Os publicitários estão morrendo. Vida longa aos Publicitários!

Os publicitários estão morrendo. Vida longa aos Publicitários!

Publicitários são uma turma antenada por definição. Ligados em tudo o que é tendência. Publicitário vai pra gringa aluga um carro e acha o máximo poder encher o tanque passando o cartão direto na bomba de combustível, sem precisar “depender" de um atendente. Publicitário detesta ir em agências bancárias. Ferrenhos defensores de aplicativos de bancos, afinal eles são muito mais práticos. Publicitários amavam seus iPods e hoje amam ouvir o Spotify e “chatear” no Whatsapp nos seus iPhones. Publicitário adora o Uber com sua qualidade de serviço e tecnologia disruptiva! Não tinha caído a ficha, mas publicitários adoram também o NetFlix: “Cara, essa sacada de poder ver todos os episódios de House of Cards de uma só vez é duca!”.

Publicitários amam tecnologia. Tecnologia permitiu a essa indústria se re-inventar tantas vezes. A tecnologia facilitou a criação, facilitou a busca por referências (um viva ao Youtube), barateou a produção de tudo, trouxe a turma da internet para dentro das agências, viabilizou a criação de plataformas multimeios. A tecnologia nos trouxe novas categorias de leões em Cannes. E não tem nada que um publicitário ame mais, do que mais Leões!

A tecnologia, especialmente na internet, permitiu que os anunciantes, os veículos e grandes empresas de tecnologia, que hoje são grandes empresas de mídia, identificassem cada usuário. Cada pequeno hábito, cada movimento e cada ação do desavisado navegante são hoje cuidadosa e silenciosamente monitorados. Todos os seus dados são salvos, agrupados, cruzados, extraídos, compilados, comparados e, principalmente, comercializados “ad nauseam” e praticamente sem pudor entre todos os players do mercado.

Hoje, depois de 300 likes, você é mais previsível para o Facebook do que para sua esposa(o).

Muito embora grupos de usuários preocupados com privacidade venham chamando atenção pra isso há anos, no fundo, nunca ninguém deu muita bola. A maior parte das pessoas só passou a perceber isso depois da febre do retarggeting, que são aqueles banners, que parecem te perseguir por toda a internet. No geral as próprias pessoas facilitam a vida dos Googles e Facebooks postando intencional e espontaneamente todas as suas informações na rede. O que é, se você pensar um pouco, algo um tanto “creepy”. Já que ninguém em sã consciência publicaria num mural na frente da sua casa todas as suas fotos, a lista de tudo o que fez, seus restaurantes preferidos, seu histórico de busca, suas opiniões, seus destinos, seu currículo, os seus dados de contato, listas de amigos e muito mais. Ainda mais se considerarmos que esse mural vai durar para sempre e que, mesmo que arranquemos as coisas de lá, elas continuarão disponíveis para quem quiser, a partir de qualquer lugar do mundo.

Hoje, depois de 300 likes, você é mais previsível para o Facebook do que para sua esposa(o). Imagina o que nós do mercado publicitário saberemos sobre você com 30, 40 anos de dados acumulados.

Por isso, era uma questão de tempo para que algumas empresas enxergassem nisso uma oportunidade de ruptura. E assim nasceram e passaram a prosperar tecnologias que bloqueiam anúncios, ou como o novo Tivo Volt, que permitem que você pule todos os comerciais de TV no apertar de um único botão. Tanto é verdade, que hoje mais de 30% dos usuários adultos nos USA já usam “ad blockers”. Traduzindo: é gente pra cacete que não vê mais banners. E isso já está se popularizando mundo afora.

Usuários móveis tem razões adicionais para bloquearem anúncios. O tempo e a banda que a mídia e scripts de trackeamento consomem tornam a experiência de quem navega no celular ainda pior. Para ilustrar, o New York Times publicou um ranking de quanto custa acessar via celular os 50 principais sites de notícias americanos. A campeã, foi a homepage do boston.com. A página demanda 39 segundos para carregar num iPhone 6 em 4G. Desses, apenas 8 segundos são de conteúdo. O restante é mídia. Ou seja, quase 80% do tempo de espera do usuário é para que ele possa ver banners e ser trackeado. E, segundo o NYT, custaria US$9,50 por mês carregar via celular apenas home do boston.com todos os dias. Assim, não é de admirar a resistência que os usuários estão acumulando contra tanta mídia.

Segundo o NYT, custaria US$9,50 por mês carregar via celular apenas home do boston.com todos os dias.

Não é a toa que agora em outubro o Google tenha lançado o “Accelerated Mobile Pages”. Que nada mais é do que um esquema de construção de páginas web mais leves. Não usa nenhuma tecnologia nova, apenas estabelece algumas regras e formas de se construir uma página que não demore 40 segundos para carregar ;-P. Meio óbvio não? Já o IAB, nesse mesmo mês de iluminação generalizada, admite com todas as letras que pisou na bola nos últimos anos exagerando na quantidade de anúncios em detrimento da experiência do usuário. E lança um novo programa sugestivamente chamado de “L.E.A.N. Ads Program”. Tudo muito bonito, mas talvez seja “too little, too late”.

De repente, publicitários estão se vendo do mesmo lado da mesa que os bancários, a indústria da música, as operadoras de celular, os taxistas, as operadoras de cabo e tantas outras categorias que tiveram suas receitas e, por que não dizer, suas próprias existências postas em cheque por tecnologias disruptivas.

