A promessa do ganho fácil desperta a ganância e o caminho para o caos pessoal!
Se você é devoto de fórmulas de lançamentos, reprogramações biológicas de qualquer tipo e origem ou pirâmides disfarçadas de marketing de multinível, em especial as que envolvem criptomoedas, a história a seguir não é recomendável.
O mundo adverte: a consciência da realidade pode ter efeitos colaterais dolorosos em sua saúde mental.
A Dona Gertrudes, uma senhora viúva, muito querida por todos que a conhecem. Apesar dos seus 81 anos, a sua alegria de viver é contagiante. Em 1991, ela vendeu as suas preciosas linhas telefônicas (quando valiam alguma coisa) e colocou todo o dinheiro angariado com as vendas na poupança. Afinal, ela precisava de algum investimento seguro que garantisse um rendimento mensal para a sua sobrevivência. O que ela ganhava por mês era pouquinho, e todos criticavam pela decisão de optar pelo "pior investimento do mercado", mas era o suficiente para quitar as suas despesas com alimentação, IPTU, água, luz e ainda sobrava um tanto para comprar lembrancinhas aos netos e familiares.
Seu Izidoro, comerciante, estava indo muito bem em sua microempresa. Ele conseguiu uma representação de produtos de beleza de São Paulo e, em pouco tempo, arrecadou um bom capital de giro. Investiu esse dinheiro num banco de confiança, pois dinheiro parado não rende nada, pensava Izidoro.
O professor universitário Adolfo, após anos e anos de trabalho, enfim conseguiu dinheiro suficiente para investir na compra dos equipamentos para a futura clínica veterinária da sua filha. Como Eliza estava para se formar, Adolfo achou melhor investir em ouro, que, apesar de não render muito, era o mais seguro investimento do momento. Estava tudo certo, Eliza se formava em breve e Adolfo daria como presente de formatura todos os instrumentos necessários para que sua filha exercesse a função de veterinária.
O atual e grande empresário Antônio, cujo negócio começou pequeno e tímido, se tornou diretor-presidente de uma das maiores empresas de motores do país, conseguindo inclusive respeito internacional. A empresa dirigida por Antônio vai muito bem e, no final do último ano fiscal, obteve lucros extraordinários, algo da ordem de quarenta milhões de reais.
Tanto Dona Gertrudes, Seu Izidoro, Prof. Adolfo e Antônio conheceram alguém em comum:
Donizete.
Donizete tem excelente aparência, fala muito bem, é muito bem informado e, o melhor de tudo, é um rapaz agradável e sempre sorridente. Donizete é gerente de uma factoring e propôs aos nossos investidores um grande negócio: todos vocês investem o seu dinheiro na minha factoring e eu lhes garanto uma rentabilidade extraordinária.
Todos pensaram: Meu Deus! Obter um rendimento dez vezes maior que o que obtivemos no último ano? Este é o negócio! Sem pensar muito, todos investiram suas reservas na factoring. Antônio foi o único a ser um pouco cauteloso, dividindo seus investimentos em várias instituições financeiras, deixando com Donizete apenas dez milhões do seu belo lucro.
Donizete possuía vários clientes que emprestavam dinheiro de sua factoring, a juros que variavam de 3% a 5% ao mês. Dessa forma, ele conseguia prover dividendos aos seus investidores e ainda ganhar o seu lucro na diferença de quem aplicava e de quem emprestava. A fórmula aparentemente está correta e se torna um ótimo negócio, tanto para o investidor, que ganha rendimentos bem maiores que os de mercado, quanto para a factoring, que ganha dinheiro sem ter que utilizar recursos próprios. Mas quem empresta o dinheiro será que ganha alguma coisa? Quando uma organização não tem dívidas e precisa de um empréstimo para investir num novo negócio, existem vários bancos de investimento com juros abaixo de 3% ao mês, com a facilidade de proporcionar um pagamento parcelado superior a cinco anos. Então, para quem a factoring empresta o dinheiro dos investidores?
Simples.
Para as empresas, profissionais e pessoas físicas que não têm dinheiro nem crédito. Agora, a fórmula matemática começa a ficar esquisita e perigosa.
