Para imaginar um Brasil nosso
Crédito: Tânia Rego/Agência Brasil

Para imaginar um Brasil nosso

Imaginar significa ir além da experiência real sobre um tema para plantear possibilidades de rompimento, que extrapolam as regras sociais ou os fatos como conhecemos, propondo transformações sociais através do resgate à imaginação política.

Imaginar é a ação ou a faculdade de combinar ideias para criar novas realidades. É, em outras palavras, ir além, buscar mais, avançar, ampliar, mudar para melhor. 

A imaginação, portanto, consiste em um ingrediente fundamental à política – especialmente em países que, como o Brasil, são marcados por profundas desigualdades sociais e políticas. É imaginando que podemos idealizar, propor e colocar em prática caminhos que vão transformar a realidade e promover uma sociedade mais justa, democrática e igualitária.

É pela imaginação política que, ao pensar e projetar novas possibilidades de ação coletiva, uma sociedade se desenvolve. Como resume Beatriz Della Costa, cofundadora e codiretora do Instituto Update, “a imaginação política é fundamental para construir realidades e organizar o futuro”. E imaginar o nosso próprio futuro, para além do que está dado e estabelecido, é, mais do que um direito, uma necessidade.

Nos últimos quatro anos, durante o governo Bolsonaro, vivemos imensos retrocessos, mas isso não significa que o Brasil tenha parado de imaginar futuros melhores. Embora a imaginação tenha se mantido mais ausente do que nunca do centro no poder, ela nunca deixou de comer pelas beiradas, fervilhando e buscando saídas nas margens e periferias por meio da criatividade e da colaboração de ativistas, da sociedade civil e de muitos políticos de oposição.

Agora, no novo governo, embora os desafios pela frente ainda sejam inúmeros e complexos, essas novas maneiras de fazer política estão enfim se institucionalizando.

No dia 1 de janeiro de 2023, a imaginação política literalmente subiu a rampa do Palácio do Planalto. Porque, como ninguém é capaz de esquecer, Lula chegou para tomar posse acompanhado de oito representantes da sociedade – e, como nunca na política brasileira, esses representantes de fato carregavam em si a representatividade. Entre eles estavam o cacique Raoni, importante liderança indígena, a catadora Aline Sousa e o ativista na luta das pessoas com deficiência Ivan Baron.

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Crédito: Tânia Rego/Agência Brasil

A subida da rampa é um ritual carregado de significados e simbolismos, refletindo, mais do que a continuidade e a estabilidade institucionais, a afirmação da própria democracia. Um Brasil em que a sociedade sobe a rampa, portanto, é um Brasil que tem enfim a possibilidade de dar asas à imaginação política.

E essa imaginação já começou a se transformar em ação concreta com o anúncio dos ministérios. Nunca houve tantas mulheres, pessoas negras e indígenas nas pastas do governo – embora, claro, sempre possa haver mais. Outra nomeação emblemática foi a de Joenia Wapichana para presidência da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), responsável pela proteção e promoção dos direitos das diferentes etnias do país. Em 55 anos, é a primeira vez que uma pessoa indígena está à frente do órgão.

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Crédito: Joedson Alves/Agência Brasil

Essa diversidade de representatividade e de poder é fundamental para pensar e articular as necessidades e demandas de todos os setores da sociedade. O fortalecimento da democracia, afinal, se dá acima de tudo a partir da participação ativa dos diversos atores e atrizes que a compõem.

A imaginação política também foi semeada com o anúncio pelo presidente Lula, em março, do pacote com sete medidas para a igualdade racial no Brasil, que vai atuar na promoção dos direitos da população quilombola – cerca de 214 mil famílias e mais de 1 milhão de pessoas – nos eixos de acesso à terra, infraestrutura e qualidade de vida, inclusão produtiva e desenvolvimento local, direitos e cidadania. Trata-se de uma iniciativa essencial para combater o racismo estrutural que ainda permeia a nossa sociedade brasileira. 

De certa forma, imaginação política é sonho – ou, mais do que isso, é agir para transformar sonhos coletivos em realidade. Nesse sentido, na essência, foi de imaginação política que, fazendo referência a Martin Luther King, Silvio Almeida falou em seu discurso de posse como ministro Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania: “Eu também tenho um sonho. E quero sonhá-lo com todo o povo brasileiro. Eu sonho com um futuro no qual nós já vencemos. Nós somos a vitória dos nossos ancestrais. Nós somos a vitória, também, daqueles que virão depois de nós.”

No discurso, o ministro celebrou as populações minorizadas: “Vocês existem e são valiosos para nós”, disse. Com essa fala, ele reconhece que, mais do que representatividade, é importante dar espaço. Para que a imaginação política aconteça na prática, todas as pessoas precisam se tornar visíveis para o Estado. E um Estado que tem a imaginação no centro do seu fazer político é um Estado que tem nos espaços de poder representantes dos grupos vítimas de injustiças e opressões.

Como lembra Tulio Malaspina, cofundador e codiretor do Instituto Update, “nós somos seres que imaginam. Imaginamos que podemos ir à Lua e construímos um foguete. Imaginamos que podemos andar de carro e construímos o automóvel. Nós imaginamos e construímos. No exercício político, a gente não só pode como deve imaginar.”

Agora temos que, juntos, imaginar o Brasil que queremos e precisamos – hoje, em 2026 e além.


Texto publicado também no blog do Instituto Update em 11/04/2023.

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