Publicitários agora ameaçam a sociedade com frases “Déjà vu” , como as repetidas por taxistas anti-Uber: “Imagine como seria um mundo sem propaganda!”. Não sei você, mas eu imaginei e achei ótimo!

Adapt or Die!

Superando o medo inicial, os chiliques e o hábito de se viver olhando pro próprio umbigo, vamos baixar a guarda e nos permitir imaginar como seria esse novo cenário. Como publicitários e como cidadãos.

Primeiro é tolice achar que as verbas de marketing vão minguar. Que as marcas vão vender menos e que as pessoas vão parar de consumir (o consumismo até vai diminuir, mas isso não pode ser colocado na conta dos ad blockers! Esse é, por si, assunto para outro artigo). A publicidade é o combustível da construção e a sustentação de marcas e, por isso, tem e terá um papel imprescindível. O capitalismo não vai parar de funcionar só porque as pessoas ficaram de saco cheio de propaganda. As verbas de marketing vão continuar existindo e provavelmente até aumentarão. Os investimentos terão de se pulverizar adaptando-se novo cenário, ao novo usuário, cada vez mais cidadão consciente de que toda vez que ele não paga por um produto/serviço, é por que “ele” é o produto comercializado. Assim, a publicidade, no sentido de “tornar conhecido”, vai seguir mais firme do que nunca. Entraremos num círculo virtuoso de inovação, redefinição e busca por novos caminhos. Serão novos formatos, novas tecnologias e novos paradigmas que hoje estamos sendo “cutucados” a imaginar.

Ainda assim, se for para se pensar no que usamos hoje, já é possível fazer tanta coisa que funciona independentemente de “ad blockers”: Conteúdo próprio, ou branded content; parcerias com sites, blogs e veículos; anúncios nativos; merchandising; posts patrocinados, patrocínios; advergames; relacionamento via redes sociais (não simplesmente comprar mídia em redes sociais); Search Engine Marketing entre tantos outros.

As mensagens que cruzarem as barreiras que os consumidores estão criando valerão ainda mais.

E o que é que essas alternativas tem em comum, quando comparadas com simplicidade de se comprar mídia? Elas dão mais trabalho. Dá mais trabalho criar. Dá mais trabalho aprovar. Dá mais trabalho produzir. Dá mais trabalho negociar. Dá mais trabalho mensurar. E vai dar bem mais trabalho ser remunerado para isso. Isso vale para o veículo, para a agência e para o cliente.

Um mundo onde os cidadãos não querem ser interrompidos por propaganda o tempo todo é um mundo onde a inovação, a relevância e a criatividade são ainda mais importantes. As mensagens que cruzarem as barreiras que os consumidores estão criando valerão ainda mais.

Esse é um momento incrível para gente perceber isso. Como agência isso significa não apenas pensar em campanhas fora da caixa, mas muito mais, pensar em modelos de negócio fora da caixa, em novos modelos de remuneração, de formas de se trabalhar verdadeiramente disruptivas e eficazes. Onde não sejamos simplesmente remunerados baseados na nossa capacidade de fazer o cliente gastar dinheiro e sim na nossa competência em fazer nossos clientes ganharem dinheiro. Muitas vezes de formas e de fontes que eles nem imaginavam.

Como cliente isso significa estar aberto a abrir mão de fórmulas que funcionavam bem até a época do seu antecessor. Significa estar disposto a experimentar e também a errar e continuar tentando e errar mais até acertar. Para isso é necessário mudar a cultura interna. Pois a cúpula das empresa precisa estar alinhada. É também buscar parceiros que estejam dispostos a quebrar as regras e criar novos paradigmas. É estar verdadeiramente disposto a fazer junto, a pensar diferente e construir algo melhor. E melhor tem de ser melhor para os dois. Ou melhor para os três, já que a partir de agora o consumidor faz parte do lado de cá da equação.

“One simply cannot fight technology”

É o que a gente tenta fazer aqui todo dia. E é por isso que cada vez mais a própria definição de agência de propaganda vai ser insuficiente. O que o mercado precisará cada vez mais são de parceiros com uma postura de “start-up” no espírito e não só no discurso. Às vezes mais próximos a uma fábrica de apps, outras de incubadora de negócios, ou produtora de conteúdo. Mas sempre com times criativos, pois ainda existem muitas campanhas para serem criadas. É assim que eu gostaria que a gente e o mercado crescesse, multiplicando nosso rol de ferramentas e abordagens. Por que quando você só tem um martelo, todo os seus problemas viram pregos.

Bora criar um mundo novo?

Antes que a gente acorde e ele já esteja pronto. Até por que, como os luditas da revolução industrial e as cooperativas de taxi podem atestar “one simply cannot fight technology”. Não será algo fácil. Mas pelo menos terá muita novidade e será divertido. E publicitários adoram novidades divertidas!

Amei! É isso Leo!! E que os donos das agências e os seus diretores de criação estejam abertos a essa nova maneira de pensar no negócio da nossa querida “ publicidade”.

Parabéns Leonardo Dias, perfeito e profundo, temos que mudar nossa visão publicitaria sem perder as origens essenciais.

Giancarlo Biagini

Branding | CRM | Digital Marketing

9 a

Artigo muito muito bom. Parabéns por compartilhar uma opinião tão bem fundamentada e com tanta propriedade.

Edrei Segecs

Consultor de Processos na Vivo (Telefônica Brasil)

9 a

Que baita artigo, que baita reflexão, e é aí que vamos nos diferenciar, inovar, ouvindo o que essa nova geração que foge da propaganda, para saber como fazer a propaganda estar a frente deles, ou melhor estar lado a lado a eles.

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