Certo dia, Antônio, o grande empresário e maior investidor que Donizete tem na sua carteira de clientes, precisou retirar metade do seu dinheiro, algo em torno de cinco milhões de reais. De repente, uma surpresa desagradável aconteceu: a factoring de Donizete não tinha esse dinheiro disponível em caixa, pois nos últimos meses ela recebeu de diversas empresas algumas * “duplicatas frias ou duplicadas", ou seja, documentos mercantis falsos, em que a venda não foi efetuada, mas apenas forjada, para gerar uma fatura fictícia.
Nesse caso, quem emprestou o dinheiro sumiu do mapa e, como o comprador não existe, a possibilidade de restituição é nula. Antônio, que precisava do dinheiro, insistia em ligar para a factoring para liberar o seu dinheiro, mas nunca tinha sucesso nas suas solicitações. Nesse mesmo período, ele recebeu a visita dos representantes oficiais da factoring de Donizete. Ao se apresentarem, Antônio exclama: Puxa, que alívio, precisava muito desse dinheiro, senhores.
Mas o que Antônio não esperava era que aqueles senhores eram os advogados de Donizete, comunicando ao maior investidor da factoring que a empresa estava pedindo concordata. Antônio recebeu realmente uma notícia terrível e certamente perder dez milhões não foi bom para a sua empresa. No entanto, devido a sua precaução, conseguiu reverter a situação, por mais grave que fosse, pois tinha recursos em outras entidades financeiras.
Dona Gertrudes perdeu todo o seu dinheiro e passou a depender dos filhos para comprar comida e remédios.
Seu Izidoro ficou sem o dinheiro necessário para o seu capital de giro, automaticamente não conseguiu cumprir os seus compromissos com terceiros e dispensou metade dos seus funcionários, que foram ao Ministério do Trabalho reclamar alguns direitos, os quais Seu Izodoro não cumpria por falta de recursos. Seu Izidoro vendeu sua residência particular para resolver os problemas ocasionados com a perda do dinheiro investido na factoring de Donizete. Sua empresa passou a enfrentar sérias dificuldades para se manter no mercado. Não resistiu, e entrou em falência.
Prof. Adolfo viu com alegria a sua filha Eliza se formar, mas infelizmente, em virtude de sérias dificuldades financeiras ocasionadas pela perda do seu dinheiro, não pode ajudá-la na compra dos equipamentos da clínica. A situação se inverteu, e Eliza passou a ajudar o seu pai nas despesas diárias com o baixo salário obtido no estágio que conseguiu em uma clínica veterinária. Eliza adiou o seu curso de especialização, pois não tinha condições de pagar.
A promessa do ganho fácil desperta a ganância e o caminho para o caos pessoal!
Essas histórias verdadeiras, aconteceram na década de 90, e envolveram quatro pessoas que colocaram a ganância de desejar muito mais, em um momento que tinham uma vida financeiras estável e controlada.
O desejo árduo de querer mais, de ganhar mais, com menos gasto de energia, esforço e trabalho, levam as pessoas à euforia.
Defino euforia como o estado emocional que leva o indivíduo a ignorar a realidade do mundo e dos outros, criando a sua própria, comportamento este despertado através de um estímulo pessoal ou ambiental, normalmente manipulador e planejado, que permitiu a inserção de variáveis irreais na mente da vítima, onde esta chegou a conclusão que ela é única, poderosa e que se tornou a privilegiada plena que o universo escolheu para receber todos os benesses divinos.
Quando o ganho financeiro passa a ser algo que tenha valor pessoal maior que todas as outras coisas da sua vida, o certo ou incerto, se torna subjetivo ou até mesmo invisível.
Centenas de milhares de pessoas já passaram, passam e passarão por essa situação, pois outros Donizetes aparecerão e sempre haverá alguém disposto a investir cegamente seu dinheiro na busca de mais dinheiro.
Donizetes prometem que você vai ser rico, fazendo 6 em 7, mesmo sem produto, sem conhecimento e sem dinheiro, bastando para isso, comprar uma fórmula mágica de lançamento, do produto ou serviço que você não tem ideia que vai lançar, usando uma estratégia de lançamento semente.
