ao adotar OKRs que valorizem tanto resultados de negócio quanto aprendizados, as empresas criam uma cultura de inovação e colaboração, onde os colaboradores se sentem apoiados e encorajados a buscar soluções criativas e transformadoras.
Portanto, os OKRs são uma ferramenta poderosa para impulsionar a inovação nas organizações, desde que sejam utilizados de maneira estratégica e com foco no aprendizado e na transformação contínua.