Percorrendo o caminho certo para a Transformação Digital
Esther Shein, contribuidora da revista digital CIO escreveu no artigo “7 secrets for getting digital transformation right”, que um dos hábitos do best-seller de Stephen Covey, “Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes”, é começar com o fim em mente. Colocando isso no contexto comercial de hoje, as organizações precisam descobrir o que significa transformação digital para os seus negócios e quais são seus objetivos antes de lançar um monte de novas tecnologias num problema mal definido. Concentrar excessivamente em ser competitivo e inovador e colocar a maior parte dos esforços em tecnologia, podem fazê-los perder o barco... Um número significativo de organizações não está a conseguir fazer a transformação correta por causa de um dilema fundamental sobre o que realmente é a transformação digital, diz Brian Solis, analista principal e futurista da Altimeter.
O relatório do Estado da transformação digital de 2017 da Altimeter mostra que, embora as organizações estejam a investir em tecnologias inovadoras, a maioria está atrasada ou não responde às novas expectativas dos consumidores devido à "escassa alfabetização digital". O relatório também constata que muitas empresas têm culturas (tradicionalistas) e que "política, ego e medo são os principais obstáculos para alcançar a colaboração e a solidariedade necessárias nas empresas para fazer as mudanças que os consumidores digitais desejam". Quando as empresas começam com uma abordagem tech-first, elas perdem o objetivo do que é a transformação digital, afirma Solis. "Acho que muitas vezes empresas e CIOs em particular caem no que chamo de "armadilha da tecnologia ". Simplesmente significa que eles estão a construir uma base legacy com coisas novas.
“Existe esta ideia: de que se usarmos a tecnologia que os nossos clientes usam ou as aplicações, sites para dispositivos móveis ou chatbots mais recentes, acompanharemos as disrupções”, diz Solis, “e acho que nada disso é mau, mas é uma armadilha comum para a evolução da transformação digital".
Para se ver como está a ser feito corretamente, seguem alguns segredos de transformações digitais bem-sucedidas:
1. Transformação digital é sobretudo uma transformação humana
Quando Shamim Mohammad se tornou CIO e vice-presidente sênior da CarMax, há alguns anos, não procurou focar-se na transformação da tecnologia, mas na forma como nos transformamos para que todos possam se mover na velocidade certa. Na mesma linha de pensamento James Lowey, CIO da TGen afirmou que acredita que ter pessoas apaixonadas, curiosas e motivadas pela missão é a chave para o sucesso na conquista de uma verdadeira transformação digital. Do outro lado, James Fairweather, vice-presidente sénior de tecnologia e comércio eletrónico disse que: "Percebemos que para a nossa organização avançar, além de uma estratégia técnica clara, precisávamos de uma estratégia para as pessoas".
Uma transformação digital não se trata de um simples processo de “go digital” com esteróides. É um fenómeno complexo, que está intrinsecamente associado à transformação das próprias pessoas dentro do processo. Um mundo em constante transformação digital, requer igualmente pessoas em constante transformação.
2. Adotar uma abordagem centrada no cliente
Enquanto as empresas citam "o comportamento e as preferências dos clientes em evolução" como o principal impulsionador da transformação digital, menos de metade investe na compreensão dos clientes digitais, segundo o relatório da Altimeter.
Segundo Rui Pedro Silva, Diretor de Tecnologia na Maersk, o grande problema das tecnologias, não só em Portugal, mas a nível mundial, é falharem muitas vezes, porque a diferença entre o que um quer e o outro entende é tremenda.
Para que esta abordagem seja bem-sucedida, é preciso desenvolver programas de maior foco em customer experience, criando jornadas com os clientes, de modo a melhor identificar falhas nos serviços, assim como oportunidades de vincular novo negócio. Isto não só permite desenvolver uma maior proximidade com o cliente, como ajudá-lo a sentir-se igualmente como parte da solução. O cliente não é uma entidade à parte da solução, mas um forte contribuidor na sua construção. Este tipo de abordagem mais inclusivo permite que o cliente ganhe maior literacia tecnológica, e maior afinidade com o fornecedor do produto e/ou serviço. Permite também reduzir o risco de se construírem soluções exclusivamente tech-oriented, que não vão ao encontro das expectativas do cliente. Desse modo, o foco passa a estar na relação com o cliente, o que visibiliza o desenvolvimento de um plano customizado que faça match com as suas reais necessidades.
3. Criar novas equipas
Rui Pedro Silva afirma que: “as empresas não vão sobreviver se tratarem o departamento de IT como uns tipos sentados na cave”.
O verdadeiro crescimento de uma empresa só se dá, quando os seus colaboradores aprendem a lidar com diferentes tipos de mindset. Várias empresas em transformação digital estão a criar equipas multidisciplinares que possuem habilidades técnicas diversas, perfis comportamentais variados, vivências e experiências distintas uns dos outros. Todos esses colaboradores irão trabalhar para um único propósito, ajudando a equipa com suas aptidões distintas em múltiplas áreas. Uma equipa multidisciplinar traz diversos benefícios para a empresa. Contando com pessoas tão diferentes, a troca de experiências entre os profissionais será muito maior, fazendo com que eles consigam expandir os seus conhecimentos. A diversidade de papéis nas equipas também faz com mitos associados a certo tipo de funções sejam desfeitos, criando deste modo um maior sentimento de conexão com o outro e de compreensão mútua. Para além disso, a comunicação e a cooperação entre equipas torna-se mais fluida, deixando de existir equipas monofuncionais (que desempenham uma só função).