A verdade é que apenas 1% de quem compra as fórmulas de lançamentos tem algum tipo de sucesso. Mas estes heróis formados desta elite de 1% do universo que comprou a fórmula, são usados como prova social genericamente, e a vítima não percebe que dar certo, é uma exceção e não um regra. Aliás, está estratégia, faz parte da fórmula. Prato cheio para mentes ignorantes e carentes em busca do mais com menos.
Donizetes garantem lucros absurdos com investimentos em criptomoedas, onde o seu dinheiro fica retido por um ou mais anos, e ao final do contrato, você receberá magicamente dez vezes mais que o investido.
A verdade é que durante o período que o dinheiro fica retido, os Donizetes fazem duas coisas. Primeiro investem o dinheiro dos outros comprando e vendendo criptomoedas. Segundo, pagam em dia quem entrou no início da pirâmide para gerar credibilidade, e quando o modelo se tornar sustentável, absolutamente ricos para o resto da vida, somem do mapa.
Donizetes palestram divulgando o fim do modelo tradicional da educação, e que títulos, formações ou graduações, não servem mais para nada.
A verdade é que os gurus da atualidade que destilam contra a educação tradicional que realmente está em transformação, normalmente são mais jovens, preguiçosos e arrogantes, odeiam estudar e ganharam muito dinheiro porque fazem parte do 1% das heróis das fórmulas de lançamento, e precisam impor ao mercado, que suas soluções educacionais promovidas em cursos online através de vídeos rasos e sem fundamento científico, são melhores. Porém, em seus currículos, principalmente no Linkedin, expõem publicamente que são “professores” e ousados, usam títulos da educação tradicional “fálida” e "escrota", como por exemplo “neuropsicologos”, onde a pessoa não possue formação nem de medicina, quanto menos de psicologia, mas quem sabe, uma graduação qualquer de pedagogia e uma especialização a distância com o prefixo “neuro”. E agora é o Doutor Neuropsicologo das Galáxias.
Donizetes apostam que o mundo são das startups, e que se você não focar em ser o idealizador ou trabalhar em um Unicórnio, você será um ser humano obsoleto e fora do mercado.
A verdade é que menos de 1% das startups se tornam unicórnios. Mais uma vez a exceção criando expectativas falsas na sociedade. Unicórnio continua sendo um ser animal que não existe e que vive no imaginário de crianças inocentes. Aliás, neste inicio de 2020, grandes unicórnios estão se ajustando para virar cavalos (pelo menos este animal existe na realidade) para comer capim e sobreviver e não morrer de fome, como a Rappi com corte de 150 pessoas , Oyo com corte 2 mil pessoas, Zume com corte de 360 pessoas), Getaround com corte de 150 pessoas, entre dezenas de outras.
Donizetes criam fórmulas, métodos e terapias usando palavras associadas a neurociência, física quântica, genética e outras áreas de conhecimento, restrito a maioria da população, e geram métodos que curam e resolvem tudo, normalmente baseado apenas na fé do poder da energia universal do bem maior. Pensa, acredite e receba. Simples assim!
A verdade é que a eugenia é proibida no mundo inteiro. Porém se você acredita que você pode reprogramar o seu DNA, mudar suas crenças limitantes e quem sabe potencializar o seu hemisfério dominante, entenda que tudo isso é pseudociência e não existe, e se de fato existisse, alterações biológicas nos seres humanos provindas de métodos sem aprovação de um comité de ética e consequentemente publicação científica, é crime. Porém, todos que demandam sucesso vendendo esperança de cura, conseguem espaço e ficam milionários graças as formulas de lançamento citadas acima e a 1% dos seus fieis, que precisam apenas fazer qualquer coisa para alguma coisa acontecer. Já estavam no fundo do poço. E se aconteceu alguma coisa de bom, os gurus são os responsáveis pela mágica quântica universal sistemática.
Não se engane, o tempo passa e as formas e modelos podem mudar também, mas os Donizetes estão por ai passando “duplicatas frias” para os desavisados.
Tenha consciência destes Donizetes, antes que seja tarde demais.
* O crime de duplicata simulada está previsto no caput do art. 172 do Código Penal brasileiro. Consiste em emitir fatura, duplicata ou nota de venda que não corresponda à mercadoria vendida, em quantidade ou qualidade, ou ao serviço prestado. A pena para este crime é detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
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