Qual é a sua história?
Se instados a contar a história de suas organizações, a grande maioria dos executivos não hesitaria em puxar da manga o último balanço anual ou o planejamento estratégico mais recente. Não os culpo: tão comprometidos com metas e resultados que são, é natural que sejam condicionados a ver as empresas para as quais trabalham pelo prisma pragmático. Trazem na ponta da língua o número de empregados, os nomes dos principais sócios -- sem jamais esquecer quem é o CEO --, quantas filiais existem e quando foram abertas, o capital investido e qual o status na Bolsa de Valores.
Essas informações são muito importantes em convenções de investidores e na elaboração do planejamento estratégico. Mas conquistam corações?
Estamos em pleno século XXI, inseridos na economia 4.0, assistindo sociedade e relações de trabalho passarem por transformações profundas. Vivemos o auge do capitalismo dentro da sociedade de consumo do terceiro milênio. Mas, no fundo, temos que reconhecer que continuamos sendo os mesmos hominídeos da pré-História. Afinal, depois que descemos em bandos das árvores, evoluímos para tribos, depois clãs, enfim nações.
Nunca perdemos esse pendor gregário que parece definir a nossa espécie. Basta ver que, ao longo da história da humanidade, seguimos nos agrupando: confrarias, seitas, guildas, corporações. Não mudou nada nos dias de hoje: adotamos partidos, sindicatos, movimentos ou times como elementos que compõem a nossa própria identidade.
É fato antropológico que o caráter agregador que tanto nos aproxima de nossas raízes primatas apenas foi ressignificado ao longo do tempo. Somos seres humanos em busca do pertencimento a um ente maior, que nos acolha e nos defina. Um grupo a que nos dispomos defender, se necessário, com unhas e dentes. E que dificilmente abandonaremos.
As organizações que conseguem encontrar esse caminho para o coração dos seus colaboradores, e ali plantar a sua mensagem, convertem meros empregados em adeptos.
Essa é uma conquista estratégica em tempos que a tecnologia se reinventa numa velocidade jamais vista e o capital intelectual das organizações passa a ser um ativo potencialmente volátil, que deve ser preservado a todo custo. O turnover está sempre à espreita, para roubar recursos humanos preciosos e condenar as empresas ao trabalho de Sísifo que é selecionar colaboradores, capacitá-los, treiná-los, inseri-los no fluxo de trabalho e, então, perdê-los para a concorrência dentro de dois a quatro anos. Afinal, as redes profissionais mantêm os colaboradores constantemente expostos ao mercado. E não faltam ofertas.
Como então cativar a equipe de colaboradores para que ela adquira a coesão de uma tribo? Como construir um time tão compromissado com a empresa, que a ideia de abandoná-la e passar para a concorrência nem lhes passe pela cabeça? Afinal, é o desejo de qualquer organização ser composta por uma comunidade de pessoas que, como membros de uma tribo, compartilham seus valores, lutam por seus objetivos e estão dispostas a defendê-la como embaixadores e lutar por ela como guerreiros.
A resposta é simples: o mesmo storytelling que reunia a tribo em torno das fogueiras pode ser a ferramenta perfeita para agregar os colaboradores em torno da missão, visão, valores, objetivos e metas da organização, e assim transformá-los em adeptos.
Mas que história contar, se datas, números e dados não conquistam corações? Essa é uma pergunta que mais de uma vez ouvi de executivos interessados em fazer suas empresas se comunicarem com seu público interno. A minha resposta sempre foi propor uma reflexão:
Que história você contaria para seus colaboradores reunidos em torno de uma fogueira?
Se quer atingir o coração de seus colaboradores, a empresa precisa falar a partir do seu próprio coração. Expor a sua alma e trazer para a luz o espírito que a animou em seus primórdios, na mente e coração de seu fundador. Reencontrar esse seu primeiro entusiasmo, que trouxe para a realidade o que até então era uma mera ideia. O motor moral que a impulsionou através de dificuldades e obstáculos que enfrentou ao longo de sua trajetória.
Esse movimento pode significar um resgate das histórias que já vinham se perdendo, corroídas pelo tempo na medida em que as testemunhas do nascimento da organização se afastaram da sua operação e, em muitos casos, faleceram. Revisitando o seu passado, a empresa pode acabar se reconciliando com seus princípios basilares e valores que estavam no coração de seus fundadores nos seus primeiros dias.
São justamente esses princípios e valores que se comunicam com os corações dos colaboradores. Esse intercâmbio de valores gera a identificação que traz, a reboque, a assimilação de si próprio como parte do todo que é a organização. Quando se reconhece construindo a história da empresa onde trabalha, e encontra nela acolhimento e segurança, o colaborador passa a se orgulhar de pertencer àquele grupo de pessoas. Ao fim desse processo, a organização deixa de ser apenas um negócio para se tornar um clã unido pelos mesmos ideais.