4. Promover a colaboração à medida que a tecnologia é implementada
O cruzamento da informação entre as equipas que implementam e integram é crucial para a melhoria contínua. Ter uma equipa de estratégia tecnológica que promova a cooperação entre equipas, é uma forma de incentivar todas as equipas a partilharem práticas para testar a integração e entrega contínuas. Os esforços colaborativos podem ser recompensados. “Como resultado da partilha de práticas, identificamos casos em que vemos falhas comuns nas nossas práticas contínuas de integração, entrega e operação - e então podemos propagar a correção em todas as equipas, melhorar e corrigir.” – afirma James Fairweather. A promoção deste tipo de colaboração permite que os membros das equipas se sintam como parte de um todo, e não como peças separadas que não comunicam entre si.
5. Não se desculpar pela mudança
Se há uma coisa que Gutowski, vice-presidente da GE Commercial e digitalTHREAD aprendeu, é que conduzir uma transformação de pessoas “não é para os fracos de coração… É preciso primeiro não se desculpar em conduzir mudanças e também é preciso sentir-se confortável com o desconforto constante". Nenhuma mudança à priori é bem-vinda. Isso implica automaticamente sair da nossa zona de conforto e entrar no campo do que é desconhecido. No entanto é sabido que na zona de conforto nada cresce. Para que as barreiras se quebrem, a noção de “Porquê” deve estar bem presente. A quebra dos silos começa naqueles que conseguem entender a razão pela qual a mudança é necessária. E é iniciando com essas pessoas que gradualmente a mudança acontece.
6. Adotar uma mentalidade de startup
À medida que as organizações crescem, diferentes grupos podem começar a se separar, criando silos de informações. "Uma mentalidade de startup ajuda a quebrar essas barreiras e incentiva a comunicação entre equipas" - diz Darin Morrow, CIO da Cricket Wireless.
Manter uma mentalidade de startup é ser capaz de nutrir uma mentalidade de eterno aprendiz. Ela faz com que sejamos capazes de olhar inúmeras vezes para as mesmas coisas e para as mesmas pessoas, e que a cada dia consigamos ver algo de diferente nessas mesmas coisas e nessas mesmas pessoas. Isso faz com que a criatividade seja estimulada e que novas ideias surjam para melhorar projetos, processos, relações, ou até para iniciar novas frentes de negócio. Mas para que o crescimento seja contínuo e sustentável e não tenhamos de estar constantemente a iniciar tudo do zero, é necessário saber discernir quando utilizar a mente racional e empírica, e quando dar uso à mente criativa e inovadora.
7. Promover gestão de unidades
A pesquisa do Alimeter indica que apenas 40% das empresas entrevistadas operam com um comité executivo de decisão responsável pela transformação organizacional.
Numa Transformação Digital corretamente planeada, toda a gestão top to bottom é restruturada, de modo a transitar para um modelo de gestão flat. Todas as pessoas devem ser envolvidas nos processos de decisão, desde o C-Suite, aos funcionários que representam a base da organização. Para que a mudança seja executada com sucesso, o mindset deve estar transversalmente alinhado em todas as áreas e todo e qualquer funcionário deve ser valorizado e responsabilizado pelo contributo individual que agrega. Todos devem fazer parte do todo e sentirem-se parte do todo, trabalhando organicamente. Este tipo de transformação requer o envolvimento total da organização e é necessário um esforço bastante significativo, para que os silos e as barreiras hierárquicas sejam diluídos. Nesse aspeto, a transformação será tão mais lenta, quanto maior for a resistência à mudança. Porém, tal não invalida que esta iniciativa se possa iniciar em qualquer setor da organização.
Embora a C-suite normalmente decida qual será a estratégia de negócios e informe o resto da organização, Jayaram da John Deere decidiu mudar isso. “Eu escolhi mudar a abordagem tradicional top to bottom e, em vez disso, reuni 40 pessoas de diferentes níveis de hierarquia na IT para criar uma nova estratégia de IT e transformar a empresa numa empresa digital… Passamos por todo um processo de cocriação antes de levá-lo ao C-suite", diz ele. Alguns dos que contribuíram são novos para a empresa, mas são especialistas no assunto em user experience ou desenvolvimento ágil.
Em estruturas hierárquicas bastante estratificadas, o processo de decisão e de comunicação peca por ser moroso e dispendioso, o que muitas vezes leva a que as empresas percam o seu Time to Market e consequentemente oportunidades de negócio. Jayaram é um exemplo de alguém que não tendo a autoridade plena de alterar a forma como a sua organização funcionava, atuou localmente, dentro do que lhe era possível mudar. E porque assim o fez, permitiu que mais funcionários na sua alçada pudessem contribuir com mais e melhor. Embora não haja mudança sem obstáculos, superá-los e progredir é uma escolha. Cabe a cada um de nós, mudar o que está ao seu alcance.
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