Outubro rosa - será que as marcas são rosas de verdade?
Estamos em outubro, mês conhecido pelas inúmeras campanhas de prevenção ao câncer de mama em que prédios ficam iluminados, funcionários de empresas vestem rosa ou promoções são criadas com o tema. Mas algumas dúvidas passam pela minha cabeça. Será que essas ações adicionam valor a marca? Será que as empresas fazem porque apoiam ou porque todos fazem? A causa ganha com essas campanhas? As ações são cotidianas ou temporais? As mulheres e o público conhecem o significado da campanha? Não pretendo responder à todas as perguntas neste artigo, mas sim gerar uma reflexão sobre o tema.
A criação do Outubro Rosa
O mês que já está no calendário de muitas empresas, começou nos Estados Unidos, com várias ações isoladas para a conscientização da doença nos estados americanos. A data ficou registrada após a aprovação do Congresso Nacional americano para tornar-se o mês oficial. A cor rosa, veio do laço criado pela Fundação Susan G. Komen For The Cure nos anos 90, que foi distribuído em uma das corridas de rua em prevenção à doença. O movimento ganhou força a partir de 1997 em que entidades das cidades de Yuba e Lodi começaram a comemorar a data e promover ações.
Autenticidade e reputação de marca
Hoje a celebração foi além de promover a conscientização e passou também a ser instrumento de promoção de marcas. Não é difícil ver empresas aderindo à utilização da cor rosa na sua comunicação, seja com uso de iluminação, mudando os uniformes dos funcionários, distribuindo o laço rosa, ou alterando logo da empresa para rosa durante o mês.
Porém, considero que é necessário estudar mais a fundo alguns conceitos antes de prosseguir com o assunto. É importante dizer que cada empresa pode possuir um papel dentro do espectro de uma causa social. Há as que divulgam, as que doam dinheiro, as que mantêm uma instituição e atendem as mulheres, e as que fazem pesquisas para encontrar a cura da doença.
O que significa que não necessariamente as empresas precisam ter uma Instituição com esse tema durante o ano inteiro, para poder ajudar na causa. Quando se trata de investimento social, cada empresa (e até uma pessoa) tende a ter a sua preferência e não há nada demais em ter que escolher algo a priorizar. Por isso também que considero que a escolha de uma causa deve ser muito pensada e estar atrelada aos valores da marca.
Esse processo garante a autenticidade, muito bem definida no dicionário como “qualidade do que é autentico, verdadeiro”, os autores Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010) dizem que é elemento fundamental para o desenvolvimento da personalidade de marca, mas que apesar da sua importância é comum ver empresas que tem um discurso diferente da ação, e por isso muitas vezes perdem em reputação. Além disso, os autores ainda citam que uma imagem forte de marca vem da definição de sua identidade e do fortalecimento de uma integridade autentica.
Entre a ação e a realidade.
Se a autenticidade é importante, porque sinto que muitas das ações vão na onda do “se todo mundo faz, eu também tenho que fazer!”. Quando se apoia uma causa, para ela ser verdadeira, deve ser pensada no caminho inverso do que vejo por ai. Apoiar porque é importante e não porque pode melhorar a imagem de marca, mesmo porque a mesma só será favorecida se o público ver verdade na comunicação e evidências de ação por parte da empresa. O inverso pode gerar danos de reputação e em vez de agregar valor, diminui.
Entre todas as ações o que mais me incomoda é as empresas que gastam dinheiro deixando o mundo rosa, para mostrar que surfam a onda do hype, em vez de pegar esse mesmo dinheiro e contribuir com uma instituição, doar parte dos lucros, ou até mesmo bancar uma carreata de mamografia para as mulheres da comunidade a sua volta. Entendam, não sou contra a parafernalha rosa, se estiver bem alinhada com à uma comunicação de qualidade e ao desenvolvimento de ações que contribuam para a causa, pode ser muito interessante.
As ações não precisam ir muito longe. Vi uma academia em que as pessoas tem que preencher uma cartela com assinaturas dos professores de aulas coletivas que participaram, para no fim ganhar uma camiseta. Em um primeiro momento pode parecer bobo, mas você sabia que segundo pesquisa do Ministério da Saúde, 12% das mortes ocasionadas por câncer de mama poderiam ser evitados caso as mulheres praticassem atividades físicas regularmente? Há também postos de doação de lenços dentro das unidades, que serão enviados à mulheres que fazem quimioterapia. É simples, não demanda muito dinheiro, e ajuda de alguma forma. Isso é mais autêntico do que se iluminassem cada unidade de rosa.
Claro que qualquer ação deve ser adaptada ao que as marcas podem oferecer de melhor e cada empresa deve decidir para si mesmo qual papel pode cumprir no espectro das causas sociais. O importante é ter certeza de que está ajudando alguém em algum lugar. E isso, com certeza nos leva a outro tópico.
Criação de demanda sem oferta
Uma outra reflexão que tenho, é que as campanhas falam muito da necessidade do diagnóstico precoce que aumenta a possibilidade de cura, ensinam a fazer o autoexame, mostram casos de pessoas que tiveram. Mas muitas esquecem de uma coisa, a mulher que frequenta o SUS e que muitas vezes marca o exame hoje para fazer daqui 1 ano. Qual a probabilidade dessa mulher ter uma forma mais avançada da doença quando a descobrir?
Isso para mim é igual você fazer uma linda propaganda em massa de um produto, mostrando todas as vantagens de comprar, todas as associações positivas criadas na cabeça do consumidor de forma esplêndida, mas errar terrivelmente na previsão de vendas, e faltar produto na hora da conversão. Isso deixa o cliente frustrado, com toda a certeza. E a mulher que ouve toda hora que precisa fazer o exame, que é importante, mas não consegue fazê-lo, qual será o sentimento que a comunicação gera nela? Eu chutaria além da frustração, o medo, a ansiedade, a tristeza de não poder pagar pelo exame.
Agora imagina se uma empresa em sua campanha, gasta seu rico dinheiro dando uma mamografia de graça para essa mulher? Será que ela vai ficar feliz? Será que ela poderá consumir um produto da empresa que resolveu esse problema para ela? Eu vejo isso como uma oportunidade de fazer o bem e, quem sabe, ter algum retorno em brand equity, mesmo que seja pequeno ou nenhum.
Conclusão
Considerando todo o exposto coloco em pauta a seguinte conclusão. Sua marca não vai ganhar nada se sua adesão ao outubro rosa for superficial e apenas considerar estar na moda. A causa perde quando só há a comunicação da necessidade do exame, sem que as mulheres possam de fato fazê-lo.
Para uma marca, ser autêntico é fundamental. Os consumidores e a causa agradecem.
Referência:
Kotler, Philip. Kartajaya, Hermawan. Setiawan, Iwan. Marketing 3.0: as forces que estão definindo o novo marketing centrado no ser humano. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010
Sócia na TNADV | Timoner e Novaes Advogados
5 aAutenticidade! Ótima reflexão!