Quem paga a conta dos desastres ambientais? Uma reflexão sobre Brumadinho, Maceió e o Rio Grande do Sul
Nos últimos anos, o Brasil tem sido palco de desastres ambientais devastadores que expuseram a vulnerabilidade de nossas cidades e a negligência na gestão de recursos naturais. Exemplos emblemáticos incluem os desastres de Brumadinho e Maceió, causados por operações negligenciadas de empresas privadas, e a recente tragédia no Rio Grande do Sul, decorrente de eventos climáticos extremos. Mas afinal, quem paga a conta desses desastres?
Brumadinho e Maceió: negligência privada e o preço pago pela sociedade
Em Brumadinho, o rompimento da barragem da Vale em 2019 resultou em 270 mortes e uma destruição ambiental sem precedentes. A empresa, embora responsabilizada, ainda enfrenta processos judiciais lentos, e a aplicação de punições efetivas permanece incerta. A tragédia expôs falhas na fiscalização e na regulamentação da segurança de barragens, refletindo um sistema onde a negligência corporativa tem consequências devastadoras para a população.
De forma similar, a mineração de sal-gema pela Braskem em Maceió causou instabilidade geológica e o afundamento do solo em vários bairros, desalojando milhares de moradores. Embora a Braskem tenha assumido um plano de realocação e indenização, a insatisfação com as medidas oferecidas levou moradores a buscarem justiça na Holanda. Em ambos os casos, a negligência empresarial gerou desastres ambientais e sociais de grandes proporções, deixando a sociedade para lidar com as consequências e os custos.
Rio Grande do Sul: desastre climático e a responsabilidade do poder público
Diferentemente de Brumadinho e Maceió, o desastre no Rio Grande do Sul não foi causado por uma empresa, mas por eventos climáticos extremos. Enchentes e tempestades devastaram cidades, destruindo infraestrutura e deixando milhares de desabrigados. Este caso destaca a urgência de repensar a urbanização para resistir a eventos climáticos extremos, bem como ter bons planos de gestão de crise.
Não basta apenas reconstruir as cidades afetadas; é necessário adotar uma abordagem de urbanização resiliente. Isso inclui a conservação das bacias hidrográficas, a construção de moradias que considerem as questões naturais e socioeconômicas locais, a implementação de infraestruturas que suportem condições climáticas adversas e planos para resposta a novos incidentes de crise. A responsabilidade, neste caso, recai sobre o poder público, que deve investir em planejamento urbano sustentável e políticas públicas de prevenção e resposta a desastres.
Resiliência e responsabilidade financeira
É clara e cada vez mais importante a necessidade de resiliência diante de desastres ambientais. Os casos de Brumadinho e Maceió ilustram de maneira trágica como a negligência corporativa pode resultar em catástrofes que afetam profundamente a vida das pessoas e o meio ambiente. Nesses cenários, é fundamental que as empresas responsáveis sejam levadas a arcar integralmente com os custos de recuperação ambiental e compensação das vítimas. Isso inclui reparações financeiras e suporte contínuo para a reconstrução das comunidades afetadas. Este custo pode parecer alto para uma empresa, mas certamente é consideravelmente reduzido quando tem práticas responsáveis e atua na identificação dos riscos e na prevenção. Em última instância, se o negócio não se viabiliza financeiramente com uma operação responsável, sua própria existência deveria ser repensada.
No caso do Rio Grande do Sul, a responsabilidade se desloca em grande parte para o poder público, que deve investir de maneira estratégica e sustentável na criação de cidades mais resilientes. Isso implica em desenvolver infraestruturas que possam resistir aos impactos das mudanças climáticas e implementar políticas públicas voltadas à prevenção e resposta a desastres. A construção de arranjos urbanos que considerem as especificidades naturais e socioeconômicas de cada região é essencial para minimizar futuros riscos.
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Conclusão
Em última análise, quem paga a conta dos desastres ambientais? A resposta a esta pergunta reside em uma combinação equilibrada de responsabilização corporativa e investimentos públicos robustos em políticas e infraestrutura resiliente. Tanto empresas quanto governos precisam ser proativos além da resposta a crises; é necessária também a implementação de planejamentos criteriosos e medidas preventivas eficazes. As empresas devem ser responsabilizadas por suas ações e assumir os custos totais de suas negligências, enquanto os governos precisam investir em planejamento urbano sustentável e em políticas que fortaleçam a resiliência das comunidades.
A exigência de uma resposta coordenada e sustentada é vital para proteger nossas comunidades e garantir um futuro mais seguro e sustentável. Apenas por meio da conjugação de esforços entre o setor privado e o público podemos mitigar os impactos dos desastres ambientais e construir um mundo onde a prevenção e a resiliência sejam prioridades inquestionáveis. Este é o caminho para garantir que nossas cidades e comunidades não apenas sobrevivam, mas prosperem diante das adversidades ambientais.
Vamos falar mais sobre o assunto? O que mudou recentemente na forma como sua organização aborda este tema?
Sobre Andressa de Mello
Graduada em Engenharia de Computação pelo ITA e mestre em Sustentabilidade pela Schumacher College, na Inglaterra, é consultora, conselheira, professora e coordenadora no MBA de Economia Circular e Inovação na FESPSP e fundadora da Sust'nReal - sustentabilidade na vida real . Além de desenvolver projetos e soluções que capturam valor a partir de desafios socioambientais, aconselha empresários, empreendedores, executivos e organizações em assuntos estratégicos de sustentabilidade e ESG aplicados a negócios.
Tem experiência de mais de 20 anos aliando estratégia, inovação e gestão, tendo ocupado posições executivas em empresas como Natura, Enjoei, The Boston Consulting Group, Ambiental by JBS, Veste, HP e Santander. Criou negócios e atuou no desenvolvimento de cadeias de economia circular e de biodiversidade.
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