Public Net Worth: Um Conceito de Gestão Sustentável na Nova Zelândia
Precisamos explorar mais o assunto no debate sobre contas públicas.
O equilíbrio das contas públicas é fundamental para o desenvolvimento sustentável do país. Neste contexto, observar as experiências internacionais pode trazer reflexões importantes para uma gestão pública mais responsável. A Nova Zelândia é um exemplo. O país, que sempre inspirou a responsabilidade fiscal no Brasil, tem se destacado novamente com a abordagem do Public Net Worth.
Dois artigos recentes introduziram na mídia brasileira o conceito de Public Net Worth: “A solução que vem da Nova Zelândia para a dívida pública mundial de US$ 100 tri”, na Folha de S. Paulo, e “Reforçando a credibilidade nas políticas”, no Estadão.
Na Nova Zelândia, o governo adota uma abordagem inovadora e transparente para medir a saúde financeira do setor público: o conceito de Public Net Worth. Diferentemente do foco exclusivo em indicadores como déficit fiscal, o Public Net Worth avalia a riqueza líquida do setor público como um todo.
Esse conceito se baseia na diferença entre os ativos e passivos governamentais. Ativos incluem infraestrutura, reservas financeiras, patrimônio natural e investimentos estratégicos, enquanto passivos abrangem dívidas, obrigações futuras e custos projetados. Ao monitorar esse balanço, o governo neozelandês prioriza a sustentabilidade fiscal, garantindo que a gestão pública atual não comprometa o bem-estar das gerações futuras.
A transparência proporcionada pelo Public Net Worth permite que cidadãos e investidores compreendam melhor as finanças públicas. Além disso, incentiva uma abordagem de longo prazo, onde decisões sobre investimentos e gastos levam em conta o impacto no patrimônio nacional ao longo do tempo, não apenas no curto prazo.
Esse modelo tem inspirado debates globais sobre a modernização da contabilidade pública e a responsabilidade fiscal. Ele serve como exemplo de como um país pode alinhar suas finanças públicas a metas de sustentabilidade e governança eficiente.
Adotar práticas semelhantes no Brasil pode contribuir para uma gestão mais robusta e transparente, beneficiando a sociedade e fortalecendo a confiança. E é isso que o Ministério dos Transportes tem feito na área ferroviária, sob a liderança do Ministro Renan Filho, economista.
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Nos trilhos do Public Net Worth, o Ministério dos Transportes está construindo um Plano Nacional de Ferrovias que busca se financiar a partir da precificação adequada dos ativos públicos ferroviários. A partir da repactuação de contratos que foram renovados no Governo anterior, desvalorizando o valor do patrimônio ferroviário, busca-se promover a sustentabilidade fiscal de um plano nacional para impulsionar a expansão da malha ferroviária no Brasil. Como ensina a Lei de Responsabilidade Fiscal, a ação governamental da Secretaria Nacional de Transporte Ferroviário está sendo conduzida de forma planejada, transparente e responsável do ponto de vista fiscal, evitando desequilíbrios futuros nas contas públicas.
Ainda na área de infraestrutura, pode-se explorar também os efeitos das regras fiscais no valor do patrimônio público. Alguns defendem os impactos positivos do teto de gastos fixado na Constituição brasileira em 2017. Há quem diga que o Brasil melhorou a posição das finanças públicas entre 2017 e 2022.
Na ótica do Public Net Worth, no entanto, a posição fiscal do país se deteriorou na perspectiva da infraestrutura pública. Importa mostrar que o forte contingenciamento imposto pelo teto de gastos constitucional, que vigorou no país entre 2017 e 2022, reduziu significativamente o investimento público em relação à depreciação dos ativos. Em outras palavras, o investimento público do Governo Central foi liquidamente negativo, alcançando níveis históricos de sucateamento.
O gráfico mostra o efeito do teto de gastos que vigorou entre 2017 e 2022. Se no curto prazo os contingenciamentos sinalizaram uma aparente melhora nos resultados fiscais, no médio prazo a redução dos investimentos públicos tiveram que ser compensados tendo em vista os efeitos insustentáveis na posição patrimonial da infraestrutura pública. A PEC da Transição e o novo arcabouço fiscal em 2023 foram necessários para reconstrução da infraestrutura pública: o saldo líquido entre investimento público e depreciação se reduziu. Houve a retomada dos investimentos, especialmente na área de transportes.
Cabe dizer que, independente de posições ideológicas, o debate fiscal precisa ter sustentação técnica, sem negacionismo. A radicalização ideológica na área fiscal é um fator que induz o viés deficitário dos orçamentos, tanto para esquerda como para direita. É por isso que os padrões de governança podem ser mais relevantes do que regras fiscais simples que tentam soluções para problemas complexos, como foi o caso do teto de gastos constitucional de 2017.
A experiência neozelandesa já salvou o país nas reformas fiscais de 2000, quando trouxe para o Brasil a Lei de Responsabilidade Fiscal. Os avanços institucionais que se observam na Nova Zelândia podem salvar novamente o nosso país. Nesse sentido, a gestão fiscal baseada no Public Net Worth pode ser um campo rico a ser explorado em reformas estruturantes na área fiscal e orçamentária.
Desejo boas reflexões e um ótimo domingo.
Assistant Professor in Future Transport Systems
1 mPost essencial para o momento, visto que as crises nao so climaticas mas como de sustentabilidade em geral nos forcam a repensar paradigmas tradicionais. Ha de se finalmente entender que beneficios (ou externalidades positivas) muitas vezes contemplam atributos nao-monetizaveis, e portanto o real impacto da infraestrutura acaba nao sendo contabilizado, principalmente no longo prazo.
Diretor de Planejamento e Economia da ABDIB
1 mExcelente Leo!!!
Professor at University of Brasilia
1 mMuito bom. Mostra como as abordagens neoliberais são incompletas e, por isso mesmo, estão esgotadas.