Por paixão ou por medo?

Por paixão ou por medo?

Há décadas em vários lados do balcão no mundo corporativo, tenho vivido na pele as dores e as delícias da transformação e da inovação. Não aquela clássica sobre a qual plateias se animam em eventos inspiradores. Mas a transformação de minha própria trajetória que, por ser vivida dentro de grandes companhias, pode explicar muito os caminhos possíveis para a necessária transformação das empresas.

Primeira coisa: pode ser pela paixão ou pelo medo.

Aos 34 anos me tornei CMO para Brasil, Paraguai e Uruguai de uma das maiores empresas de bebida do mundo. Tudo lá era sonho. Ousávamos imaginar marcas, criar produtos, comportamentos. Vislumbrávamos planos que logo ganhavam a realidade nas ruas. Um time de pessoas inspiradoras, trabalhando e se divertindo, crescendo juntos, aprendendo. Não à toa viramos amigos de vida.

Compartilho aqui um dos exemplos de transformação por propósito que vivemos juntos. Imbuídos de paixão e da responsabilidade pelo o que vendíamos [ algo que a própria companhia nos ensinou ], criamos a primeira grande ação de consumo responsável de bebidas alcoólicas no Brasil, quando nem ainda havia lei seca por aqui. Ousamos realizar uma pesquisa que mostrava que 89% dos brasileiros naquela época achavam “normal” dirigir depois de beber. Demos visibilidade a isso, engajamos outras instituições privadas e públicas o assunto, escancaramos o problema que, de certa forma, ajudávamos a gerar. Transformamos um milionário [ em libras ] contrato com F1 em um contrato 100% focado no consumo responsável. Fizemos isso no Brasil e exportamos para todo o mundo.

Acredito que quem sabe criar marcas, sabe criar comportamentos e liderar a equipe para promover essas transformações. Quando a lei seca foi aprovada da noite para o dia no Brasil, implementamos uma grande doação de corridas de taxis para toda a população, independentemente de serem consumidores da marca ou não. Nem aplicativos de taxi havia na época, foi uma baita jornada.

Inovávamos por paixão. Por paixão pela marca, pelo mercado e pela mudança de comportamento que poderíamos ajudar a criar.

Alguns anos depois, pude trabalhar em uma das maiores empresas de e-commerce do mundo. Já não tinha 30 anos e confesso que entrava em reuniões nas quais entendia pouco do que jovens executivos falavam. Trazia na bagagem conhecimentos e precisava transformar, me transformar, desaprender o que eu sabia, aprender o novo sendo o mais velho na sala de reuniões.

Deixei de ser o Yoda e passei a fazer perguntas.

Um dos mais exigentes exercícios de desconstrução do ego pelo qual já passei. E falo como faixa preta de karatê. Desacreditar do que fomos levamos a acreditar, como pessoas ou companhias, é altamente desafiador. Vale uma jornada do Herói. A que se segurar? Como seguir com confiança? Esse caminho só é possível se, de alguma forma, consegue-se enxergar, onde se deseja chegar.

A bordo do time da Amélie, hoje busco emprestar esses aprendizados a grandes empresas que viram, na pandemia, acelerada a necessidade de transformação. Empresas que entenderam que a mudança é necessária para que consigam se manter relevantes. Cujas marcas podem ser reinventadas para um novo tipo de consumo pois o comportamento humano vem mudando muito rapidamente nas últimas décadas.

Por paixão ou medo, para mudar é preciso muita resiliência. É preciso respirar fundo. Aprender a se equilibrar no estresse. Aprender a agir. Reconhecer as fortalezas [ elas sempre existem! ] e reconhecer também as fraquezas para poder superá-las.

O comportamento humano se transforma cada vez mais rapidamente, nós precisamos aprender a navegar no incômodo, nas incertezas, na ousadia. Precisamos abraçar o erro, lidar com a falha e não se achar uma falha. Precisamos nos habituar a mudar, achar graça nisso e incorporar a flexibilidade como uma nova habilidade nas vidas das pessoas e nas corporações.

Viver as mudanças como quem vive o planejamento de uma viagem para um destino novo. Dá para estudar um pouco, mas há de se comprar as passagens e aceitar o risco do desconhecido! Boa viagem :)


Ricardo Contrera

partner and co-founder of mosaiclab | www.mosaiclab.com.br

3 a

Muito bom Edu. Traz boas lembranças da época de Diageo. Abraço

Claudio Gananca MBA, Prof.

Especialista em Tecnologia da Informação

3 a

Edu, curti muito, é simplesmente isso! Comento com minha esposa: "Aprendemos muito em tudo o que já fizemos, mas mais do que isso, amadurecer é espetacular!" - tantas são as perspectivas que nos constroem. Um grande abraço!

Elmo Santos

Gerente Regional de Vendas | Gerente Comercial | Gerente Distrital de Vendas | Gerente Divisional de Vendas | Gerente Nacional de Vendas.

3 a

Inspirador!

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