Oportunidades e ameaças chinesas ao Brasil
Por: Enéias Santos
Não há como abordar qualquer aspecto da economia mundial sem mencionar a China, que protagoniza um crescimento e desenvolvimento econômicos inédito na história mundial. E estas recentes mudanças no cenário geoeconômico certamente impactam o Brasil.
Assim como nosso país, a China é um país terceiro-mundista e enfrenta desafios similares na sua atuação política, econômica, financeira e social. Desta forma, diversas ações tomadas pela China podem ser utilizadas pelo Brasil na sua condução estratégica. Assim como as deliberações que resultaram em fracasso, para que o país não incorra no mesmo erro. Entretanto, é importante destacar que caso não haja uma rápida aplicação e adequação da economia local aos rearranjos globais, o Brasil fica grandemente ameaçado na sua liderança e no acompanhamento do crescimento e desenvolvimento mundiais.
Dentre as oportunidades possíveis, podemos destacar a questão social, pois a China conseguiu um feito bastante relevante: a retirada de 600 milhões de pessoas da situação de pobreza em seu país nas últimas décadas, o que representa 70% da queda da pobreza no mundo. Além disso, parte da sua nova estratégia é o fortalecimento do desenvolvimento interno, inclusive com o crescimento da renda per capita. Outro destaque importante é a geopolítica. A China historicamente tem influência bastante clara na região sino-asiática. Entretanto, expandiu seu poder para outras áreas do globo. Neste sentido, o Brasil acaba tendo uma ameaça, pois está em uma zona de dupla influência: EUA e China. Lembrando que há forte complementaridade entre estas duas economias.
Não há dúvidas de que a China está liderando uma nova revolução industrial e tecnológica atrelada à construção de cadeias globais de valor, por meio da definição de objetivos estratégicos (geoeconômicos e geopolíticos) de curto, médio e longo prazo. O desenvolvimento interno e a projeção externa passam pelas áreas econômica, financeira, política, diplomática e militar. Ou seja, todas as discussões internas levam em conta estas novas diretrizes globais.
A centralização governamental facilita a aplicação de um projeto nacional, dado que as disputas políticas não inviabilizam o cumprimento do acordo firmado. Este é um desafio a países em que a democracia é aplicada com maior liberdade, pois há a possibilidade de reajustes, readequações e distorções praticadas por diferentes grupos políticos em disputa. Este é o caso do Brasil. Há urgente necessidade de firmar-se um pacto nacional entre as diversas correntes ideológicas em prol do estabelecimento sólido da posição do país no mundo.
Por fim, e também decorrente da gestão política peculiar, os altos índices de poupança promovem um ambiente favorável ao investimento chinês. Atualmente, a poupança atinge por volta de 50% do PIB.
Não é necessário mencionar que nem tudo é perfeito no sistema chinês. Há também algumas dificuldades que servem de exemplos a não serem seguidos. O primeiro deles é um conjunto de investimentos em que não se analisou de forma correta o custo-benefício. Em 2014, o país reconheceu que a manutenção da natureza dos investimentos era insustentável. A ameaça de uma grave bolha imobiliária também é uma vulnerabilidade do modelo chinês, dados os maciços investimentos na incorporação imobiliária. Por fim, a China sofre com um alto endividamento dos governos locais, que detém títulos da dívida pública sem lastro confiável. É imprescindível salientar o passivo ambiental preocupante da China.
Todos estes impactos podem ser encarados como oportunidades ao Brasil, para utilizá-los de forma correta na matriz nacional de investimentos.
Outra ameaça ao Brasil se estabelece nas relações comerciais, pois a China exporta produtos de alto valor agregado e tecnologia. Já a exportação brasileira se restringe a itens primários e extrativistas. A Embraer é uma exceção.
O Brasil e a China pertencem ao grupo econômico BRICS – juntamente com Rússia, Índica e África do Sul – que em 2014 criou o Banco de desenvolvimento dos BRICS. Ou seja, mais uma ação de desenvolvimento regional, que é o foco da diplomacia chinesa.
Aliás, a China usa os bancos de desenvolvimento regional para que países dependam menos de suas finanças e para que suas empresas tenham maior garantia econômica. Outro ajuste efetivado foi a migração das reservas de títulos americanos (baixo juros) para ações de infraestrutura (baixo retorno, mas amplia presença e influência chinesa).
Por fim, a China planeja tornar-se um dos líderes mundiais nas indústrias estratégicas emergentes, tais como tecnologia de informação, telefonia móvel, circuitos integrados, novas energias, novos materiais e biomedicina. Tudo isto buscando o crescimento sustentável.
É de suma importância que o Brasil reflita sobre se modelo econômico sob a ótica da nova ordem econômica mundial em que a China tem papel preponderante. É o momento adequado para que as oportunidades promovidas e destacadas possam ser devidamente aproveitadas e absorvidas pela economia brasileira. Por outro lado, o desalinhamento é uma grande ameaça ao Brasil, dado que a China ingressa em uma nova fase de seu desenvolvimento, que promoverá reformas institucionais e novas abordagens econômicas. O Brasil precisa utilizar de forma substantiva e imediata a retomada do crescimento e desenvolvimento econômicos alinhado com o novo contexto global.